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Doença Hepática Gordurosa não Alcoólica

Última revisão: 20/08/2018

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Autor: Pedro Henrique Ribeiro Brandes

 

Caso Clínico

 

Paciente de sexo masculino, de 58 anos de idade, procura atendimento ambulatorial por queixa de perda de libido e impotência nos últimos meses. Obeso, hipertenso, diabético tipo II e dislipidêmico. Vinha em uso de metformina e sinvastatina, referindo retirada progressiva de anti-hipertensivos por melhor controle pressórico associada à perda de peso. Negava etilismo ou tabagismo. Vem apresentando, ainda, astenia, inapetência que correlaciona com sua perda de peso, e nega outros sintomas.

Ao exame físico, apresenta: altura, 1,76m; peso, 112kg; pressão arterial (PA), 98x64mmHg; frequência cardíaca (FC), 77bpm. Apresenta-se em bom estado geral, com hematomas em face extensoras de braços não relacionados a trauma, teleangiectasias em dorso e membros superiores, eritema palmar, aumento de volume de mamas com possível ginecomastia associada à lipomastia, abdome globoso com fígado indolor palpável 4cm abaixo do rebordo costal direito, espaço de Traube maciço à percussão e testículos de volumes reduzidos, sem outros achados ao exame físico.

Foi feita a hipótese de doença hepática, e foram solicitados exames laboratoriais para avaliação de função hepática e complicações, bem como o diagnóstico etiológico.

Em consulta de retorno, apresentou os seguintes resultados:

               hemoglobina, 13,1

               hematócrito, 38,6%

               leucócitos, 9.620

               neutrófilos, 7.100

               plaquetas, 110.000

               hemoglobina glicada, 8,6%

               creatinina, 1,0

               ureia, 36

               AST, 58 (limite superior: 28)

               ALT, 53 (limite superior: 45)

               fosfatase alcalina, 151 (limite: 120)

               gama-GT, 36 (limite: 29)

               bilirrubina total, 0,9

               albumina, 4,2

               INR, 1,02

               sorologias com anti-HCV negativo

               HBsAg negativo

               Anti-HBc negativo

               Anti-HBs positivo (pós-vacinal)

               Ultrassonografia (USG) de abdome superior com fígado de dimensões aumentadas, ecogenicidade aumentada, textura heterogênea, superfície nodular, esplenomegalia homogênea e sinais de hipertensão portal, sem achados de circulação colateral portossistêmica.

Diante dos achados, foi aventada a hipótese de esteato-hepatite não alcoólica e iniciada investigação de outras etiologias possíveis com solicitação de ferritina, ferro, saturação de transferrina, sorologia para hepatite A e autoanticorpos (FAN, antimúsculo liso, anti-LKM-1). O paciente foi orientado quanto a medidas não farmacológicas para perda de peso, e foi associada a liraglutida, sendo reforçada a abstinência alcoólica, e tendo sido encaminhado para seguimento com hepatologista.

 

As Figuras 1, 2 e 3 mostram a DHGNA e a USG.

 

DHGNA: doença hepática gordurosa não alcoólica.

Figura 1 - Imagem que ilustra sintoma da DHGNA.

 

 

 

DHGNA: doença hepática gordurosa não alcoólica.

Figura 2 - Imagem que ilustra sintoma da DHGNA.

 

 

 USG: ultrassonografia.

Figura 3 - USG.

 

Discussão

 

A DHGNA é definida como a presença de esteatose hepática não decorrente do consumo de álcool ou outras etiologias (hepatite C, uso de medicamentos, desnutrição, entre outros), sendo dividida em esteatose hepática e esteato-hepatite não alcoólica, de acordo com a presença de inflamação hepática.

Os principais fatores associados são idade de 40 a 50 anos ao diagnóstico e síndrome metabólica. Não há recomendação formal de rastreamento. Sua fisiopatogenia não está completamente explicada, sendo relacionada a lesão por estresse oxidativo e resistência insulínica. A DHGNA é habitualmente assintomática, e alguns pacientes podem se queixar de fadiga, cansaço ou desconforto em hipocôndrio direito.

O manejo da DHGNA se baseia no tratamento da obesidade e perda de peso, tratamento da dislipidemia e diabetes melito, abstinência alcoólica e vacinação contra hepatites virais (A e B). Pacientes com esteato-hepatite não alcoólica podem progredir para cirrose hepática, e tal progressão está relacionada à intensidade de inflamação hepática, marcada pela elevação da ferritina.

A cirrose hepática é a via final comum de diversas doenças com lesão hepática. É definida pela presença de desorganização arquitetural decorrente do processo de fibrose hepática, sendo considerada irreversível em fases avançadas. Sintomas inespecíficos como fadiga, perda de peso e anorexia podem estar presentes.

A doença pode progredir com sintomas decorrentes de descompensação, como: icterícia, prurido, hematomas, aumento de volume e dor abdominal, hematêmese, alteração do ciclo sono-vigília e confusão mental. Achados possíveis de exame físico incluem eritema palmar, teleangiectasias/spiders vasculares, ginecomastia, redução de volume testicular, ascite, tendência à hipotensão, circulação colateral hepatofugal (incluindo cabeça de medusa) e esplenomegalia.

A avaliação complementar deve buscar tanto o diagnóstico etiológico alternativo da cirrose (hepatites virais B e C, doenças de depósito como hemocromatose hereditária e doença de Wilson, hepatites autoimunes e hipergamaglobulinemia) quanto sinais de insuficiência hepática (anemia e plaquetopenia, hipoalbuminemia, hiperbilirrubinemia e alterações de testes da coagulação), além de procurar hipertensão portal (endoscopia digestiva alta com varizes de esôfago ou fundo gástrico, USG de abdome superior com esplenomegalia, circulação colateral, inversão de fluxo ou trombose da veia porta, função renal).

O exame padrão ouro para diagnóstico de cirrose é a biópsia hepática, podendo ser abdicada caso os achados clínicos, laboratoriais e radiológicos sejam suficientes para firmar o diagnóstico. O manejo da cirrose compensada consiste em corrigir a etiologia de base, quando possível, e prevenir outras agressões ao fígado, por meio de vacinação para hepatites A e B e evitar medicações hepatotóxicas. Esses pacientes têm sobrevida estimada superior a 10 anos.

Por outro lado, pacientes que desenvolvem cirrose descompensada podem apresentar sangramento de varizes esofágicas, ascite refratária, encefalopatia hepática, peritonite bacteriana espontânea, trombose de veia porta e síndrome hepatorrenal, entre outras complicações. Escores prognósticos como Child-Pugh maior ou igual a 12 ou MELD superior a 21 predizem uma sobrevida inferior a 6 meses. Valores de MELD superior a 10, presença de descompensação ou possibilidade de tratamento da causa base demandam seguimento por equipe de hepatologia com avaliação de transplante hepático quando cabível.

 

Bibliografia

 

1. HEIDELBAUGH, Joel J.; BRUDERLY, Michael. Cirrhosis and chronic liver failure: part I. Diagnosis and evaluation. American family physician, v. 74, n. 5, 2006.

2. HEIDELBAUGH, Joel J.; SHERBONDY, Maryann. Cirrhosis and chronic liver failure: part II. Complications and treatment. Am Fam Physician, v. 74, n. 5, p. 767-76, 2006.

3. UDELL, Jacob A. et al. Does this patient with liver disease have cirrhosis?. Jama, v. 307, n. 8, p. 832-842, 2012.

4. D'AMICO, Gennaro; GARCIA-TSAO, Guadalupe; PAGLIARO, Luigi. Natural history and prognostic indicators of survival in cirrhosis: a systematic review of 118 studies. Journal of hepatology, v. 44, n. 1, p. 217-231, 2006.

5. PROCOPET, Bogdan; BERZIGOTTI, Annalisa. Diagnosis of cirrhosis and portal hypertension: imaging, non-invasive markers of fibrosis and liver biopsy. Gastroenterology report, v. 5, n. 2, p. 79-89, 2017.

6. Imagem 1 disponível em https:/www.visualdx.com/learnderm/lesions/telangiectasia , acessado em 30 de junho de 2018

7. Imagem 2 disponível em https:/www.dermnetnz.org/topics/palmar-erythema , acessado em 30 de junho de 2018

8. Imagem 3 disponível em https:/www.slideshare.net/tarekhegazy/liver-ultrasound , acessado em 30 de junho de 2018

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