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Pregabalina na fibromialgia

Autor:

Rodrigo Díaz Olmos

Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de são Paulo (FMUSP). Diretor da Divisão de Clínica Médica do Hospital Universitário da USP. Docente da FMUSP.

Última revisão: 07/09/2008

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Menos dor na fibromialgia?

 

Estudo randomizado, duplo-cego, placebo-controlado, fase III, de pregabalina no tratamento de pacientes com fibromialgia.

A randomized, double-blind, placebo-controlled, phase III trial of pregabalin in the treatment of patients with fibromialgia. J Rheumatol 2008 Mar; 35:5021 [Link para o Abstract]

 

Fator de impacto da revista (Journal of Rheumatology): 1,459

Contexto Clínico

A fibromialgia é uma condição que apresenta grande impacto na qualidade de vida dos pacientes e seu tratamento é geralmente pouco efetivo. Poucas drogas apresentam benefício comprovado na fibromialgia, dentre elas destacando-se os antidepressivos tricíclicos. A pregabalina é um amino-ácido estruturalmente semelhante ao neurotransmissor ácido ?-aminobutírico com propriedades anticonvulsivantes, analgésicas e ansiolíticas. Já foi aprovada pelo FDA para tratamento da dor neuropática da neuropatia diabética e da neuralgia pós-herpética. Pequenos estudos de curta duração sugeriram benefício da pregabalina no manejo da fibromialgia. O presente estudo avaliou a eficácia e a segurança da pregabalina no alívio sintomático da fibromialgia.

cio comprovado na fibromialgia, dentre elas destacando-se os antidepressivos tric

O Estudo

            Ensaio clínico multicêntrico, randomizado, duplo-cego, placebo controlado, com 748 participantes com fibromialgia, que foram alocados aleatoriamente para receber placebo ou pregabalina na dose de 300, 450 ou 600 mg/dia por 13 semanas. O desfecho primário para o primeiro objetivo do estudo – controle da dor – foi a média de escore de dor nos quatro grupos (placebo e cada grupo de pregabalina 300, 450 e 600 mg/dia). O desfecho primário para o segundo objetivo do estudo – manejo global da fibromialgia – foi a média de escore de dor e dois questionários – questionário de impressão global de mudança do paciente [Patient Global Impression of Change (PGIC)] e o questionário de impacto da fibromialgia [Fibromyalgia Impact Questionnaire (FIQ)-Total Score]. Os desfechos secundários incluíram avaliações do sono, da fadiga e de distúrbios do humor.


Resultados

            Os pacientes em todos os grupos de pregabalina apresentaram melhoras estatisticamente significativas nos escores de dor e no questionário de impressão global de mudança (PGIC). A melhora no questionário de impacto da fibromialgia (FIQ) não atingiu significância estatística. Houve melhora significativa nas avaliações de sono e da percepção dos pacientes de seu estado geral nos grupos de pregabalina comparados com placebo. Tontura e sonolência foram os efeitos colaterais mais relatados no estudo. Os autores concluem que a monoterapia com pregabalina nas doses de 300, 450 e 600 mg/dia (em duas tomadas diárias), tendo sido eficaz e segura no tratamento da dor associada à fibromialgia, produz um benefício clinicamente significativo para pacientes com fibromialgia.

 

Aplicação para a Prática Clínica

            A fibromialgia é uma condição clínica de difícil tratamento. Sabe-se que a melhor estratégia de manejo destes pacientes é uma abordagem multidisciplinar que inclui avaliação de transtorno de humor, psicoterapia cognitivo-comportamental, educação do paciente, boa relação médico-paciente, atividade física e intervenção medicamentosa. Em relação à terapia farmacológica, os tricíclicos são as drogas de escolha, particularmente a amitriptilina. Entretanto outras drogas e outros antidepressivos têm mostrado algum benefício no tratamento da fibromialgia (ciclobenzaprina, fluoxetina, duloxetina e milnacipran). Com os resultados do presente estudo, juntamente com os resultados de um ensaio clínico prévio com 529 pacientes2 também demonstrando benefício da pregabalina no manejo da fibromialgia, a pregabalina passa a fazer parte do arsenal terapêutico da fibromialgia.


Dicas de Epidemiologia e Medicina Baseada em Evidências

 

Controles nos ensaios clínicos

            Este estudo é um ensaio clínico de desenho simples (randomizado, duplo cego, placebo controlado) em que uma intervenção farmacológica (na verdade 3 doses diferentes da mesma droga) é comparada com placebo. Creio que seria interessante abordarmos a questão do controle em ensaios clínicos, particularmente no caso da fibromialgia que sabidamente é uma condição em que o efeito placebo das intervenções é grande. Quando avaliamos uma intervenção terapêutica em um ensaio clínico, o grupo de participantes que recebe a intervenção em questão deve, idealmente, ser comparado a um grupo de pacientes que não se submete à intervenção sob investigação. Esta estratégia de desenho de ensaios clínicos é muito importante na produção de resultados válidos uma vez que o benefício observado com uma intervenção terapêutica qualquer, por exemplo, medicamentosa, não é idêntico àquele produzido apenas pela ação farmacológica da substância sob investigação. O benefício real, concreto (observado na prática) de uma intervenção terapêutica é um somatório de um sem número de fenômenos, dentre os quais podemos citar alguns. A própria evolução natural da doença pode ser responsável pela melhora clínica observada com uma intervenção ineficaz do ponto de vista farmacológico. Há condições clínicas que são auto-limitadas ou melhoram espontaneamente. O benefício observado pode ser explicado apenas pelo fenômeno estatístico da regressão à média, em que indivíduos com valores extremos de uma variável quando realizam aferições subseqüentes, tendem a apresentar valores menos extremos, em média, da variável em questão (no caso da fibromialgia, se selecionamos pacientes com extremos da variável dor – muita dor - há uma tendência puramente estatística de estes indivíduos apresentarem, em média, menos dor numa avaliação subseqüente). Outros fenômenos que podem ser os responsáveis pelo benefício observado, para além de qualquer efeito específico da intervenção em questão, são os efeitos Hawthorne e placebo. O efeito Hawthorne descreve a tendência em apresentar melhora, muitas vezes decorrente de mudanças de comportamento ou mesmo na maneira de encarar e relatar os sintomas de sua condição clínica, de pacientes que são alvo de interesse e de atenção especiais, como aqueles que participam de ensaios clínicos. Por último, há o efeito placebo. Pacientes que recebem um comprimido ou uma injeção indistinguíveis do tratamento ativo em termos de aparência, sabor, odor e cor, mas que não tem a  substância ativa com a ação farmacológica específica, apresentam uma melhora mensurável que varia dependendo da condição e da intervenção em estudo. Assim, o benefício observado com uma intervenção qualquer é um somatório de pequenos benefícios potenciais – melhora natural da condição, regressão à média, efeito Hawthorne, efeito placebo e, por último, ação específica da intervenção. Se avaliarmos nossa intervenção em um ensaio clínico sem um grupo controle (o que é factível – são ensaios clínicos não controlados) poderemos observar uma melhora significativa na condição dos pacientes sem que nossa intervenção tenha qualquer efeito específico (por exemplo, farmacológico), o que dificultaria sobremaneira a interpretação dos resultados.  Por isso ensaios clínicos controlados têm uma validade muito maior que ensaios clínicos não controlados. Estes efeitos descritos (particularmente os efeitos Hawthorne e placebo e a história natural da condição clínica) são muito proeminentes quando a variável em análise é a dor, ou outros sintomas subjetivos.


Bibliografia

1.Mease PJ et al. A randomized, double-blind, placebo-controlled, phase III trial of pregabalin in the treatment of patients with fibromyalgia. J Rheumatol 2008 Mar; 35:502.

2.Crofford LJ, Rowbotham MC, Mease PJ, Russell IJ, Dworkin RH, Corbin AE, Young JP Jr, LaMoreaux LK, Martin SA, Sharma U, Pregabalin 1008-1-5 Study Group: Pregabalin for the treatment of fibromyalgia syndrome: Results of a randomized, double-blind, placebo-controlled trial. Arthritis & Rheum 2005; 52:1264-1273 [link livre para o artigo original].

3.Olmos RD; Martins, HS. ensaios clínicos – Princípios teóricos. In “Epidemiologia. Abordagem Prática”. Sarvier, 1ª Edição, 2005.

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