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Diabetes Melito

Autor:

Vanessa Kerbes Yépez

Médica internista. Médica residente do Serviço de Endocrinologia do Hospital Nossa Senhora da Conceição.

Última revisão: 14/11/2013

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Versão original publicada na obra Fochesatto Filho L, Barros E. Medicina Interna na Prática Clínica. Porto Alegre: Artmed; 2013.

 

Casos Clínicos

A) Uma paciente do sexo feminino, 15 anos, branca, comparece à emergência com dor abdominal, náuseas e vômitos e relata que, na última semana, apresentou poliúria, polidipsia e polifagia. Logo que apaciente chega à emergência, constata-se respiração de Kussmaul e hálito cetótico. Ao realizar exame, evidenciam-se mucosas secas, hipotensão e taquicardia. O abdome apresenta-se com ruídos hidroaéreos, depressível, doloroso à palpação difusa, sem peritonismo. A glicemia capilar é de 437 mg/dL. Nos exames complementares, verificam-se acidose metabólica, glicemia elevada, cetonemia e cetonúria positivas. No leucograma, consta aumento da contagem leucocitária (15.000/ L), sem formas jovens.

B) Um paciente do sexo masculino, 76 anos, negro, procura atendimento devido a febre, fraqueza, distúrbio visual, poliúriae sonolência. O paciente apresenta sinais clínicos de desidratação na admissão, com turgor cutâneo diminuído, mucosas secas, hipotensão e taquicardia. Familiares relataram que tinha febre há três dias, dificuldade para respirar e tosse produtiva. O paciente tem história de diabetes e hipertensão há mais de 10 anos e está em tratamento regular. Nos achados laboratoriais, verificam-se glicemia de 807 mg/dL, osmolaridade maior do que 320 mOsm/kg, apesar de pH de 7,38 e cetonemia ausente.

 

Definição

O diabetes melito (DM) é um grupo de distúrbios metabólicos, com etiologias diversas, que se manifesta com hiperglicemia crônica. Essa alteração decorre de secreção deficiente de insulina pelas células ß-pancreáticas, da resistência periférica à ação da insulina ou de ambas. O DM pode apresentar-se junto a complicações agudas e potencialmente fatais, cetoacidose diabética (CAD) ou estado hiperosmolar não cetótico (EHNC). A longo prazo, essa doença resulta em complicações micro e macrovasculares, causando dano, disfunção e falência de vários órgãos e sistemas, como olhos, rins, coração, nervos e vasos sanguíneos.

 

Epidemiologia

A prevalência do DM tem alcançado proporções epidêmicas, constituindo-se em um dos mais sérios problemas de saúde pública, em especial o DM tipo 2. Esse aumento na prevalência ocorre devido ao índice elevado de pessoas obesas e à diminuição da atividade física, associados ao crescimento e ao envelhecimento da população, bem como ao aumento da sobrevida de pacientes com essa doença.

O DM está associado a complicações que comprometem a qualidade de vida, a produtividade, podendo ocasionar mortalidade prematura. Cerca de 30% dos pacientes que são internados em unidades coronarianas intensivas com dor precordial são diabéticos. O DM é a principal causa de cegueira adquirida e de amputações de membros inferiores não traumáticas no Brasil. Os pacientes com DM correspondem a aproximadamente 26% dos que ingressam em programas de diálise no país.

 

Classificação

A classificação atual foi proposta pela Associação Americana de Diabetes (ADA)1 e divide-se da seguinte forma:

• Diabetes tipo 1 (DM 1). Esse tipo ocorre por destruição de células ß-pancreáticas, geralmente causando deficiência total de insulina.

 

• Diabetes tipo 2 (DM 2). O diabetes tipo 2 resulta de um distúrbio progressivo de secreção e de resistência insulínica.

 

• Outros tipos de diabetes. Outros tipos de diabetes podem surgir, por exemplo, devido a defeitos genéticos na função das células ß-pancreáticas ou na ação da insulina, doenças na função exócrina do pâncreas (p., ex., trauma, pancreatite, carcinoma pancreático, fibrose cística, hemocromatose), endocrinopatias (p. ex., acromegalia, síndrome de Cushing, glucagonoma, feocromocitoma) ou induzidas por medicamentos ou drogas (p. ex., tratamento da síndrome da imunodeficiência adquirida, glicocorticoide, ainterferon), infecções (p. ex., rubéola, citomegalovírus), outras síndromes genéticas associadas ao DM (p. ex., síndrome de Down, de Klinefelter, de Turner, de Prader-Willi).

 

• Diabetes gestacional. Esse diabetes é diagnosticado durante a gestação.

 

Neste capítulo, são abordados apenas os dois tipos mais comuns de diabetes: DM 1 e DM 2 (Tab. 20.1).

O que é a insulina?

A insulina é o principal hormônio anabólico. Ela promove o armazenamento de nutrientes por meio do estímulo à glicogênese hepática e muscular, à transformação de glicose em triacilglicerol no fígado e seu armazenamento no tecido adiposo, à absorção de aminoácidos e à síntese de proteínas no músculo esquelético. Também ocasiona utilização de glicose, pois facilita seu transporte para dentro do músculo e do tecido adiposo, além de inibir a mobilização das reservas.

As células ß-pancreáticas produzem a pró-insulina. Ela sofre clivagem, dando origem à insulina e ao peptídeo C (fragmento sem atividade hormonal) (Fig. 20.1). Ambos são armazenados no mesmo grânulo e secretados em aproximadamente igual proporção. Por isso, o peptídeo C é um indicador da produção endógena de insulina, sendo útil no diagnóstico diferencial de hipoglicemias (endógena vs. exógena) e em casos selecionados de pacientes diabéticos para estimar a produção endógena desse hormônio.

A liberação de insulina é estimulada pelo nível de glicose circulante, e o maior nível de insulina ocorre cerca de 30 a 45 minutos após uma refeição rica em carboidrato, retornando ao basal cerca de 120 minutos após (Fig. 20.2).

 

Fonte: Adaptada de Forti e colaboradores.²

 

Fatores de Risco

Os fatores de risco para o DM 2 são obesidade, história familiar de diabetes, idade superior a 40 anos, sedentarismo, glicemia de jejum alterada ou tolerância à glicose diminuída e diabetes gestacional ou macrossomia fetal (recém-nascidos com mais de 4.000 g).

O DM 1 apresenta componente autoimune em 90% dos casos, tendo menos relação com o história familiar do que o DM 2.

 

Patogênese

O diabetes melito é um estado de hipoinsulinismo absoluto ou relativo. O metabolismo funciona como se o paciente estivesse sempre em estado de jejum. Em casos de diabetes, ocorre basicamente catabolismo e gliconeogênese (Fig. 20.2).

Figura 20.1

Clivagem da pró-insulina em insulina e peptídeo C.

Figura 20.2

O papel da insulina e dos hormônios contrarregulatórios.

 

Diabetes melito tipo 1 (DM 1)

O surgimento dessa doença depende de fatores imunológicos, genéticos e ambientais. O DM 1 é uma doença autoimune em 90% dos casos. Essa doença tem relação com outras doenças autoimunes, como anemia perniciosa, tireoidite de Hashimoto, doença de Addison, vitiligo, entre outras. Os principais autoanticorpos relacionados ao DM 1 são anticorpo anti-ilhota (ICA), positivos em mais de 75% dos casos; anticorpos anti-GAD (ácido glutâmico descarboxilase – enzima presente nas células das ilhotas), positivo em 70% dos pacientes; anticorpo anti-IA-2 (insulinoma-associated-protein 2), positivo em 60% dos casos; anticorpos anti-insulina.

Existem diferentes regiões do genoma humano ligadas ao DM 1, mas o local de mais interesse é o dos genes da região HLA (antígeno de leucócito humano) dentro do complexo maior de histocompatibilidade (MHC) no cromossomo 6p21. A maioria dos diabéticos tipo 1 apresentam o haplótipo HLA DR3 e/ou DR4.

Os fatores ambientais mais conhecidos são infecção viral e fatores dietéticos. O DM 1 manifesta-se apenas após destruição de 80% ou mais das células .

O DM 1 comporta-se como um estado de hipoinsulinismo absoluto, por destruição das células das ilhotas de Langerhans. O metabolismo modifica-se para um quadro de catabolismo excessivo, reconhecendo um estado de jejum quase permanente. A lipólise é ativada e, consequentemente, a cetogênese, predispondo à CAD. Após a apresentação clínica inicial, pode sobrevir um período em que o controle é alcançado com doses pequenas de insulina denominado “lua de mel”. Com a progressão do processo autoimune, o paciente torna-se completamente deficiente de insulina.

 

Diabetes melito tipo 2 (DM 2)

Esta é uma doença diagnosticada principalmente em pacientes acima de 40 anos, em especial nos com sobrepeso/obesidade. Ela é resultado de uma combinação entre resistência periférica à insulina, disfunção das células ß-pancreáticas que secretam insulina em quantidade insuficiente para o controle metabólico e produção hepática excessiva de glicose. O aparecimento do DM 2 depende de uma predisposição genética somada a fatores ambientais e hábitos de vida.

No início do quadro, a tolerância à glicose é normal, apesar da resistência periférica à ação da insulina, pois há um aumento compensatório da secreção desse hormônio no pâncreas. Acredita-se que ocorra uma lenta progressão da disfunção das células ß-pancreáticas, que não suportam o estado de hipersecreção insulínica para contrabalançar o aumento da resistência insulínica. Com isso, há diminuição da secreção de insulina e aumento da produção de glicose hepática, estabelecendo-se o DM 2. Não há importante ativação da lipólise, havendo menor risco de CAD.

 

Sinais e Sintomas

Os sintomas decorrentes da hiperglicemia grave são poliúria, polidipsia e perda de peso, expondo o paciente a maiores taxas de infecção.

As complicações crônicas do diabetes são divididas em vasculares (micro e macrovasculares) e não vasculares e são causadas devido a um estado hiperglicêmico sustentado. Além do próprio DM, existem outras comorbidades comuns em pacientes diabéticos, como, por exemplo, hipertensão e dislipidemia, que aumentam o risco de muitas dessas complicações.

 

Figura 20.3

Alterações no metabolismo em estado de jejum absoluto.

Fonte: Adaptada de Le e colaboradores.³

 

As complicações não vasculares incluem gastroparesia, infecções e alterações cutâneas. Muitos pacientes apresentam essas complicações já no diagnóstico, em virtude do longo período de hiperglicemia em que permaneceram assintomáticos. Outros problemas evidenciados nesses pacientes são catarata e glaucoma.

Existem duas complicações agudas graves e potencialmente fatais no diabetes: cetoacidose diabética (CAD) e estado hiperosmolar não cetótico (EHNC). A primeira manifesta-se quase exclusivamente em diabéticos do tipo 1, podendo ocorrer em diabéticos do tipo 2 em quadros de infecção grave, por exemplo. O estado hiperosmolar não cetótico é típico, porém não exclusivo do DM 2. Esses distúrbios estão associados a deficiência absoluta ou relativa de insulina, depleção de volume e distúrbios acidobásicos. Essas complicações ocorrem na hiperglicemia, com ou sem cetose. É possível observar as diferenças entre essas duas entidades na Tabela 20.2.

 

Fonte: Adaptada de Martins e colaboradores. 4

 

Cetoacidose diabética

A cetoacidose diabética (CAD) é uma complicação aguda que ocorre devido a uma queda dos níveis de insulina, diminuindo o consumo de glicose. Com isso, há um aumento dos hormônios contrarregulatórios, como glucagon, catecolaminas e cortisol, estimulando a gliconeogênese. A CAD manifesta-se mais comumente em diabéticos tipo 1, podendo afetar pacientes com DM 2, e as principais causas são infecção, má adesão e/ou abandono do tratamento, diagnóstico inicial, doença cardiovascular e cerebrovascular, entre outras.

Esses pacientes geralmente se apresentam com poliúria, polidipsia, polifagia, fraqueza e respiração de Kussmaul. Eles também podem apresentar náuseas e vômitos, além de dor abdominal que pode, inclusive, simular um quadro de abdome agudo. Pode-se evidenciar o característico hálito cetótico nesses pacientes. Ao realizar exame, pode haver sinais de desidratação, taquicardia e hipotensão. A partir da análise de exames laboratoriais, verifica-se acidose metabólica, glicemia elevada, cetonemia e cetonúria. É possível observar também elevação de transaminases e leucocitose.

 

Corpos cetônicos

Os corpos cetônicos fornecem energia para os tecidos especialmente durante o jejum. Nessa situação, os níveis de corpos cetônicos elevam-se de tal maneira que entram nas células do sistema nervoso central, onde são oxidados, reduzindo a quantidade de glicose requerida pelo cérebro, além de serem utilizados por outros tecidos (Fig. 20.4).

Os corpos cetônicos incluem o acetoacetato, ß-hidroxibutirato e acetona. A síntese ocorre quando o nível sérico de ácidos graxos está elevado, como no jejum ou como resultado de uma dieta rica em gordura e pobre em carboidrato. As enzimas para a realização da síntese encontram-se principalmente no fígado.

Na CAD, a falta de insulina e o excesso de glucagon simulam um estado de jejum, havendo produção de corpos cetônicos apesar do estado hiperglicêmico.

Pacientes que produzem grandes quantidades de corpos cetônicos, inclusive aqueles em CAD, apresentam odor cetótico.

 

Estado hiperosmolar não cetótico

No estado hiperosmolar não cetótico (EHNC), há hiperglicemia devido à gliconeogênese estimulada pela deficiência de insulina. Com isso, ocorre glicosúria, ocasionando diurese osmótica que predispõe à desidratação. Em condições normais, o rim elimina o excesso de glicose, mas, com essa complicação, a eliminação não acontece, devido à depleção do espaço intravascular e ao comprometimento renal desses pacientes. A hiperosmolaridade é causada pela perda maior de água em relação ao sódio.

Essa complicação é marcada por altos níveis glicêmicos, sinais de desidratação significativos e, algumas vezes, por comprometimento do estado de consciência. Pode afetar indivíduos de todas as idades, porém é mais frequente em idosos com DM 2. Os principais fatores desencadeantes são infecção grave, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e condições debilitantes que limitem o acesso à água.

A apresentação inicial do EHNC é fraqueza, distúrbio visual, poliúria, com sinais clínicos de desidratação profunda e hiperosmolaridade. Evidencia-se turgor cutâneo diminuído, mucosas secas, taquicardia, hipotensão e alteração do nível de consciência. Nos achados laboratoriais, pode-se constatar glicemia acima de 600 mg/dL, osmolaridade maior do que 320 mOsm/kg, pH acima de 7,30 e cetonemia leve ou ausente.

Existem alguns fatores preditores de mortalidade. Entre eles, é possível citar idade, grau de desidratação, instabilidade hemodinâmica, fator desencadeante e nível de consciência.

Figura 20.4

Transporte de corpos cetônicos do fígado para outros tecidos.

 

Diagnóstico

Existem três maneiras de diagnosticar o diabetes, e todas elas exigem um novo teste para confirmação, a menos que existam sintomas inequívocos de hiperglicemia (poliúria, polidipsia e perda de peso). Os exames utilizados são glicemia de jejum, teste de tolerância à glicose após 75 g de glicose (TTG) e glicemia casual. Na Tabela 20.3, constam os valores diagnósticos.

A hemoglobina glicosilada é um teste que tem sido considerado para realizar o diagnóstico de diabetes. Já é sugerido pela Associação Americana de Diabetes (ADA)6 em diretrizes publicadas em janeiro de 2010 no "Diabetes Care". Conforme essa publicação, o valor para diagnóstico é 6,5% ou mais, necessitando, assim como os demais testes, de confirmação. Entretanto, esse assunto ainda está em discussão pelas entidades brasileiras e sem definição até a publicação deste livro.

 

Tratamento

Os objetivos do tratamento do DM são eliminar os sintomas relacionados à hiperglicemia e reduzir complicações a longo prazo. A escolha da terapia farmacológica depende do tipo de DM e do alvo que se pretende atingir. Para controle do DM, usa-se especialmente a hemoglobina glicada (hemoglobina A1C), podendo ser observadas também a glicemia de jejum e a glicemia pós-prandial. A hemoglobina A1C é o método utilizado para verificar o controle a longo prazo, pois reflete os níveis dos últimos 2 a 3 meses.

Em adultos, segundo a ADA, o alvo glicêmico corresponde a hemoglobina A1C abaixo de 7,0%, glicemia de jejum entre 70 e 130 mg/dL e glicose pós-prandial (1 a 2 horas após o início da refeição) menor do que 180 mg/dL.

 

O que é a hemoglobina glicosilada?

Após completar a síntese de proteínas, alguns aminoácidos residuais podem ser quimicamente modificados. Na hemoglobina, essas mudanças ocorrem a partir da glicosilação, resultando em quatro componentes menores, entre eles a hemoglobina A1C (conhecida como hemoglobina glicosilada). A HbA1c corresponde a cerca de 6% do total de hemoglobina em um adulto não diabético. Como as hemácias têm uma meia-vida de cerca de 120 dias, o grau de glicosilação da hemoglobina reflete a glicemia média a que as células ficaram expostas, e a porcentagem de HbA1c é um bom indicador do nível de glicose no período. Apesar de refletir os níveis dos últimos 120 dias, tem melhor correlação com a média glicêmica das últimas 8 a 12 semanas. Valores elevados de HbA1c estão associados a maior risco de complicações micro e macrovasculares de DM.

A frutosamina é formada pela glicosilação de proteínas séricas, especialmente a albumina. Devido à meia-vida da albumina ser menor do que a da hemoglobina, a frutosamina reflete um estado de controle glicêmico nas últimas 1 a 2 semanas. Variações nas concentrações séricas de albumina alteram os valores da frutosamina, necessitando de correção. Devido às limitações do método e à falta de necessidade de avaliar mudanças glicêmicas a cada 1 a 2 semanas, essa ferramenta não é utilizada na prática clínica, sendo preferível a HbA1c para avaliação do controle do diabetes a médio e longo prazo. A frutosamina pode ser uma alternativa quando o paciente apresentar uma condição que altere os valores de HbA1c, como hemoglobinopatias, ou quando houver necessidade de mudanças rápidas no tratamento do DM, como na gestação.

 

Fonte: Adaptada de American Diabetes Association. 5

 

Diabetes melito tipo 1

O tratamento do diabetes melito tipo 1 (DM 1) tem como base o uso de insulina, considerando esse distúrbio como uma deficiência absoluta desse hormônio. Dessa forma, o tratamento objetiva aproximar-se à secreção endógena esperada de insulina para atingir a glicemia desejada. Utiliza-se uma insulina de ação lenta para manter o nível basal e uma de ação rápida antes das maiores refeições, simulando o pico fisiológico pós-prandial.

Na Tabela 20.4, estão listadas as insulinas disponíveis.

 

Diabetes melito tipo 2

Como exposto anteriormente, na fase inicial, o principal problema desse tipo de DM é a resistência insulínica. Portanto, há apenas uma deficiência relativa de insulina nesse momento, sendo os hipoglicemiantes orais os medicamentos de escolha. Entretanto, sabe-se que com a evolução do diabetes melito tipo 2 (DM 2), a insulina pode se tornar necessária, como nos pacientes diabéticos do tipo 1.

 

 

Na Figura 20.5, tem-se algoritmo de tratamento para o DM 2.

Entre os antidiabéticos orais, o mais usado e que é escolha para o diagnóstico é a metformina, uma biguanida. Essa medicação age diminuindo a produção hepática de glicose e reduzindo a resistência periférica àinsulina. Além disso, sabe-se que ela está associada àacidose láctica, sendo contraindicada em situações que predisponham a essa condição, como infecção, insuficiência renal e situações de estresse agudo, como cirurgias.

Na Tabela 20.5, pode-se verificar os hipoglicemiantes disponíveis.

 

Cetoacidose diabética (CAD)

Deve-se priorizar o reconhecimento e o tratamento do fator desencadeante da CAD. O tratamento dessa condição tem como objetivo restabelecer a volemia, diminuir os níveis glicêmicos, resolvendo a cetoacidose e os distúrbios eletrolíticos associados. Para isso, a medida de maior impacto na sobrevida é a reposição volêmica vigorosa.

Outras condutas essenciais são insulinoterapia e reposição de potássio e fosfato quando for necessária.

Figura 20.5

Algoritmo para tratamento do DM 2. Todos os estágios incluem mudança do estilo de vida.

Fonte: Adaptada de Nathan e colaboradores. 7

 

 

Estado (EHNC) hiperosmolar não cetótico

Os princípios terapêuticos do EHNC são os mesmos da CAD, atentando para a reposição hídrica vigorosa antes da instituição da insulinoterapia.

A reposição eletrolítica também deve ser realizada quando for necessária.

 

Prevenção

Em casos de DM 1, não existem medidas estabelecidas para a prevenção do surgimento dessa doença.

Já o DM 2 é precedido por um período de tolerância à glicose reduzido, em que a mudança no estilo de vida pode retardar ou impedir a evolução para o DM. Estudos evidenciam que dieta e exercício físico, nesse grupo de pacientes, preveniu/adiou o surgimento do DM 2.

 

Casos Clínicos Comentados

A) Nesse caso, o paciente não sabia que era diabético até a admissão hospitalar.

Apresentou-se com quadro inespecífico de dor abdominal, náuseas e vômitos, sintomas que podem fazer parte da apresentação clínica de uma CAD. A presença de poliúria, polidipsia e polifagia reforçaram essa hipótese. Além disso, o hálito cetótico e a respiração de Kussmaul são sinais clássicos dessa situação clínica, apesar de nem sempre estarem presentes.

Os exames foram compatíveis com esse diagnóstico, evidenciando acidose metabólica, hiperglicemia e cetonemia positiva. A leucocitose é um sinal que pode ser atribuído a essa descompensação aguda, mas é necessário sempre pesquisar outros fatores que possam ser responsáveis.

Pode-se concluir que esse paciente é portador de DM 1, e que a primeira manifestação foi a de um quadro grave de CAD.

 

B) O idoso desse caso clínico era diabético há mais de 10 anos e compareceu à emergência com sinais clínicos de desidratação e história compatível com pneumonia adquirida na comunidade.

O paciente apresentou alteração do estado de consciência, fraqueza e alteração visual, e familiares relataram também poliúria.

Os exames confirmaram a hipótese clínica de EHNC, com hiperglicemia (807 mg/dL) e osmolaridade aumentada, mas não se observaram acidose ou cetonemia.

A radiografia de tórax realizada na emergência evidenciou consolidações em base pulmonar direita, certificando a hipótese de pneumonia. Dessa maneira,conclui-se que muito provavelmente esse quadro infeccioso desencadeou um EHNC. Essa é uma complicação mais frequentemente observada em idosos portadores de DM 2, como no caso descrito.

 

Referências

1.American Diabetes Association. Diagnosis and classification of diabetes mellitus. Diabetes Care. 2009;32 Suppl 1:S62-7.

2.Forti A, Loureiro R, Gusmão A. Diabetes mellitus: classificação e diagnóstico. In: Vilar L, editor. Endocrinologia clínica. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. p. 539-50.

3.Le T, Bhushan V, Tolles J. First Aid for the USMLE Step 1 2011. New York: McGraw-Hill Medical; 2011.

4.Martins HS, Admoni SN, Brandao Neto RA. Hiperglicemias. In: Martins HS. Brandao Neto RA, Scalabrini Neto A, Velasco IT, organizadores. Emergências clínicas: abordagem prática. 3. ed. Barueri: Manole; 2007. p. 983-95.

5.American Diabetes Association. Standards of medical care in diabetes - 2008. Diabetes Care. 2008;31 Suppl 1:S12-54.

6.American Diabetes Association. Executive summary: standards of medical care in diabetes - 2010. Diabetes Care. 2010;33 Suppl 1:S4-10.

7.Nathan DM, Buse JB, Davidson MB, Ferrannini E, Holman RR, Sherwin R, et al. Medical management of hyperglycemia in type 2 diabetes: a consensus algorithm for the initiation and adjustment of therapy: a consensus statement of the American Diabetes Association and the European Association for the Study of Diabetes. Diabetes Care. 2009;32(1):193-203.

 

Leituras Recomendadas

American Diabetes Association. Standards of medical care in diabetes - 2007. Diabetes Care. 2007;30 Suppl 1:S4-S41.

Golbert A, Bonatto C, Almeida SL. Diabetes mellitus tipo 1:aspectos epidemiológicos, patogenéticos e clínico-laboratoriais. In: Vilar L, editor. Endocrinologia clínica. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. p. 551-5.

Marks DB, Marks AD, Smith CM, editors. Basic medical biochemistry: a clinical approach. Baltimore: Williams & Wilkins; 1996.

Powers AC. diabetes melito. In: Kasper D, Fauci A, Longo DL, Braunwald E, Hauser SL, Jameson JL, editores. Harrison: medicina interna. 16. ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill; 2006.p. 2260-88.

Sociedade Brasileira de Diabetes. Consenso brasileiro sobre diabetes 2002: diagnóstico e classificação do diabetes melito e tratamento do diabetes melito do tipo 2. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2003.

Sociedade Brasileira de Diabetes. Atualização brasileira sobre diabetes. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2005.

Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 20093. ed. Itapevi: Araújo Silva Farmacêutica; 2009.

Stoner GD. Hyperosmolar hyperglycemic state. Am Fam Physician.2005;71(9):1723-30.

Trachtenbarg DE. Diabetic Ketoacidosis. Am Fam Physician.2005;71(9):1705-14.

 

 

 

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