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Estado de Mal-Epiléptico

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 21/07/2016

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Crises epilépticas acontecem por atividade elétrica anormal, excessiva e síncrona de grupos de neurônios levando a manifestações neurológicas variadas a depender do local em que ocorrem. A maioria das convulsões é breve e autolimitada. A probabilidade de um indivíduo apresentar uma crise epiléptica em qualquer momento da vida é estimado entre 5 a 10%. Em cerca de 25% das crises, um fator causal pode ser identificado. Essas crises são denominadas crises agudas sintomáticas (ou crises provocadas). Os principais desencadeantes identificáveis de crises agudas sintomáticas incluem distúrbios no equilíbrio hidroeletrolítico ou ácido-básico (geralmente associados a doenças clínicas), hipoglicemia ou hiperglicemia, hipóxia, medicamentos (por exemplo, quinolonas), intoxicação exógena por drogas que rebaixem o limiar epiléptico, abstinência de drogas sedativas ou insulto neurológico agudo (vascular, infeccioso, etc.). Crises agudas sintomáticas tendem a não mais recorrer, uma vez eliminado o fator desencadeante.

O estado de mal-epiléptico é definido como uma crise prolongada ou múltiplas crises sem retorno completo do nível de consciência, e continua a ser  uma emergência neurológica relativamente comum, com uma incidência anual de 10-41 por 100.000 pessoas ao ano. O tempo que define uma crise prolongada foi definido por consenso como mais de cinco minutos de crise documentada ou pelos movimentos estereotipados da convulsão, ou de documentação eletroencefalográfica da crise.

 

Definição

Historicamente, a International League Against Epilepsy em 1981 (ILAE) definiu que o estado de mal-epiléptico representa um quadro convulsivo sem recuperação completa entre eles. Essa definição tem a falha de não definir um prazo definitivo de duração da convulsão para determinar com precisão e tratar estado de mal-epiléptico. Assim, o estado epiléptico foi redefinido como uma convulsão com duração de 60 minutos, sendo que posteriormente o diagnóstico foi refinado pela Fundação Epilepsia para uma convulsão com uma duração de 30 minutos, com base em estimativas da convulsão.

Assim, o tempo utilizado para definição de crise prolongada, pela literatura médica até recentemente, era de crise de mais de 30 minutos, mas estudos em modelos animais mostraram que lesões neuronais irreversíveis ocorrem em tempo menor do que 30 minutos. A maioria das convulsões é breve  e não deve durar mais do que 1-2 minutos antes da resolução espontânea.

Recentemente foi definido por consenso que um tempo de cinco minutos de duração seria mais apropriado para definição do estado de mal-epiléptico. Existe polêmica nessa definição temporal e alguns autores preferem utilizar o termo de crise entre 5 e 30 minutos como estado pré mal-epiléptico. Assim, a definição mais aceita atualmente de estado de mal-epilético é:

 

- Duração de cinco minutos ou mais de atividade convulsiva ou

- Duas crises convulsivas sem recuperação da consciência entre elas.

 

Essa nova definição enfatiza dois momentos críticos: a duração da convulsão e o momento em que uma crise prolongada pode levar a consequências a longo prazo, incluindo lesão neuronal e morte celular. A ausência de resposta com o tratamento padrão (em geral uso inicial de benzodiazepínico e pelo menos uma droga anticonvulsivante) define o estado de mal-epiléptico refratário.

O termo estado de mal convulsivo é utilizado quando as crises são associadas a espasmos rítmicos de extremidades, já quando é encontrada atividade epiléptica no EEG, mas sem movimentos das extremidades a crise é referida como estado de mal-epiléptico não convulsivo.

A mortalidade total associada com estado de mal-epiléptico é de 20% representando cerca de 45-74% de todos os casos. Vários avanços no estudo de estado de mal-epiléptico têm sido alcançados  e o aumento do uso do monitoramento com eletroencefalografia mostrou alta prevalência de convulsões e estado epiléptico em ambiente hospitalar.

 

Epidemiologia

O estado de mal-epiléptico é relativamente comum, com 50.000 a 60.000 novos casos anualmente no EUA. A incidência de estado de mal-epiléptico na Europa é um pouco menor (10-16 por 100.000 habitantes) em comparação com os EUA (18-41 por 100.000 habitantes). A incidência anual é de 7-41 casos a cada 100.000 pessoas. Notavelmente, as minorias étnicas tem incidência substancialmente mais elevada (57 por 100.000) do que brancos (20 por 100.000). Os resultados mostram um aumento na incidência de estado de mal-epiléptico nas últimas décadas nos EUA. Os resultados de um estudo demonstraram que a maioria dos casos ocorre na falta de um diagnóstico de epilepsia conhecido. Quando associado com epilepsia, estado de mal-epiléptico tende a acontecer no início do curso de epilepsia, representando a primeira ou a segunda crise não provocada 65% das vezes. O estado epiléptico confere um risco acrescido de crises futuras, com um risco três vezes maior de um ataque não provocado subsequente pós-sintomático do estado de mal-epiléptico, em comparação com o risco após uma única crise convulsiva autolimitada sintomática.

A mortalidade, como já comentado, é de cerca de 20% e não parece estar mudando com o tempo. Os resultados são geralmente piores quando as crises são prolongadas. Evidências sugerem que as convulsões que duram mais de 30 minutos são menos propensas a remitir espontaneamente e estão associadas a uma mortalidade maior do que as convulsões de duração inferior a 30 minutos. O tempo da convulsão é um dos principais determinantes da mortalidade.

 

Fisiopatologia e Lesão Neuronal

Grande parte da fisiopatologia de estado de mal-epiléptico é ainda mal compreendida. Estudos utilizando modelos animais levaram a avanços na compreensão dos mecanismos básicos subjacentes do estado de mal-epiléptico. Apesar de numerosos processos moleculares e celulares envolvidos no desenvolvimento do estado de mal-epiléptico, o princípio fundamental envolve uma falha de mecanismos endógenos de encerrar uma convulsão. Essa falha pode ocorrer devido à excitação anormal excessiva durante uma convulsão ou de uma perda de mecanismos inibitórios endógenos, que pode permitir que uma única convulsão se transforme  em estado de mal-epiléptico e à autoperpetuação natural e fármaco-resistência da doença.

Estado de mal convulsivo há muito se sabe pode causar dano neural significativo. Em uma série de experimentos animais, foi demonstrado que crises convulsivas induzidas levam à hipertermia, hipotensão e hipóxia, que resultaram em lesão neuronal no tálamo, no hipocampo e na paralisia de neocortex. Evidência de lesão neuronal e morte celular está cada vez mais reconhecida em seres humanos epiléptico após estado de mal. A aldolase neurônio-específica é um marcador de lesão neuronal, que é elevado após crises convulsivas.

 

Formas de Apresentação Clínica

Os pacientes com estado de mal convulsivo apresentam as manifestações motoras características, que variam conforme o tipo de crise convulsiva. O achado mais característico são os movimentos tônico-clônico, generalizados bilaterais que ocorrem no estado de mal convulsivo generalizado. Uma outra forma de apresentação é na confusão mental ou alteração do estado mental que acontece no período pós-ictal. Podem ainda ocorrer déficits neurológicos focais temporários (por exemplo, paralisia de Todd) que pode durar de horas a dias após a convulsão.

Sintomas negativos de crises convulsivas incluem anorexia, afasia / mutismo, amnésia, catatonia, coma, confusão, letargia e olhar fixo. Sintomas positivos, por sua vez, incluem agitação, agressividade, alucinações, delírio, ecolalia, espasmos faciais, náuseas, vômitos, psicose e tremores.

Outras formas menos comuns de estado de mal-epiléptico são na forma do estado de mal-epilético focal motor, que pode ter muitas manifestações clínicas que dependem da área epileptogênica envolvida, podendo ocorrer com movimentos rítmicos em uma perna, que podem posteriormente se generalizar, e o estado de mal-epiléptico mioclônico, que usualmente é generalizado, com mioclonias repetidas que podem ser rítmicas ou arrítmicas, em alguns casos essas mioclonias podem ser focais.

Uma outra forma rara de estado de mal-epiléptico é o estado de mal tônico, em que os pacientes apresentam quadro de postura tônica da musculatura axial, mas sem os movimentos clônicos, sendo mais frequente em crianças.

No estado de mal não convulsivo, o objetivo é caracterizar a atividade de convulsão prolongada evidenciada por EEG epileptiforme. Existem vários subtipos de estado de mal não convulsivo, e alguns pacientes apresentam uma mudança no comportamento ou na cognição na ausência de manifestações óbvias motoras.

O diagnóstico do estado de mal-epiléptico sutil é um desafio. Muitas vezes, as drogas usadas em pacientes comatosos (paralíticos e anestésicos) atrapalham o diagnóstico, e este diagnóstico acaba sendo limitado à interpretação do EEG. O quadro clínico pode ser ainda mais complicado pela administração de drogas, principalmente anestésicos e analgésicos. As mioclonias podem parecer semelhantes a uma convulsão, mas em geral podem ser diferenciadas das convulsões devido a sua curta duração. Um alto índice de suspeita para estado de mal-epiléptico não convulsivo e um baixo limiar para realizar o EEG prolongado deve ser utilizado em pacientes com quadro de encefalopatia inexplicada e persistente.

 

Doenças Associadas

O estado de mal-epiléptico pode estar associado a outras condições como distúrbios metabólicos (hipoglicemia e hipocalcemia); infecção do sistema nervoso central ou sepse; quadros neurovasculares; toxicidade e retirada de medicações; trauma crânio-encefálico; entre outras condições. Exames que usualmente são realizados nesses pacientes estão sumarizados na tabela 1.

 

 

STabela: Exames complementares na crise epilépticamesementares

Assim que chega à emergência ou pronto-atendimento.

Glicemia capilar imediata (dextro).

Epiléptico, em uso de anticonvulsivante e que parou de tomar por conta própria a medicação há poucos dias e não há nada novo.

Em geral, não há necessidade; prescrever a medicação que o paciente faz uso.

Epiléptico, em uso regular da medicação, mas com novas crises.

Incluir dosagem sérica do anticonvulsivante em uso.

Uma ou mais crises, primeira crise.

Avaliação de causas clínicas: hemograma, plaquetas, exames de coagulação, função renal, hepática, glicemia, sódio, potássio, cálcio, magnésio e gasometria arterial.

Tomografia computadorizada ou RM.

Crise epiléptica sem causa aparente pelos exames iniciais.

Suspeita de doenças do SNC.

Ressonância é superior à TC.

TC é mais disponível na urgência para descartar doenças neurológicas (por exemplo, tumor, hemorragia, etc.).

Análise liquórica.

Na ausência de contraindicação, após tomografia, em casos de febre, confusão persistente, suspeita de meningite, meningoencefalite, carcinomatose meníngea etc.

Eletrencefalograma.

Na emergência: em casos de estado de mal-epiléptico ou na suspeita de estado de mal (confusão persistente, após intubação e bloquei neuromuscular, etc.).

Na epilepsia: em geral, deve-se realizar em todos os casos.

 

Exames Complementares

Numerosos estudos têm mostrado altas taxas de convulsões em pacientes com lesões neurológicas específicas. As convulsões ocorrem em até 15% dos pacientes com hemorragia subaracnoide, em até 30% dos pacientes com hemorragia intracerebral, em até 10% dos pacientes com acidente vascular cerebral isquêmico e em uma ampla gama de pacientes com lesão cerebral traumática, dependendo em grande parte da gravidade da lesão. Assim, o uso de eletroencefalograma contínuo é importante nesses pacientes, principalmente se apresentam nível de consciência alterada. Eventualmente, artefatos musculares podem atrapalhar a interpretação do EEG, mas amostras contínuas espicas durante a atividade epilética  e o exame permitem determinar se a crise epiléptica terminou. Em pacientes não responsivos certos padrões no EEG são diagnósticos de estado de mal-epiléptico como espicas ficais ou generalizadas, ou complexos agudos lentos com frequência maior do que 3Hz e padrões com evolução temporal, entre outras.

A tomografia de crânio é recomenda em todos os casos de estado de mal- epiléptico refratário. Uma variedade de achados radiológicos durante e após estado de mal-epiléptico tem sido descrita como edema hemisférico. TC pós-ictais de estado de mal-epiléptico mostraram atenuação diminuída, edema, perda de diferenciação entre massa cinzenta-branco, apagamento de sulcos e realce de giros. Essas anomalias são muitas vezes vistas no córtex e no hipocampo. No entanto, outras estruturas podem ser afetadas, como as leptomeninges (realce anormal), gânglios da base, corpo caloso e tálamo. Uma grande importância do exame é na detecção de causas secundárias, como hemorragias, entre outras.

A RM pode ser solicitada dependendo da apresentação clínica. Outros exames recomendados incluem  punção liquórica e exames laboratoriais como glicemia, dosagem de cálcio e magnésio, exames toxicológicos (caso suspeita de intoxicação). Exames laboratoriais podem incluir enzimas e função hepática, troponinas, gasometria arterial, nível sérico de drogas antiepilépticas, entre outras, conforme a apresentação.

 

Manejo

O manejo de pacientes com estado de mal-epiléptico se inicia no ambiente pré-hospitalar. Em uma revisão retrospectiva de adultos com estado de mal- epiléptico, a terapia de primeira linha são os benzodiazepínicos, usualmente o diazepam normalmente seguido por fenitoína. Em todos os pacientes, seja no nível pré-hospitalar ou hospitalar, as primeiras medidas são a rápida avaliação e o suporte aos pacientes, o que inclui a realização da verificação da glicemia capilar em todos os pacientes. Um acesso intravenoso deve ser obtido e se possível a coleta de exames como eletrólitos, cálcio, fósforo, magnésio, função hepática, hemograma e testes toxicológicos, conforme a necessidade.

O uso dos benzodiazepínicos efetivamente aborta estado de mal-epiléptico em 60% dos pacientes tratados dentro de 30 minutos do início das crises. Embora o diazepam via retal tenha sido conhecido por ser eficaz em abortar convulsões na população pediátrica, o primeiro estudo pré-hospitalar rigoroso para examinar a eficácia e a segurança do uso de benzodiazepínicos por socorristas para o tratamento do estado de mal-epiléptico foi publicado em 2001. Os resultados desse estudo mostraram que os benzodiazepínicos por via intravenosa (lorazepam e diazepam) foram superiores ao placebo no encerramento do estado de mal-epiléptico. Os pacientes tratados com benzodiazepínico tiveram menores taxas de intubação, provavelmente devido à duração das crises diminuída. Após esse estudo inicial pré-hospitalar, a ênfase deslocou-se para uma tentativa de melhorar a facilidade de administração de medicamentos antiepilépticos abortivos através do estudo de preparações orais e intranasais. Os resultados de um estudo de crianças no ambiente pré-hospitalar mostraram que midazolam oral era seguro e efetivo, assim como o diazepam retal que encerrra convulsões. Um estudo mostrou que o midazolam oral foi superior ao diazepam retal para crianças com convulsões no momento da apresentação na sala de emergência, sem aumentar a incidência de comprometimento respiratório. Resultados de um estudo prospectivo randomizado com midazolam intranasal mostraram que foi tão eficaz como o diazepam por via intravenosa para o término  de convulsões febris pediátricas.

O estudo dessas vias alternativas de terapias abortivas foi avaliado em uma pesquisa que comparou a administração pré-hospitalar de lorazepam por via venosa com midazolam intramuscular. Os resultados desse estudo indicaram que o midazolam foi tão eficaz quanto o lorazepam no encerramento do estado de mal-epiléptico e não foi associado com uma piora na função respiratória ou recorrência. Esses estudos abriram  caminho para o uso seguro de drogas antiepilépticas de resgate, tanto em casa por membros da família quanto com a supervisão de socorristas.

No ambiente hospitalar, o estado de mal convulsivo é tratado como a emergência médica que representa, e em todos os pacientes é recomendada a realização de glicemia capilar, assim como recomendado no ambiente pré-hospitalar. O paciente é estabilizado, com suas vias aéreas e sinais vitais avaliados e monitorizados e, se necessário, controlados, acesso intravenoso é obtido. As convulsões tônico-clônicas podem ser associadas com períodos de apneia, cianose e acidose metabólica, por isso exames de seguimento são necessários. A maioria dos pacientes pode respirar adequadamente em ar ambiente. No entanto, o oxigênio suplementar nasal deve ser fornecido por cânula ou máscara facial, com um limiar baixo para entubação endotraqueal se sinais clínicos de insuficiência respiratória iminente são observados. Se a intubação é necessária, deve-se usar um bloqueador neuromuscular de curta ação, que permite a avaliação posterior do nível de consciência. O manejo envolve uma avaliação rápida do nível de glicose no sangue. Os pacientes recebem tiamina parenteral (até 500 mg intravenosa) antes ou concomitante com a glicose para evitar esgotar a tiamina disponível, causando uma encefalopatia de Wernicke aguda.

Em pacientes com saturação de oxigênio abaixo de 90%, a suplementação de O2 é indicada e volume ou vasopressores são indicados se a pressão sistólica está diminuída.

Uma vez que o paciente está estabilizado, o foco é a rápida cessação da atividade de convulsão para minimizar a disfunção sistêmica, lesão neurológica, resistência farmacológica e, em última análise, morbidade e mortalidade.

A eficácia do lorazepam por via intravenosa foi mostrada em um estudo duplo-cego randomizado de lorazepam intravenoso isoladamente com fenobarbital, fenitoína somente, ou diazepam. Seguido por fenitoína, o lorazepam termina com sucesso do estado de mal-epiléptico em 65% dos casos. Apesar de não estudada especificamente, outra opção é a fosfofenitoína. Se o paciente continua a apresentar convulsões após a dose inicial, uma segunda dose menor de 5-10 mg / Kg pode ser administrada. Total de concentrações de fenitoína soro pode subir para um intervalo supraterapêutico (20-30 mcg / mL) depois de correção para a albumina.

Ácido valpróico intravenoso, fenobarbital e levetiracetam surgiram como terapia de segunda linha antiepiléptica alternativa para o tratamento de estado de mal-epiléptico, mas a fosfofenitoína costuma ser a escolha recomendada. Um estudo sugeriu que a eficácia do valproato de sódio é semelhante a da fosfofenitoína.

Os padrões atuais práticos que envolvem o uso de segunda linha antiepilépticos são bastante variáveis. Lacosamide parece ter potencial para uso como segunda linha de drogas antiepilépticas no estado de mal-epiléptico. Os resultados de um estudo retrospectivo recente sugeriram que a lacosamida em uma dose de 200-400 mg é segura e pode ser eficaz no tratamento do estado de mal-epiléptico.

O estado de mal-epiléptico convulsivo refratário ao tratamento inicial com lorazepam e uma segunda linha de medicamentos antiepiléptico necessitam de tratamento adicional. Normalmente, utiliza-se novamente medicações de segunda linha antiepilépticas antes de um agente anestésico. Se convulsões continuam apesar do tratamento inicial com lorazepam e uma segunda linha de medicamentos antiepilépticos, alguns pesquisadores defendem agora uma progressão mais rápida aos anestésicos intravenosos (dentro de 30-60 minutos de início das crises),ao invés de utilizar outra droga de segunda linha antiepiléptica. Uso de anestesia pode ser associado a complicações graves potencialmente. No entanto, seu uso precoce para estado de ma-refratário está se tornando mais comum.

O tratamento ideal de estado de mal não convulsivo é bem menos definido, devido a uma escassez de dados. Algumas das principais considerações merecem destaque. A maioria das formas de não estado de mal convulsivo não está associado  à disfunção sistêmica ameaçadora da vida e são portanto percebidas como menos do que uma emergência médica. Para maioria das formas de estado de mal não convulsivo que persiste após o tratamento com benzodiazepinicos e medicamento antiepiléptico, doses adicionais de medicamentos antiepilépticos são preferidas  muitas vezes em vez de anestésicos. Essa estratégia está caindo por terra. Especialmente nos casos de estado de mal não convulsivo em que a consciência está preservada e os riscos de anestésicos podem superar os riscos da continuidade das convulsões.

O diagnóstico de estado de mal-epiléptico refratário é clínico e muitas vezes envolve o uso de EEG para mostrar evidências de atividade eletroencefalográfica porque muitas vezes os pacientes são entubados, paralisados e sedados pós-benzodiazepínicos. Os medicamento antiepilépticos não conseguem parar convulsões. Entre 23% e 43% dos pacientes em estado de mal-epiléptico vão evoluir para o estado de mal- epiléptico. As taxas de mortalidade para estado de mal-epiléptico refratário de 17% para 39%, as taxas de aproximadamente três vezes maior do que com estado de mal não refratário.

Os três anestésicos comumente utilizados nos EUA, midazolam, propofol e pentobarbital são dados como bolus intravenosos antes da infusão de manutenção, enquanto o tiopental é um anestésico comum particularmente na Europa. Escolha do anestésico em grande parte depende das circunstâncias individuais, tais como interações medicamentosas, comorbidades e sinal de instabilidade. Os estudos comparativos falharam em encontrar diferenças entre as drogas endovenosas contínuas para o manejo do estado de mal-epiléptico.

Midazolam e propofol tendem a ser anestésicos de primeira linha, ao passo que pentobarbital é geralmente reservado para o estado de mal-epiléptico refratário a essas drogas. Propofol tem uma meia-vida curta, o que é vantajoso quando exames neurológicos são necessários. Infusão de propofol por mais de 48 horas deve ser feita com cautela devido ao risco de uma síndrome de infusão de propofol com risco de vida caracterizado pelo aparecimento de rabdomiólise, hipertrigliceridemia, disfunção cardíaca, insuficiência renal e acidose metabólica. Uma revisão sobre o efeito da anestesia para o estado de mal refratário não relatou nenhuma diferença significativa entre mortalidade a curto prazo para os pacientes tratados com essas drogas. No entanto, o pentobarbital foi associado com uma menor frequência de convulsões, frequência maior de hipotensão arterial, em comparação com propofol e midazolam. Estudos retrospectivos sugeriram que a utilização de um anestésico para o tratamento do estado epiléptico pode ser associado com piores desfechos incluindo aumento de infecção e morte. No entanto, quando se pesa os efeitos adversos da convulsão mantida contra os riscos de anestésicos intravenosos, a maior parte dos autores ainda recomenda seu uso e mais estudos são necessários.

Para o tratamento de estado de mal-epiléptico refratário com anestésicos, a monitorização com EEG deveria ser usada para orientar a titulação de drogas para um objetivo de supressão da atividade convulsiva eletroencefalográfica.

No momento, não há nenhuma evidência para ajudar a guiar o grau ótimo de supressão eletroencefalográfica ou duração do tratamento. No caso de crises documentadas, apenas no EEG o recomendado em geral é manter o tratamento por 24-48 horas da supressão das crises, mas uma recomendação baseada em evidência ainda não existe.

Não há dados para orientar transição contínua para terapia de manutenção do tratamento de infusão intermitente após a resolução do estado de mal-epiléptico refratário. Em geral, as drogas antiepilépticas são dadas em doses suficientes para manter as concentrações terapêuticas durante e após o desmame da infusão contínua. As doses devem ser individualizadas para realizar o controle das crises e minimizar os efeitos adversos. O sucesso do regime de serviço se baseia por muitas características clínicas, incluindo padrão de EEG, causas do estado de mal-epiléptico, doença sistêmica atual  e perfis de interação medicamentosa.

Pacientes expostos à infusão de pentobarbital prolongada estão em risco de convulsões por abstinência. Nesse caso, doses elevadas de fenobarbital resultando em concentrações > 100 mcg / ml podem ser necessárias para evitar essa complicação, os dados de uso são escassos para permitir endosso formal dessta estratégia.

A manutenção de terapia prolongada após o controle de crise epiléptica é controversa, mas candidatos à terapia prolongada incluem pacientes jovens com um estado saudável pré-mórbido, processos de doença autolimitada e falta de lesões intracranianas que sugerem um mau prognóstico (por exemplo, necrose cortical laminar).

Estudos recentes têm avaliado o uso de ketamina e hipotermia nesses pacientes. No entanto, existem dados limitados sobre a segurança desses tratamentos e se recomenda reservar essas opções para pacientes que não respondem a outras alternativas de tratamento e considerar a transferência do paciente para um centro de referência.

Algumas situações especiais devem ser consideradas como as lesões cerebrais anóxicas como causa do estado de mal-epiléptico. O prognóstico do estado de mal-epiléptico após um insulto hipóxico ou anóxico é tradicionalmente considerado como muito ruim, particularmente para pacientes que desenvolvem mioclonias. Contudo, a hipotermia que está sendo utilizada nos protocolos pós PCR pode alterar esse prognóstico. Dados adicionais são necessários para se saber o papel de hipotermia em melhorar o prognóstico nesses pacientes.

A gestação também merece considerações especiais. Não há um aumento do risco de estado de mal-epiléptico durante a gravidez e poucos dados existem sobre o uso de medicações antiepilépticas durante a gestação. O bom resultado fetal é dependente do controle de crises rápidas na mãe. Durante a gravidez, o volume de distribuição e a depuração de muitos medicamentos são aumentados, o que pode modificar as doses necessárias de medicações nesses pacientes. Os níveis de vitamina B6 durante a gestação podem ser baixos e devem ser avaliados. Fosfenitoína e Lorazepam são recomendados como terapia inicial de urgência ou emergência e terapia de controle. No entanto, existem riscos conhecidos de defeitos de nascimento com a exposição primeiro trimestre de medicações antiepilépticas, particularmente com  valproato de sódio, fenobarbital e fenitoína. Algumas das novas medicações podem ser consideradas para uso nessa população, como o levetiracetam. Eclâmpsia deve ser considerada em pacientes com estado de mal-epiléptico durante a gestação e antecipar o parto é a melhor terapia nessa situação. Para as mulheres grávidas com eclâmpsia e convulsões, sulfato de magnésio é superior aos medicamentos antiepilépticos, como a fenitoína. Monitorização cardíaca fetal contínua, assistência obstétrica e recursos de terapia intensiva devem ser usados para assistir a mãe e a criança.

 

Doses Usuais de Medicamentos no Estado de Mal-Epiléptico

1-Midazolam

Dose de ataque de 0,2 mg / kg com taxa de infusão intravenosa de 2 mg/min 2-Propofol

1 a 2 mg/kg de dose de ataque, iniciar a infusão com 20 mcg/Kg/min com dose máxima de 200 mcg/Kg/min

2-5 mg / kg / h

 

3-Pentobarbital

Dose de araque de 5 mg / kg de infusão intravenosa, doses adicionais de 5-10 mg/Kg em taxa de infusão < 50 mg/min a taxa de manutenção é de 0,5-5 mg / kg / hora.

 

4-Fenitoína

Dose inicial de 20 mg / kg por via intravenosa (150 mg / min)

(pode dar dose adicional de 5-10 mg / kg).

 

5-Lorazepam

2-4 mg por via intravenosa (2 mg / min) (repetir, se necessário) ou 10 mg de midazolam intramuscular (se necessário, repetir).

 

6-Ácido Valpróico

20-30 mg / kg por via intravenosa (cerca de 100 mg / min) ou fenobarbital

20 mg / kg por via intravenosa (50-75 mg / min)

 

7-Levetiracetam

20-60 mg / kg (infusão em 15 min)

 

 Resumo das recomendações de tratamento

1. O tratamento do estado de mal convulsivo deve ser rápido e contínuo sequencialmente até a interrupção das convulsões clínicas ou até as apenas detectadas por EEG.

2. Monitorização e cuidados intensivos devem ser iniciados simultaneamente com a terapia inicial.

3. As opções de tratamento:

Benzodiazepínicos: terapia inicial

Lorazepam é a droga de escolha para administração IV.

Midazolam é a droga de escolha para administração IM.

4-Opções de medicações antiepilépticas incluem: fosfenitoina IV / fenitoína, valproato de sódio, ou levetiracetam.

5-Recomendações para o estado de mal refratário incluem infusões  contínuas de drogas antiepilépticas tituladas para a cessação das convulsões).

6-Um período de 24-48 horas de controle eletroencefalográfico é recomendado antes de iniciar a retirada de drogas anticonvulsivantes.

7-Durante a transição das drogas anticonvulsivantes da via endovenosa para oral é sugerida manutenção da monitorização por EEG devido ao risco de crises recorrentes.

8-Terapias alternativas podem ser consideradas se não se consegue interromper as crises convulsivas. No entanto, recomenda-se reservar essas terapias para casos verdadeiramente refratários e considerar a transferência para um centro especializado.

9-O estado de mal deve ser manejado em UTI com equipe especializada e EEG contínuo. O uso de monitoração de vídeo em conjunto com EEG auxilia na interpretação das crises convulsivas em UTI. A duração do acompanhamento por EEG deve ser de pelo menos 48 horas após o insulto cerebral agudo em pacientes comatosos e 24 h pós-término de atividade convulsiva eletroencefalográfica.

 

Resumo das recomendações para o EEG:

1-A utilização de EEG é geralmente necessária para o tratamento do estado de mal-epiléptico.

2-Monitorização por EEG contínua deveria iniciar em até 1 hora da suspeita de estado de mal.

3-EEG é indicado para pacientes em coma incluindo pós-PCR.

4-EEG é indicado para hemorragia intracraniana com alteração do nível de consciência.

5-EEG é indicado para suspeita de crises não convulsivas em pacientes com estado mental alterado.

6-A duração do acompanhamento por EEG deve ser de pelo menos 48 horas em pacientes comatosos.

7-A pessoa que interpreta o EEG na UTI deve ter formação adequada.

 

Referências

Brophy GM et al. Guidelines for the Evaluation and management of Status Epilepticus. Neurocrit Care 2012 published online.

 

Betjemann JH, Lowensteins DH. Status epilepticus in adults. Lancet Neurol 2015 published online.

 

Brophy GM, Bell R, Claassen J, et al. Guidelines for the evaluation and management of status epilepticus. Neurocrit Care 2012; 17:3.

 

Trinka E, Cock H, Hesdorffer D, et al. A definition and classification of status epilepticus--Report of the ILAE Task Force on Classification of Status Epilepticus. Epilepsia 2015; 56:1515.

 

Prasad M, Krishnan PR, Sequeira R, Al-Roomi K. Anticonvulsant therapy for status epilepticus. Cochrane Database Syst Rev 2014; 9:CD003723.

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