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Hiponatremia intra-hospitalar

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 24/11/2008

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Hiponatremia Intra-Hospitalar

 

Hiponatremia adquirida no hospital – por que fluídos parenterais hipotônicos continuam sendo usados?

Moritz ML, Ayus JC.  Hospital-acquired hyponatremia—why are hypotonic parenteral fluids still being used? Nature Clinical Practice Nephrology (2007) 3, 374-382. [Link Livre para o Artigo Original].


Fator de Impacto (Nature Clinical Practice Nephrology): 4,764


Contexto Clínico

            A Hiponatremia é um distúrbio eletrolítico que pode gerar edema cerebral e conseqüente hipertensão intra-craniana, a qual é relacionada a alta morbi-mortalidade.

A ocorrência de Hiponatremia em um paciente internado pode ser uma iatrogenia fatal, ou levar a sérias seqüelas neurológicas, e se desenvolve em 30% dos pacientes internados em hospitais. Esta condição surge tanto em pacientes adultos quanto em crianças, mas desenvolve-se principalmente em pacientes em pós-operatório.

            A maior parte dos pacientes internados acaba correndo o risco de desenvolver os efeitos da Hiponatremia frente ao uso de soluções hipotônicas que são usadas de forma indiscriminada. Normalmente isso acontece em pacientes sujeitos a diminuição da excreção de água livre que é retida no organismo frente ao estímulo da vasopressina (ADH). Muitos paciente apresentam fator de risco para estímulo da produção de ADH, como podemos ver na Tabela 1.

           

Tabela 1: Situações clínicas onde há estímulo para produção de ADH

Diminuição do Volume Circulante Efetivo

Síndrome da secreção inapropriada de ADH (SSIADH)

HIPOVOLEMIA

         Vômito

         Diarréia

         Diuréticos

         Perda renal de sal

         Hipoaldosteronismo

 

HIPERVOLEMIA

         Sd. Nefrótica

         Cirrose

         ICC

         Hipoalbuminemia

 

HIPOTENSÃO

EUVOLEMIA

         Doenças em SNC: meningite, encefalite, AVC, tumor, abscesso, TCE

         Doenças Pulmonares: pneumonia, asma, tuberculose, empiema, DPOC, IRpA

         Câncer SNC, pulmão, mama, TGI, leucemia, linfoma, etc

         Medicações: ciclofosfamida, vincristina, morfina, inibidores da recaptação de serotonina, carbamazepina

         Dor, stress

         Pós-operatório

         Deficiência de cortisol

 


O estudo

            Este estudo de revisão procurou analisar o aspecto pouco fisiológico da administração de fluídos hipotônicos, o que pode ser nocivo ao paciente, além do uso adequado de fluídos isotônicos e o manejo da encefalopatia por Hiponatremia.

            A revisão foi feita através do PubMed com o uso das seguintes palavras-chave: Hiponatremia, terapia com fluídos, SSIADH, vasopressina, peri-operatório, cirurgia, pneumonia, epidemiologia, criança.

            Os fluídos hipotônicos são muito usados em crianças onde se preconiza soro de manutenção e em adultos em nutrição parenteral total ou no peri-operatório. Esse uso é muito baseado em estudos históricos como o de Holliday e Segar(1957) e o de Talbot et al (1953), onde as taxas preconizadas de sódio eram de 30 a 40 mEq/L (lembremos que o soro fisiológico, NaCl 0,9%, tem 154mEq/L de sódio). Existe um estudo prospectivo que mostra inclusive que o maior preditor de Hiponatremia é a quantidade de água livre usada nas infusões parenterais (estudo em pós cateterização cardíaca), com um odds ratio de 3,7 para cada litro administrado.

 

Aplicação para a Prática Clínica

            A melhor maneira de evitar Hiponatremia em pacientes internados parece ser o uso de soro fisiológico como solução parenteral padrão. Em uma mata-análise de 550 pacientes no pós-operatório, onde os mesmo foram manejados ou com NaCl 0,9% ou com outra solução mais hipotônica (incluindo Ringer Lactato onde a concetração de NaCl é de 130mEq/L), viu-se que a solução fisiológica preveniu o desenvolvimento de Hiponatremia. Entretanto o SF 0,9% não é completamente isento de riscos, pois ele pode ser deletério em situações de deficiência de concentração de urina como no diabetes insipidus. Quanto à chance de desenvolvimento de acidose frente ao uso de SF 0,9%, ainda é necessário se realizar estudos, entretanto a acidose pode se desenvolver com uso de qualquer fluído (incluindo ringer lactato) em pacientes com disfunção renal ou disfunção de múltiplos órgãos e sistemas.

            A encefalopatia por Hiponatremia é uma condição que pode ser fatal, principalmente se considerarmos os erros realizados na sua correção. Os pacientes com maior risco de desenvolver encefalopatia por Hiponatremia são: crianças, paciente do sexo feminino pré-menopausa, pacientes em pós-operatório, paciente com infecção ou lesão cerebral, doença pulmonar ou hipoxemia. A correção deve ser cautelosa, pois deve-se levar em conta o paciente sintomático e não se basear exclusivamente nos valores de exames. No paciente sintomático a correção do sódio deve ser uma prioridade, e deve ser feita idealmente com NaCl 3%. Nos pacientes com sintomas graves como convulsões, parada respiratória ou edema pulmonar neurogênico, é recomendado um bolus de 100mL de NaCl 3% em 10min para reverter o edema cerebral rapidamente, que pode ser feito até 2 ou 3 vezes. Pacientes com sintomas mais leves (cefaléia, náusea, vômitos, letargia) podem receber infusão controlada para corrigir de 4 a 8 mEq/L nas primeiras 4 horas, lembrando de suspender o NaCl 3% quando os sintomas do paciente recrudescerem. Um bom parâmetro para manipular o NaCl 3% é lembrar que para cada 1mL/kg de peso, ocorre correção de 1mEq/L de sódio. Não esquecer de monitorizar o sódio a cada 2 horas durante a correção e que não é recomendável elevar o sódio mais que 12 mEq/L nas primeiras 24 horas e mais do que 15 a 20mEq/L em 48 horas.

            É fundamental lembrarmos dos dados dessa revisão para lembrar que a maior parte dos pacientes que estão internados em hospitais correm sérios riscos de desenvolver Hiponatremia iatrogênica por uso inadequado de soros de manutenção ou reposição com base em soluções hipotônicas.

            Damos destaque aos pacientes em peri-operatório, que são os mais sujeitos a receberem os famosos “soros de manutenção” (na maior parte das vezes prescritos com concentrações hipotônicas por puro desconhecimento e baseado em “tradições”  de prescrição), e que se encontram em situações propensas ao desenvolvimento de Hiponatremia, vide a fisiopatologia de suas doenças e do stress cirúrgico.

            Devemos nos lembrar de usar o velho e bom soro fisiológico com mais freqüência nos pacientes internados visando evitar o desenvolvimento de uma iatrogenia que pode ser fatal ou gerar seqüelas neurológicas: a Hiponatremia.

            Práticas seguras só tem a melhorar a assistência que prestamos aos nossos pacientes, e são o grande foco da medicina atual, que é cheia de riscos.

           

Bibliografia

1.     Aronson D et al. (2002) Hyponatremia as a complication of cardiac catheterization: a prospective study. Am J Kidney Dis 40: 940–946 [Link Livre para o artigo Original]

2.     Moritz ML et al. (2005) Post-operative hyponatremia: a meta-analysis. J Am Soc Nephrol 16: 44A .

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