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Mamografia em idosas?

Autor:

Rodrigo Díaz Olmos

Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de são Paulo (FMUSP). Diretor da Divisão de Clínica Médica do Hospital Universitário da USP. Docente da FMUSP.

Última revisão: 28/09/2008

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Mamografia em mulheres com mais de 80 anos. Há algum benefício real?

 

Mamografia antes do diagnóstico em mulheres de 80 anos ou mais com câncer de mama.

Mammography Before Diagnosis Among Women Age 80 Years and Older With Breast Cancer. J Clin Oncol 26:2482-2488 [Link para Abstract].

 

Fator de impacto da revista (Journal of Clinical Oncology): 13,598

 

Contexto Clínico

            As recomendações de rastreamento de câncer de mama com Mamografia em mulheres com mais de 69 anos são inconclusivas uma vez que os grandes ensaios clínicos de rastreamento não incluíram mulheres nesta faixa etária (apenas um estudo incluiu mulheres entre 70 e 74 anos, mas o benefício da Mamografia neste grupo não foi estatisticamente significativo). Entretanto com o envelhecimento da população é salutar que se estudem os riscos e benefícios potenciais de rastrear câncer de mama em mulheres com mais de 80 anos. O presente estudo traz algumas informações sobre mamografias em mulheres com 80 anos ou mais.

 

O Estudo

            Os autores utilizaram a base de dados do Medicare “Surveillance, Epidemiology, and End Results” e avaliaram 12.358 mulheres = 80 anos com câncer de mama diagnosticado entre 1996 e 2002. As mulheres foram agrupadas de acordo com o número de mamografias realizadas nos 60 meses que antecederam o diagnóstico: não usuárias (nenhuma Mamografia), usuárias irregulares (uma ou duas mamografias), e usuárias regulares (três ou mais mamografias). O efeito da Mamografia no estágio da doença (I a IIa vs IIb a IV) e na sobrevida foram determinados por regressão logística e pela análise de Cox (Cox proportional hazards analyses).

 

Resultados

            As porcentagens de mulheres não usuárias, usuárias irregulares e usuárias regulares nos cinco anos precedendo o diagnóstico de câncer de mama foram de 49%, 29% e 22%, respectivamente. Na análise multivariada, as pacientes apresentaram uma probabilidade 0,37 vezes menor de apresentar um câncer em estágio avançado para cada Mamografia realizada (OR = 0,63 IC 95% 0,61 – 0,65), em outras palavras cada Mamografia reduziu em 37% o risco de um câncer em estágio avançado. Houve uma associação positiva entre uso regular de mamografias e alto nível educacional, alto nível de renda e estar casada. O tamanho do tumor no momento do diagnóstico associou-se inversamente com a regularidade da Mamografia. O tamanho médio dos tumores foi 2,90 cm entre as usuárias regulares; 3,40 cm entre as usuárias irregulares e 5,22 cm entre as não usuárias. Esta associação persistiu na análise ajustada para fatores de confusão. A sobrevida específica relacionada ao câncer de mama relacionou-se direta e significativamente com o aumento na freqüência de mamografias. Interessante é que na discussão do artigo os autores comentam que, embora tenham encontrado uma relação positiva entre a freqüência de mamografias e uma melhora na sobrevida não relacionada ao câncer de mama, eles não conseguiram eliminar esta associação baseando-se nas comorbidades. Na opinião deste editor este fato é uma evidência indireta de que fazer mamografias é um marcador de melhor saúde e, portanto, melhor prognóstico tanto relacionado ao câncer de mama como a outras morbidades, e não a causa da melhor sobrevida observada no estudo.

 

Aplicação para a Prática Clínica

            Na melhor das hipóteses este estudo pode ser um argumento para se estudar adequadamente o papel das mamografias na prevenção do câncer de mama em mulheres com mais de 80 anos. De forma alguma estes resultados indicam que há benefício de se fazer mamografias em mulheres nesta faixa etária como equivocadamente recomenda, baseado nos achados deste estudo, Andrew M. Kaunitz num artigo publicado no Journal Watch Women's Health, dia 29 de maio, 2008. Este autor afirma ingenuamente que os resultados deste estudo deveriam nos encorajar a solicitar mamografias para mulheres mais idosas. Sendo assim não há qualquer modificação nas indicações de rastreamento de câncer de mama com Mamografia2.

 

Dicas de Epidemiologia e Medicina Baseada em Evidências

Estudos observacionais e intervenções preventivas3

            Estudos observacionais que avaliam uma intervenção terapêutica ou diagnóstica estão sujeitos a uma série de vieses, o que pode comprometer a validade de seus resultados ou, pelo menos, indicar muita cautela na interpretação e aplicabilidade dos achados do estudo. O estudo descrito acima é uma coorte retrospectiva em que se avaliou a exposição às mamografias (variável independente, fator de exposição) sobre o estágio dos cânceres diagnosticados e sobre a sobrevida específica e geral (variáveis dependentes, desfechos). Entretanto ao contrário de um ensaio clínico randomizado em que a exposição ao fator em estudo (no caso a realização de mamografias) é feita independente da vontade tanto do participante como do médico pesquisador (a intervenção é realizada aleatoriamente), em um estudo observacional selecionamos indivíduos que já foram expostos ao fator de exposição por algum motivo não aleatório. Assim, o fato de se submeter a tal exposição, seja por indicação de um médico seja por vontade própria, por si só já torna aquele indivíduo ou grupo de indivíduos diferente em termos prognósticos. É conhecido o exemplo da terapia de reposição hormonal (TRH) que em Estudos observacionais sempre se associou com redução de inúmeros desfechos clínicos significativos. Entretanto quando a TRH foi estudada num ensaio clínico randomizado, os supostos benefícios, na sua maioria, desapareceram, dando lugar, inclusive a alguns malefícios. Ao que tudo indica, o fato de se realizar mamografias parece ser um marcador de boa saúde e não a causa da boa saúde. Não está se afirmando com isso que a realização de mamografias em mulheres de 80 anos ou mais definitivamente não produz benefícios; estamos, pura e simplesmente, dizendo que os resultados deste estudo não nos autorizam a chegar à conclusão oposta, qual seja, de que devemos instituir mamografias em idosas com mais de 80 anos.

 

Bibliografia

1.Badgwell BD, Giordano SH, Duan ZZ, Fang S,  Bedrosian I, et al.Mammography Before Diagnosis Among Women Age 80 Years and Older With Breast Cancer. J Clin Oncol 2008; 26:2482-2488. [Link para Abstract]

2. Screening for Breast Cancer: Recommendations and Rationale U.S. Preventive Services Task Force. Ann Intern Med 2002;137:344-346. [link livre para o artigo original]

3.Brandão Neto RA, Lotufo PA. “Estudos de Coorte”. In ‘Epidemiologia - Abordagem Prática”, Sarvier, 1ª Edição, 2005.

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