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Diarreia Crônica

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 04/04/2016

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Introdução, definições e epidemiologia

Diarreia é definida como alteração intestinal caracterizada por aumento da frequência ou consistência anormal das evacuações, com essa definição cerca de 5% das pessoas adultas apresentam quadros crônicos de diarreia. Apesar do aumento do número de evacuações (mais de três ao dia) ser considerada parte da definição, os pacientes em geral não consideram que têm diarreia se não apresentam alteração da consistência das fezes, de forma que do ponto de vista prático, a procura do médico pela queixa de diarreia consiste principalmente na alteração da consistência das fezes.

Um parâmetro objetivo que poderia ser usado é o peso das fezes, mas a maioria dos autores não usa esse dado isoladamente para definir diarreia, mesmo assim valores de peso fecal acima de 200 gramas ao dia sugere presença de diarreia, e valores acima de 500 gramas ao dia torna improvável o diagnóstico de doença funcional. Quanto ao tempo de evolução as diarreias podem ser divididas em:

 

Aguda: até duas semanas.

Protraída ou persistente: entre 2-4 semanas.

Crônica: mais do que quatro semanas.

Outros autores sugerem que o tempo mínimo para considerar diarreia crônica é de seis semanas, a literatura médica em geral varia entre 4-8 semanas.

 

Uma outra divisão utilizada pela literatura é a da localização da diarreia, nesse caso as diarreias podem ser divididas em:

Alta: proveniente do intestino delgado, os episódios diarreicos são mais volumosos. Causa síndrome disabsortiva associada com esteatorreia.

Baixa: evacuações  em pouca quantidade, frequentes, associadas a tenesmo e urgência fecal.

Funcional: causada pela hipermotilidade intestinal. (Ex: síndrome do intestino irritável)

 

A diarreia crônica é um sintoma relativamente comum sendo descrita em 3-5% da população adulta, mas os estudos são escassos, já em crianças prevalência mundial varia de 3 a 20%. As principais etiologias variam conforme o país, sendo que em países desenvolvidos as etiologias mais importantes são síndrome do intestino irritável, doença inflamatória intestinal idiopática e síndromes de má-absorção, já em países subdesenvolvidos as causas infecciosas  são as mais importantes.

Os custos e morbidade associados a essa condição são consideráveis, calcula-se que 350.000.000 dólares são perdidos ao ano devido ao absenteísmo, fora outros custos associados, sendo que alguns pacientes têm dificuldade em manter o emprego devido às faltas constantes. O efeito na qualidade de vida é a principal complicação da doença com diversos estudos com questionários de qualidade de vida mostrando impacto negativo nesses pacientes.

 

O principal papel da história e exame físico nesses pacientes é tentar diferenciar os casos orgânicos dos funcionais, existem 17 pontos essenciais que devem ser avaliados na história desses pacientes:

1. Verificar se diarreia é a queixa principal, ou se parte de outras manifestações mais significativas para o paciente.

2. As características no aparecimento devem ser descritas da forma mais precisa possível, se a manifestação ocorre desde o nascimento, se ocorreu de forma abrupta ou gradual.

3. Avaliar padrão da diarreia, se as fezes são amolecidas, se o caráter é intermitente ou contínuo.

4. Duração dos sintomas.

5. Achados epidemiológicos, como viagens antes do aparecimento dos sintomas. Exposição à água ou comida e acometimento de outras pessoas.

6. Quais são as características das fezes: Se líquidas, gordurosas ou sanguinolentas.

7. Avaliar se o paciente apresenta incontinência fecal.

8. Avaliar se o paciente apresenta dor abdominal associada e qual as suas características. Dor é frequentemente presente se doença inflamatória intestinal está presente. Outras condições que costumam evoluir com dor é a síndrome do intestino irritável, em geral com dor no quadrante inferior direito e isquemia mesentérica.

9. Avaliar se o paciente apresentou perda de peso, apesar desse sintoma poder ocorrer em qualquer etiologia de diarreia. Uma perda substancial de peso torna mais prováveis diagnósticos como síndrome de má-absorção, neoplasia e isquemia.

10. Verificar presença de fatores de piora como dieta e estresse. Pacientes com piora com estresse emocional têm maior chance do diagnostico de síndrome do intestino irritável.

11. Avaliar se existem fatores de melhora como alteração na dieta e uso de medicações.

12. Observar resultados de avaliações e exames realizados previamente.

13. Descartar possíveis causas iatrogênicas.

14. Avaliar causas de diarreia factícia, como uso de laxativos. O diagnóstico é mais provável em pacientes com história de distúrbios alimentares e psiquiátricos, entre outros.

15. Avaliar se o paciente apresenta doenças sistêmicas que podem cursar com diarreia, como hipertireoidismo, diabetes mellitus, doenças do colágeno, doenças inflamatórias, neoplásicas, imunodeficiências em particular o HIV (que apresenta associação importante com diarreia crônica) entre outras condições.

16. Avaliar se existe um horário específico do dia em que ocorre a diarreia e volume das fezes. Diarreias que ocorrem principalmente à noite são frequentemente associadas com diabetes e supercrescimento bacteriano, diarreias com alto volume como mais de 1 litro ou 1 Kg ao dia, mesmo com jejum sugerem diarreia secretória como as que ocorrem na síndrome da cólera pancreática.

17. História de hábitos alimentares e sexuais. 

 

Diferenciação de quadros funcionais e orgânicos

Em pacientes com diarreia crônica, descartar quadros funcionais é de extrema importância, sendo o mais importante a síndrome do intestino irritável, que muitos autores classificam separadamente de outras causas de diarreia funcional. Os pacientes com síndrome do intestino irritável cursam com uma combinação de sintomas como dor abdominal e alteração do hábito intestinal, que pode incluir constipação ou diarreia, alguns pacientes apresentam diarreia sem associação com dor, que pode ser funcional, mas não preenche critérios para o diagnóstico de síndrome do intestino irritável.

Os pacientes com síndrome do intestino irritável frequentemente apresentam dor em cólica, na maioria das vezes localizada no quadrante inferior direito do abdôme, a diarreia é usualmente apenas no período em que paciente está acordado, não necessitando  levantar  à noite com urgência intestinal. Existem dois critérios diagnósticos para síndrome do intestino irritável, respectivamente critérios de Manning e de Roma, que são especificados na tabela abaixo:

 

Tabela: Critérios de Manning para síndrome do intestino irritável

Alívio da dor com a defecação.

Evacuações mais frequentes quando inicia a dor abdominal.

Fezes mais amolecidas quando inicia a dor.

Distensão abdominal visível.

Passagem de muco pelas fezes.

Sensação de evacuação incompleta.

 

 OBS: A probabilidade do diagnóstico aumenta com o número de critérios em pacientes de 40 anos de idade com todos os critérios tem 80% de probabilidade de apresentar síndrome do intestino irritável.

 

Tabela: Critérios de Roma para síndrome do intestino irritável

1-Dor ou desconforto abdominal recorrente pelo menos três dias da semana nos últimos três meses

2-Melhora com defecação.

3-Ínicio associado com aumento de evacuações.

4-Ínicio associado com mudança na consistência das fezes.

OBS: Para o diagnóstico é necessário o critério 1, mais DOIS critérios.

 

Uma condição que pode se confundir com diarreia crônica é a incontinência fecal, que muitas vezes é referida para o médico como diarreia, é definida como passagem de fezes em geral amolecidas sem realização de esforço evacuatório. 

 

São sintomas sugestivos de alteração funcional:

-Duração maior que um ano;

-Ausência de perda de peso;

-Sem diarreia noturna;

-Esforço para evacuar.

 

Quando esses indicadores estão presentes temos  um quadro funcional em 70% ou mais dos casos.

 

Etiologias

Uma das maiores dificuldades na avaliação de pacientes com diarreia crônica é o enorme número de etiologias possíveis, a tabela abaixo especifica as principais causas de diarreia conforme seu mecanismo de aparecimento. As doenças inflamatórias intestinais têm como primeira manifestação em geral 15 e 40 anos de idade e a diarreia tem características inflamatórias, com sangue nas fezes em cerca de 75% dos casos, a gravidade das exacerbações tem correlação frequente com o número de episódios diarreicos.

 

Tabela: Causas de diarreia (adaptado da revisão técnica da American Gastroenterology Association)

Diarreia Osmótica

Ingestão de magnésio, fosfatos e laxativos.

Má-absorção de carboidratos (como no uso da acarbose)

Diarreia Gordurosa ou Por Má-Absorção

Doenças da mucosa intestinal.

Síndrome do intestino curto.

Doença celíaca.

Diarreia pós-ressecção intestinal.

Supercrescimento bacteriano no intestino delgado.                                     

Insuficiência pancreática exócrina.

Diminuição de ácidos biliares em intestino.

Diarreia Inflamatória

Doença inflamatória intestinal.

Diverticulite.

Colite pseudomembranosa.

Infecções bacterianas invasivas como por Yersínia.

Tuberculose intestinal.

Infecções virais ulcerativas: citomegalovírus, herpes simples.

Amebíase, giardíase e outras parasitoses.

Colite isquêmica.

Colite por radiação.

Neoplasias: colônica e linfoma.

Diarreia Secretória

Uso de laxativos não osmóticos.

Síndrome pós-colecistectomia por sais biliares.

Fibrose cística (cloridorrreia).

Toxinas bacterianas.

Má-absorção de sais biliares.

Doença inflamatória intestinal, colite por colagenose, diverticulite e colite microscópica.

Vasculites.

Medicações.

Alterações da motilidade intestinal: pós-vagotomia e simpatectomia, neuropatia autonómica diabética, hipertireoidismo e síndrome do intestino irritável.

Tumores neuroendócrinos: Vipoma, Gastrinoma, Glucagonoma, Somatostatinoma, Mastocitose, Síndrome carcinoide, carcinoma medular de tireoide.

Neoplasias: colônica, linfoma e adenoma viloso.

Doença de Addison.

Diarreia secretora epidémica (Síndrome de Brainerd).

Diarreia secretória idiopática.

 

A colite microscópica, por sua vez, pode cursar apenas com diarreia aquosa e ocorre principalmente em pacientes de meia-idade. As síndromes de má-absorção cursam com fezes volumosas, frequentemente mal-cheirosas, com perda de peso associada.

 

Achados de exame físico e complementares

A-Exame físico

Um exame físico detalhado é necessário em pacientes com diarreia, e pode eventualmente dar pistas para o diagnóstico. A presença de lesões de pele como pioderma gangrenoso e dermatite herpetiforme sugerem respectivamente o diagnóstico de doença inflamatória intestinal e doença celíaca. A presença de linfadenopatia, por sua vez, pode sugerir HIV. Atenção especial deve ser dada para exame abdominal e também anoretal, procurando abscesso e fístula perianal.

 

 

B-Exames complementares

Alguns exames mínimos são recomendados para avaliação dos pacientes e incluem:

-Hemograma completo;

-VHS;

-TSH;

-Proteínas totais e frações;

-Dosagem de eletrólitos.

 

Achados como leucocitose sugerem inflamação ou infecção, por sua vez, eosinofilia pode aparecer em neoplasias, doenças alérgicas, parasitoses, gastroenterite e colite eosinofílica e doenças do colágeno. Os eletrólitos são necessários para avaliar complicações relacionadas à diarreia. Outros exames são dependentes de outros achados de história e exame físico e principalmente as características da diarreia, se inflamatória, osmótica, esteatorreia ou diarreia secretora.

 

C-Testes terapêuticos

Se após a avaliação inicial o diagnóstico não se torna evidente, uma das opções é a realização de testes terapêuticos como interrupção de medicações que poderiam causar diarreia. Em áreas endêmicas, tratamento empírico para diarreia infecciosa com uma quinolona ou tratamento empírico de giardíase e amebíase são medidas custo-eficazes, deve-se lembrar de que qualquer teste terapêutico deve ter objetivos específicos para não atrasar avaliações posteriores. O uso de quelantes biliares para diarreias com má-absorção de sais biliares também é uma estratégia diagnóstica validada.

 

D-Avaliação das fezes dos pacientes

Uma análise quantitativa e qualitativa das fezes do paciente pode facilitar o diagnóstico. A análise deve incluir peso, conteúdo de gorduras, osmolaridade, presença de eletrólitos nas fezes, sangue oculto e PH.

O peso fecal pode fornecer informações relevantes, por exemplo, fezes com peso maior de 500 gramas praticamente excluem o diagnóstico de síndrome do intestino irritável e outros quadros funcionais, já fezes com menos de 1.000 gramas excluem síndrome de cólera pancreática.

A análise de eletrólitos fecais e gap osmolar é de grande importância no diagnóstico diferencial da diarreia crônica. O gap osmolar é calculado através da seguinte fórmula: 290 – 2 x (Na + K), pode-se ainda usar a osmolaridade medida nas fezes, mas o uso do número fixo de 290 se mostrou uma abordagem superior nos estudos específicos. Em pacientes com diarreia osmótica o gap osmolar é maior do que 125 mosm/Kg, nesse caso a osmoaridade é dependente de outras substâncias nas fezes que não eletrólitos, já quando o gap osmolar é menor do que 50 mosm/Kg o diagnóstico provável é de diarreia secretória. Em processos mistos o gap varia entre 50 a 124 mosm/Kg.

A análise do PH fecal, por sua vez, pode ajudar no diagnóstico de má-absorção de carboidratos. Quando o PH fecal é menor do que 5,3 o diagnóstico é provável, já quando o PH é maior que 5,6 o diagnóstico se torna improvável.

A pesquisa de sangue oculto nas fezes pode auxiliar o diagnóstico, pois várias condições podem estar associadas com sua positividade, incluindo doença celíaca, diarreia secretória idiopática e diarreia pancreática, uso de laxativos e colite microscópica. Em pacientes com doença celíaca, por exemplo, cerca de 50% apresentam o teste positivo, sendo que isso ocorre em 70% dos que apresentam doença refratária.

A positividade dos leucócitos fecais  pode sugerir o diagnóstico de diarreia inflamatória com sensilidade de 70%, mas especificidade de apenas 50%, já o teste látex para lactoferrina é altamente sensível para diagnóstico de diarreia aguda infecciosa.

A pesquisa de gordura fecal também é importante na avaliação desses pacientes e pode ser pequisado pelo teste Sudan ou por medida direta. O teste de Sudan para gordura fecal apresenta 86% de especificidade para detecção de gordura nas fezes com sensibilidade de 87 a 100%. Quando o conteúdo de gordura fecal é maior que 14 gramas ao dia, é provável que exista quadro de má-absorção, já resultados entre 7-14 gramas apresentam pouca especificidade. A gordura fecal pode ainda ser avaliada por concentração de gordura nas fezes, quando a gordura fecal é superior a 8% existe grande possibilidade do diagnóstico de insuficiência pancreática exócrina.

Em pacientes em que o diagnóstico não foi possível com exames anteriores, a dosagem de laxativos nas fezes é indicada, principalmente em pacientes com diarreia osmótica. Alguns testes mais simples podem ser realizados como a alcalinização das fezes, que pode revelar a presença de fenolftaleína, pois as fezes ficam rosadas, o aumento de magnésio nas fezes também pode sugerir uso de certos agentes laxativos.

 

Avaliação adicional dependente do tipo de diarreia

A diarreia crônica pode ser subdividida em:

-Diarreia aquosa: que pode ainda ser dividida em secretória ou osmótica;

-Diarreia inflamatória;

-Diarreia gordurosa.

 

Especificaremos medidas adicionais para investigação dos diferentes tipos de diarreia:

A-Diarreia aquosa secretória

Os pacientes com diarreia secretória apresentam algumas características:

-Volume usualmente maior do que 1 litro;

-Diarreia permanece mesmo quando o paciente se encontra em jejum;

-Gap osmolar pode ajudar a diferenciar a diarreia osmótica da secretória, Como já comentado anteriormente, Gap osmolar menor do que 50 mosm é indicativo de diarreia secretória.

 

Em pacientes com diarreia crônica aquosa secretória a investigação adicional inclui três estratégias:

1-Cultura nas fezes: deve-se descartar infecções e parasitoses. Embora raramente infecções bacterianas causem diarreia crônica, estas podem ser excluídas através de culturas, incluindo, inclusive, meios de pesquisa específicos para Aeromonas e Pleiomonas. A investigação deve incluir pesquisa de parasitas e ovos, em específico Cryptosporidium, Microsporidium e Giardia. Pesquisa de antígeno de Giardia  nas fezes pode ser realizada com ensaios enzimáticos que apresentam grande sensibilidade. Aspirados do intestino delgado podem realizar culturas quantitativas e testes respiratórios com xilose radiomarcada para pesquisar supercrescimento bacteriano, embora provavelmente só deva ser pesquisado em pacientes com condições que predisponham o supercrescimento bacteriano. Imunosuprimidos, por sua vez, frequentemente apresentam infecções por campylobacter e salmonella, em pacientes que fizeram uso de antibiótico de amplo espectro deve-se excluir infecção fúngica. Outros agentes que devem ser descartados são entamoeba hystolitica, que pode ser descartada por exame sorológico, e strongylóides stercoralis.

2-Doenças estruturais: devem ser excluídas com exames radiográficos do intestino delgado, retosigmoidoscopia ou colonoscopia com múltiplas biopsias da mucosa colônica, tomografia computadorizada de abdome e enteroscopia para biopsia da mucosa de intestino delgado. Em alguns pacientes, a sigmoidoscopia pode ser suficiente, pois 85% dos achados patológicos são ao seu alcance, mas em circunstâncias como anemia ferropriva associada deve-se realizar colonoscopia.

3-Testes seletivos para pesquisa de diarreia secretória com pesquisa de toxinas ou neuro-hormônios: Em diarreias de mais de 1 Kg ao dia com hipocalema deve ser suspeitado de cólera pancreática ou Vipoma, seu diagnóstico é confirmado pela dosagem do peptídeo vasoativo intestinal ou VIP. Outras síndromes secretivas pancreáticas associadas com diarreia incluem glucagonoma e Zollinger-Ellison que podem ser conformados com dosagem respectivamente de glucagon e gastrina. A pesquisa de calcitonina serve para diagnóstico de carcinoma medular da tireoide, que também pode evoluir com diarreia secretora, deve-se ponderar que devido à raridade desses diagnósticos, a dosagem desses hormônios deve ser limitada a pacientes com probabilidade diagnóstica razoável. Testes urinários também podem ser utilizados nesstas circunstâncias e incluem dosagem de ácido hidróxiindolacético e histamina, que podem estar aumentados em pacientes com síndrome carcinoide e metanefrinas ou ácido vanil-mandélico podem sugerir o diagnóstico de feocromocitoma. Hipertireoidismo deve ser descartado com dosagem de TSH e dosagem de cortisol e teste da cortrosina se a suspeita for de insuficiência adrenal. Em alguns pacientes, a realização de teste terapêutico com colestiramina pode ser útil.

 

B-DIARREIA OSMÓTICA

A maioria das diarreias osmóticas não associadas a esteatorréia é  causada por algum carboidrato osmoticamente ativo e não absorvível (sorbitol, lactulose...) ou por ingestão de magnésio. A avaliação nesses pacientes inclui:

-abuso de laxativos e intolerância a lactose estão incluídos nas principais hipóteses e devem ser investigados incluindo na hipótese diarreia factícia;

-avaliação de fezes com verificação de PH, caso PH diminuído o diagnóstico de má-absorção de carboidratos é provável;

-teste  de intolerância à lactose com teste respiratório com hidrogênio ou biopsia com dosagem de lactase na mucosa.

 

C-DIARREIA INFLAMATÓRIA

Pacientes com sangue ou pus nas fezes devem ser avaliados para possibilidade de diarreia inflamatória. Essas diarreias são decorrentes da liberação de citoquinas e mediadores inflamatórios na mucosa intestinal. Têm a presença de muco, pus ou sangue nas fezes e sua causa clássica é a doença inflamatória intestinal. Para o diagnóstico é necessária a realização de sigmoidoscopia ou colonoscopia ou exames radiológicos contrastados ou tomografia de abdome, ou coprocultura e exame protoparasitológico de fezes para excluir causas infecciosas. A pesquisa de leucócitos fecais é positiva em mais de 70% dos casos. Outras causas que devem ser avaliadas nesses pacientes são colite pseudo-membranosa, isquemia, enterite por radiação e neoplasia. Em geral, o diagnóstico etiológico definitivo só é possível com a realização de biopsias.

 

D-ESTEATORREIA E OUTAS FORMAS DE MÁ-ABSORÇÃO

Acompanha má-absorção de lipídios e sempre tem origem no intestino delgado. (Ex: Insuficiência pancreática exócrina, colestase, doença celíaca, doença de Crohn, estrongiloidíase...). Esses pacientes precisam  confirmar a má-absorção através da pesquisa de gordura fecal. Devem ainda realizar exames radiográficos contrastados do intestino delgado para excluir problemas estruturais, também biopsias e aspirados do intestino delgado com culturas quantitativas devem ser realizados. As possibilidades diagnósticas nesses pacientes incluem insuficiência pancreática e ausência de bile, assim testes para avaliar insuficiência pancreática devem ser realizados.

O primeiro passo nesses pacientes é usualmente excluir doença estrutural com TC ou Radiografia contrastada de ID e Bx, eventualmente teste sorológico para doença celíaca. A insuficiência pancreática pode ser avaliada pelo teste da secretina e pesquisa de quimiotripsina fecal. Os principais testes para avaliação desses pacientes são descritos a seguir:

-Teste quantitativo de gordura fecal:

Quantidade de gordura presente nas fezes acumuladas em 72 horas (período no qual o paciente terá ingerido uma dieta rica em gorduras, pelo menos 100g-dia). Em uso dessa dieta indivíduos normais secretam menos de 7g-dia.

 

-Teste qualitativo de gordura fecal:

Usa o corante para gorduras Sudan III.

 

-Teste da D-Xilose urinária:

Em pessoas normais é esperado que após cinco horas da ingesta de 25g de D-Xilose, 5g sejam encontrados na urina. Não depende de enzimas pancreáticas para ser absorvida. A hiperproliferação bacteriana e a lesão da mucosa do intestino proximal reduzem a absorção de D-Xilose. Tem pouca aplicação.

 

-Teste da Bentiromida:

É um peptídeo sintético ligado a um ácido, o PABA. Esta ligação é desfeita pela quimiotripsina, enzima pancreática. O PABA é excretado na urina na forma de arilaminas. Se após a ingestão de 500mg de bentiromida a excreção de arilaminas for menor do que 50%, diagnostica-se insuficiência pancreática exócrina.

 

-Dosagem da tripsina sérica:

–É mais específico e menos sensível do que o teste da bentiromida urinária.

 

-Teste de Schilling:

–Administra-se 1 mcg de cianocobalamina marcada por via oral, e se faz ao mesmo tempo 1000mcg de B12 IM. Se for identificada na urina é sinal que não há má-absorção dessa vitamina.

–Causas de má-absorção de vitamina B12: Hipocloridria, ausência de fator intrínseco, deficiência exócrina do pâncreas, hiperproliferação bacteriana, lesão de receptores ileais.

 

-Testes respiratórios:

 –Teste C14-Xilose: as bactérias intestinais catabolizam a xilose, liberando CO2. Diagnostica hiperproliferação bacteriana.

 -Teste de exalação da Lactose-H2: deficiência de lactase.

 -Teste respiratório com H2: positividade do teste indica má-absorção de carboidratos.

 

A má-absorção de carboidratos, deve-se lembrar, também é sugerida por PH fecal diminuído (abaixo de 5,3). A doença celíaca é outra síndrome que cursa com diarreia associada à ingestão de glúten, além das manifestações gastrointestinais o paciente pode evoluir com manifestações sistêmicas como artrite, nefropatia por IgA entre outras, seu diagnóstico pode ser sugerido por testes sorológicos com anticorpos anti-endomísio, anticorpos anti-gliadina e anti-transglutaminase, mas o diagnóstico definitivo exige biopsia.

Outra forma de má-absorção é a de proteínas que ocorre na enteropatia perdedora de proteínas, que deve ser suspeitada quando pacientes apresentando hipoalbuminemia. O aumento da alfa-1 anti-tripsina fecal sugere o diagnóstico, excreção fecal de albumina radioativa marcada pode ser utilizada para o diagnóstico.

 

Tratamento

O tratamento é dependente da causa de base, assim pacientes com insuficiência pancreática deveriam, por exemplo, realizar reposição de enzimas pancreáticas, mesmo em pacientes em que esse diagnóstico não é definitivo, um teste terapêutico pode ser realizado.

O tratamento empírico pode ser tentado em casos sem diagnóstico de certeza. A loperamida, ou uso de opiáceos, é a  melhor opção para o tratamento sintomático, já o octreotide e a clonidina têm uso descrito em diarreia inespecífica, com a clonidina aparentemente apresentando benefício na diarreia associada com a neuropatia autonômica do diabetes. O uso de probióticos, por sua vez, tem benefício duvidoso, parecendo haver resultados em pacientes com colite pseudomembranosa.

Em locais endêmicos para parasitoses ou para diarreia infecciosa bacteriana pode ser tentada antibióticoterapia empírica ou antiparasitários. Em pacientes com hipótese diagnóstica de deficiência de sais biliares o teste com colestiramina é talvez a medida mais custo-eficaz para seu diagnóstico. Em pacientes com diarreia crônica e HIV, uma hipótese sempre a ser considera é diarreia pelas medicações, os testes investigativos devem ser realizados, mas terapia empírica não é benéfica e os pacientes com infecções oportunistas frequentemente melhoram com a recuperação da imunidade, em pacientes em que o diagnóstico não se torna claro, o tratamento sintomático com agentes anti-motilidade são possivelmente benéficos.

Não se deve esquecer da terapia de suporte com hidratação oral, e se necessário endovenosa, já o uso de nutrição parenteral é reservado para pacientes que não conseguem manter estado nutricional adequado devido à diarreia.

 

Referências

Fine KD, Schiller LR. AGA technical review on the evaluation and management of chronic diarrhea. Gastroenterology 1999; 116:1464.

 

American Gastroenterological Association medical position statement: Guidelines for the evaluation and management of chronic diarrhea. Gastroenterology 1999; 6: 146-1463.

 

Siddiqui U, Bini EJ, Chandarana K, et al. Prevalence and impact of diarrhea on health-related quality of life in HIV-infected patients in the era of highly active antiretroviral therapy. J Clin Gastroenterol 2007; 41:484.

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