Autor:
Lucas Santos Zambon
Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.
Última revisão: 09/10/2014
Comentários de assinantes: 0
Especialidades: Cardiologia/Medicina de Emergência
Paciente do sexo feminino, 63 anos, portadora de hipertensão arterial sistêmica e miocardiopatia hipertensiva e insuficiência renal crônica, em uso ambulatorial de atenolol 25mg 12/12h e furosemida 40mg 12/12h, procura atendimento de pronto-socorro por quadro de tosse seca e dispneia progressiva aos esforços na última semana, associada à ortopneia. Relata ter tratado uma pneumonia, tendo o término da antibioticoterapia ocorrido há quatro dias.
Ao exame físico na chegada estava em Glasgow 15, FC 90bpm, PA 170x98mmHg, FR 28cpm, SatO2 92% em ar ambiente, afebril, acianótica, enchimento capilar normal, Ausculta pulmonar com presença de estertores até metade de ambos hemitórax, ausculta cardíaca sem alterações, exame abdominal com pequena hepatomegalia não dolorosa e edema de membros inferiores com presença de sinal de Godet.
Foram colhidos alguns exames, a saber:
NT-próBNP: 10150pg/mL; marcadores de necrose cardíaca normais;
Ureia: 90mg/dL; Cr: 3,8mg/dL (valor em ambulatório de 3,6);
Na:143mEq/L; K: 3,9mEq/L; Bicarbonato arterial: 23,3mmol/L;
Hb 10,1g/dL (padrão normo/normo), leucócitos e plaquetas normais.
Foi também realizado eletrocardiograma de repouso que demonstrou taquicardia sinusal e sobrecarga de câmaras esquerdas. Abaixo temos imagem de radiografia de tórax da paciente:
Imagem 1. Radiografia de Tórax PA
Esta paciente foi diagnosticada com um quadro de insuficiência cardíaca descompensada pela pneumonia recentemente tratada.
Podemos observar na radiografia de tórax a presença de uma área cardíaca aumentada, hilos proeminentes, e um infiltrado bilateral bastante compatível com congestão, onde observamos cefalização da trama vascular.
Os exames laboratorias demonstram que a nefropatia crônica não teve agudização, e há uma alteração extremamente compatível com a hipótese diagnóstica, que é a grande elevação de NT-próBNP.
O peptídeo natriurético cerebral é um hormônio natriurético liberado pelo coração, particularmente pelos ventrículos. O pró-hormônio, que é o próBNP, é clivado em BNP biologicamente ativo, e em uma forma inerte que é o N-terminal próBNP (NT-próBNP). A elevação sérica tanto do BNP quanto do NT-próBNP pode ser útil para diferenciar a causa de dispneia, apontando ou não para insuficiência cardíaca descompensada. Além disso, estudos demonstram uma relação quase linear entre os valores de BNP e mortalidade intra-hospitalar. Um BNP >100 pg/mL diagnostica insuficiência cardíaca com sensibilidade, especificidade e acurácia de 90%, 76%, e 83%, respectivamente. Atualmente, pacientes que tenham dispneia de origem indeterminada e BNP abaixo de 100 pg/mL, praticamente têm o diagnóstico de insuficiência cardíaca descartada. Para descompensações agudas, o cutoff de BNP mais aceito é um valor > 400 pg/mL, sendo valores entre 100 e 400 considerados indeterminados, sendo necessário maior julgamento por parte do médico. Já os cutoffs do NT-próBNP variam conforme a idade. Para pacientes com idade < 50 anos, de 50 a 75 anos, e >75 anos, os cutoffs acima dos quais configuram descompensação cardíaca são: 450 pg/mL, 900 pg/mL, e 1800 pg/mL respectivamente. Estes cutoffs têm sensibilidade de 90% e especificidade de 84%. Já para excluir uma insuficiência cardíaca descompensada, um NT-próBNP < 300 pg/mL é o valor a ser utilizado. Neste caso, não há dúvidas uma vez que o resultado foi de 10150pg/mL. Importante salientar que o estudo IMPROVE-CHF pesquisou 500 pacientes de pronto-socorro que se apresentaram com dispneia, e foi demonstrado que o uso do NT-próBNP nesses casos, como método complementar à avaliação clínica, aumentou a acurácia diagnóstica, diminuiu o tempo de permanência no pronto-socorro, a chance de re-hospitalização em 60 dias, além de ter tido impacto positivo em custos.
Heart Failure Society of America, Lindenfeld J, Albert NM, et al. HFSA 2010 Comprehensive Heart Failure Practice Guideline. J Card Fail 2010; 16:e1.
WRITING COMMITTEE MEMBERS, Yancy CW, Jessup M, et al. 2013 ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: a report of the American College of Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force on practice guidelines. Circulation 2013; 128:e240
Moe GW, Howlett J, Januzzi JL, Zowall H, Canadian Multicenter Improved Management of Patients With Congestive Heart Failure (IMPROVE-CHF) Study Investigators. N-terminal pro-B-type natriuretic peptide testing improves the management of patients with suspected acute heart failure: primary results of the Canadian prospective randomized multicenter IMPROVE-CHF study. Circulation. 2007;115(24):3103.
Iwanaga Y, Nishi I, Furuichi S, et al. B-type natriuretic peptide strongly reflects diastolic wall stress in patients with chronic heart failure: comparison between systolic and diastolic heart failure. J Am Coll Cardiol 2006; 47:742.
Kinnunen P, Vuolteenaho O, Ruskoaho H. Mechanisms of atrial and brain natriuretic peptide release from rat ventricular myocardium: effect of stretching. Endocrinology 1993; 132:1961.
Brunner-La Rocca HP, Kaye DM, Woods RL, et al. Effects of intravenous brain natriuretic peptide on regional sympathetic activity in patients with chronic heart failure as compared with healthy control subjects. J Am Coll Cardiol 2001; 37:1221.
Elsner D, Müntze A, Kromer EP, Riegger GA. Effectiveness of endopeptidase inhibition (candoxatril) in congestive heart failure. Am J Cardiol 1992; 70:494.
Wilkins MR, Unwin RJ, Kenny AJ. Endopeptidase-24.11 and its inhibitors: potential therapeutic agents for edematous disorders and hypertension. Kidney Int 1993; 43:273.
Tamura N, Ogawa Y, Chusho H, et al. Cardiac fibrosis in mice lacking brain natriuretic peptide. Proc Natl Acad Sci U S A 2000; 97:4239.
Maisel A, Mueller C, Adams K Jr, et al. State of the art: using natriuretic peptide levels in clinical practice. Eur J Heart Fail 2008; 10:824.
Clerico A, Del Ry S, Giannessi D. Measurement of cardiac natriuretic hormones (atrial natriuretic peptide, brain natriuretic peptide, and related peptides) in clinical practice: the need for a new generation of immunoassay methods. Clin Chem 2000; 46:1529.
Tjeerdsma G, de Boer RA, Boomsma F, et al. Rapid bedside measurement of brain natriuretic peptide in patients with chronic heart failure. Int J Cardiol 2002; 86:143.
Wieczorek SJ, Wu AH, Christenson R, et al. A rapid B-type natriuretic peptide assay accurately diagnoses left ventricular dysfunction and heart failure: a multicenter evaluation. Am Heart J 2002; 144:834.
O MedicinaNET é o maior portal médico em português. Reúne recursos indispensáveis e conteúdos de ponta contextualizados à realidade brasileira, sendo a melhor ferramenta de consulta para tomada de decisões rápidas e eficazes.
Medicinanet Informações de Medicina S/A Cnpj: 11.012.848/0001-57 | info@medicinanet.com.br |
MedicinaNET - Todos os direitos reservados.
Em função da pandemia do Coronavírus informamos que não estaremos prestando atendimento telefônico temporariamente. Permanecemos com suporte aos nossos inscritos através do e-mail info@medicinanet.com.br.