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Vitamina D

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 22/05/2019

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Contexto Clínico

 

A suplementação de vitamina D para redução de eventos cardiovasculares e câncer tem crescido substancialmente ao longo da última década. Essa conduta é embasada principalmente por resultados de estudos observacionais que sugerem uma associação entre baixos níveis séricos de vitamina D e maior risco de câncer e doença cardiovascular (DCV).1

Contudo, dados provenientes de evidências de maior qualidade são conflitantes. Análises secundárias ou post hoc de estudos randomizados apresentaram resultados geralmente neutros com uso de vitamina D no contexto da profilaxia primária. Já uma metanálise de quatro desses estudos concluiu que poderia haver redução da mortalidade por câncer com suplementação de vitamina D.1

O U.S. Preventive Services Task Force (USPSTF) concluiu que a melhor evidência disponível, atualmente, é insuficiente para avaliar a efetividade da vitamina D na profilaxia primária de câncer e DCVs, sendo necessários novos estudos para melhor definição do seu papel nesse contexto.1,3 O VITAL Trial foi, então, desenhado para avaliar a relação entre suplementação de vitamina D3 e o risco de DCV e câncer, assim como avaliar o perfil de risco e benefício dessa intervenção.1

 

O Estudo

 

O VITAL Trial foi um ensaio clínico fatorial 2x2 (ensaio clínico que testa duas intervenções simultaneamente em uma mesma amostra da população), randomizado, duplo-cego e placebo controlado. Esse estudo comparou a eficácia da suplementação de vitamina D3 2000UI por dia e/ou Ômega 3, 1g/dia (cápsulas de óleo de peixe na dose sugerida pela AHA) para profilaxia primária de eventos cardiovasculares e câncer em comparação ao placebo.1,2

Foram incluídos homens de 50 anos ou mais e mulheres de 55 anos ou mais que não tinham história prévia de DCV ou câncer e residiam nos EUA. Foram excluídos pacientes com insuficiência renal ou em diálise, cirrose, história de hipercalcemia ou outras doenças graves. O estudo foi financiado pelo National Institute of Health (NIH). Os resultados referentes à suplementação de vitamina D foram descritos em outro artigo publicado no NEJM.1,2

Os desfechos primários foram eventos cardiovasculares maiores, um composto de infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular cerebral (AVC) e morte por causas cardiovasculares, e câncer invasivo de qualquer tipo. Os desfechos secundários foram o desfecho primário acrescido de necessidade de revascularização miocárdica, os componentes individuais do desfecho primário composto de eventos cardiovasculares maiores, ocorrência de câncer colorretal, de próstata ou mama e morte por câncer de qualquer tipo. Foi feita também uma análise post hoc para avaliar o impacto da suplementação de vitamina D na mortalidade por câncer. A análise estatística previa avaliação de interação entre as duas intervenções (uso de Ômega concomitante ou não), mas não previa ajuste para múltiplas comparações.1,2

Foram incluídos 25.871 pacientes randomizados para receber Ômega 3 e vitamina, Ômega 3 e placebo, vitamina D e placebo ou duplo placebo. Houve predominância do sexo feminino (51%), com idade média de 67,1 anos. A mediana de IMC foi 28,1 (± 5,7). Uma parcela significativa dos pacientes era hipertensa (50%) e estava em uso de hipolipemiantes (37%). Dos pacientes, 13% eram diabéticos e 7%, tabagistas ativos. Durante o período de seguimento (mediana de 5,3 anos), a aderência autorreferida pelos pacientes foi superior a 80%. Não houve interação entre Ômega 3 e vitamina D.1,2

Entre os 15.787 participantes que tiveram seus níveis séricos de vitamina D avaliados no início do estudo, 12,7% tinham nível inferior a 20ng/mL e 32,2% entre 20 e 30ng/mL, com os demais participantes tendo níveis sérios superiores a 3ng/mL. Após 1 ano, observou-se um aumento de 40% no nível sérico médio de vitamina D (29,8ng/mL para 41,8ng/mL) no grupo intervenção, sem alterações significativas no grupo placebo. O uso de vitamina D não proveniente do estudo foi observado em 6,4% dos pacientes do grupo vitamina D e 10,8% do grupo placebo.1

Não houve diferença significativa entre os grupos para o desfecho primário de câncer invasivo de qualquer tipo (HR 0,96/IC 95%, 0,88 a 1,06/p = 0,47). Na análise dos desfechos secundários, não houve diferença significativa na incidência de mortalidade total por câncer, nem na incidência de câncer de mama, próstata ou colorretal. Uma análise post hoc dos resultados, que excluiu os 2 primeiros anos de seguimento, sugere que poderia haver menor percentual de mortalidade por câncer no grupo vitamina D quando comparado ao placebo (HR 0,75/IC 95%, 0,59 a 0,96). Na análise de subgrupos, não houve variação do efeito observado de acordo com os diferentes estratos de nível sérico de vitamina D (menor que 20ng/mL, entre 20 e 30ng/mL e maior que 30ng/mL).1

Não houve diferença significativa entre os grupos vitamina D e placebo para o desfecho primário de eventos cardiovasculares maiores (HR 0,92/IC 95%, 0,85 a 1,12/p = 0,69). Também não houve diferença significativa na análise dos diferentes desfechos secundários relacionados ao risco cardiovascular.1 A ocorrência de eventos adversos foi semelhante entre os dois grupos, sem diferenças na incidência de hipercalcemia, cálculos renais ou sintomas gastrintestinais.1

 

Aplicação Prática

 

O presente estudo conclui que a suplementação de vitamina em uma dose de 2.000UI/dia não modificou significativamente a incidência de câncer invasivo ou eventos cardiovasculares maiores. O VITAL Trial é o maior ensaio clínico já realizado para avaliar o impacto da suplementação de vitamina D na profilaxia primária de DCV e câncer na população geral. Seus resultados estão de acordo com outros grandes estudos recentes, como o VIDA Trial, no qual a suplementação de altas doses de vitamina D (100.000UI/mês) não modificou a incidência de eventos cardiovasculares maiores ou câncer.

Uma das maiores críticas pertinentes a este estudo seria quanto ao baixo percentual de pacientes incluídos que, de fato, tinham deficiência de vitamina D (<20ng/mL), população que mais provavelmente se beneficiaria da intervenção. Assim, é possível que, em pacientes com vitamina D muito baixa, haja algum benefício com a suplementação para profilaxia primária. Contudo, a consistência do resultado observada na análise de subgrupos entre os diferentes estratos de vitamina D basal (menor que 20ng/mL, entre 20 e 30ng/mL e maior que 30ng/mL) torna essa possibilidade muito menos provável.

A análise dos desfechos secundários sugere que a suplementação de vitamina D poderia reduzir o percentual de mortalidade por câncer, apesar de não reduzir sua incidência ou a mortalidade total por câncer. Tal resultado está de acordo com o de uma metanálise recente que demonstrou um benefício significativo na mortalidade por câncer com a suplementação de vitamina D.

É importante ressaltar que esse resultado deve ser interpretado com cautela por ser proveniente de uma análise post hoc, não ajustada para múltiplas comparações, que não possibilita concluir, mas apenas criar hipóteses. Assim, novos estudos serão necessários para melhor elucidar o papel da suplementação de vitamina D na mortalidade por câncer. Por fim, os resultados do presente estudo oferecem evidências sólidas de que a suplementação de vitamina D não deve ser recomendada para profilaxia primária de eventos cardiovasculares ou câncer.

 

Bibliografia

 

1.             Manson, J.E. Vitamin D Supplements and Prevention of Cancer and Cardiovascular Disease. N Engl J Med 2019; 380:33-44. Disponível em: https:/www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1809944?query=recirc_curatedRelated_article

2.             Manson, J.E. Marine n-3 Fatty Acids and Prevention of Cardiovascular Disease and Cancer. N Engl J Med 2019; 380:23-32. Disponível em: https:/www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1811403

3.             Manson, J.E. VITAL Signs for Dietary Supplementation to Prevent Cancer and Heart Disease. N Engl J Med 2019; 380:91-93. Disponível em: https:/www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMe1814933?query=recirc_curatedRelated_article

Comentários

Por: UBIRATAN PINTO GONÇALVES em 16/05/2019 às 23:38:38

"caso pessoal..sei que fui morar planalto de sc ,latitude 29o. .pouca exposição ao sol..e fattíidicamente entrei em estado tímico depressivo..de fazer glândulas lacrimais fadigarem..sei que minha 25oh-d3 estavaa menor que 10...meu pth,Ca..normais...tive que repor sim e ativar AMP c..D"

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