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Vasculites por Hipersensibilidade

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 28/08/2018

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A vasculite por hipersensibilidade refere-se à vasculite de pequenos vasos que é restrita à pele e não está associada a qualquer outra forma de vasculite primária ou secundária. Essa condição não está associada à doença de vasos médios ou grandes em outros locais, nem à doença de pequenos vasos em outros órgãos (por exemplo, glomérulos ou capilares pulmonares). Em muitos casos, um fator precipitante identificável como um medicamento ou uma infecção associada está presente; por esse motivo, se utiliza o termo “hipersensibilidade”. Em até 40% dos casos, no entanto, nenhuma causa específica é identificada.

O termo “vasculite de hipersensibilidade” tem sido associado a muita confusão desde que foi incorporado ao primeiro esquema de classificação de vasculites no início dos anos 50. O nome da condição deriva do fato de que, na década de 1950, modelos humanos e animais de hipersensibilidade a antígenos estranhos mostraram causar vasculite de pequenos vasos envolvendo os rins, os pulmões e outros órgãos além da pele.

Por conseguinte, até mesmo a poliangeíite microscópica, um distúrbio que comumente afeta órgãos internos e também a pele, sendo frequentemente associado a anticorpos positivos para citoplasma de neutrófilo (Ancas), foi agrupada inicialmente sob o título de vasculite de hipersensibilidade. Devido à confusão em torno de seu nome, muitos clínicos sugeriram que o termo vasculite de hipersensibilidade seja substituído, mas nenhuma alternativa adequada foi encontrada.

Os termos utilizados como sinônimo de vasculite de hipersensibilidade incluíram vasculite leucocitoclástica, angeíte leucocitoclástica cutânea e vasculite cutânea de pequenos vasos, entre outros. Ao avaliar pacientes com vasculite de pequenos vasos da pele, é fundamental lembrar que os achados cutâneos podem apenas anunciar um distúrbio subjacente envolvendo outros órgãos. O envolvimento extracutâneo, que exige a reconsideração do diagnóstico, deve ser excluído com testes apropriados.

Acredita-se que, na maioria dos casos de vasculite por hipersensibilidade, o problema tenha uma fisiopatologia mediada pelo complexo imune. A histopatologia, em geral, mostra uma vasculite leucocitoclástica, com características de necrose em alguns casos, mas não inflamação granulomatosa. As biópsias muito precoces no curso da doença podem mostrar uma predominância linfocítica.

 

Achados Clínicos

 

Pele. As lesões da vasculite de pequenos vasos da pele incluem púrpura (palpável ou não palpável), pápulas, urticária/angioedema, eritema multiforme, vesículas, pústulas, úlceras e necrose. As lesões, geralmente, ocorrem primeiro e mais proeminentemente em regiões específicas como as extremidades inferiores ou nádegas. A ocorrência das lesões pode ser assintomática, mas, em geral, acompanhada de sensação de queimação ou formigamento.

 

O Quadro 1 apresenta os critérios para a classificação de vasculite de hipersensibilidade.

 

Quadro 1

 

Critérios para a Classificação de Vasculite de Hipersensibilidade

                    Idade no início da doença > 16 anos

                    Medicação no início da doença

                    Púrpura palpável

                    Erupção cutânea maculopapular

                    Biópsia, incluindo arteríola e vênula, mostrando granulócitos em localização perivascular ou extravascular

 

A vasculite de hipersensibilidade pode ser diagnosticada se o paciente atender a, pelo menos, três desses cinco critérios. A sensibilidade dos critérios é de 71%, com especificidade de 83,9%.

 

Articulações. A vasculite por hipersensibilidade é, às vezes, acompanhada de artralgias e até de artrite franca, com predomínio de grandes articulações.

 

Exames Complementares

 

Todos os testes citados no Quadro 2 são apropriados no momento da avaliação inicial do paciente, principalmente com o objetivo de excluir outras formas de vasculite que possam imitar a vasculite hipersensível. As lesões pleomórficas da vasculite cutânea e o grande número de mimetizadores da vasculite exigem a realização de diagnóstico histopatológico. A confirmação do diagnóstico por biópsia de pele de lesão de púrpura palpável é importante na maioria dos casos.

Um espécime de biópsia de uma lesão ativa (<48h, se possível) geralmente demonstra vasculite leucocitoclástica das vênulas pós-capilares. Estudos de imunofluorescência direta (IFD) mostram quantidades variáveis de imunoglobulina e deposição de complemento, com padrão não diagnóstico. O desempenho dos estudos DIF, no entanto, é uma parte importante, e frequentemente negligenciada, da investigação, crítica para a exclusão da púrpura de Henoch-Schönlein, crioglobulinemia e outras condições.

O Quadro 2 contém os exames complementares em vasculites de hipersensibilidade.

 

Quadro 2

 

Exames Complementares em Vasculites de Hipersensibilidade

Exame

Alteração

Hemograma completo

Normal

Eletrólitos

Normais

Função hepática

Normal

Urianálise

Normal

VHS e PCR

Alterados em <50% dos pacientes, com alterações leves a moderadas

FAN

Negativo

Fator reumatoide

Negativo

Anca

Negativo

C3 e C4

Níveis normais

Sorologia para hepatites B e C

Negativas

Crioglobulinas

Negativas

RX de tórax

Normal

 

Anca: anticorpo positivo para citoplasma de neutrófilo; FAN: fator antinuclear; PCR: proteína C-reativa; RX: raio X; VHS: velocidade de hemossedimentação.

 

Diagnóstico Diferencial

 

O diagnóstico diferencial de vasculite por hipersensibilidade é mostrado no Quadro 3. A vasculite de hipersensibilidade deve ser distinguida sobretudo de outras vasculites de pequenos vasos, de condições inflamatórias autoimunes associadas à doença articular e erupções cutâneas e de outras reações cutâneas aos medicamentos.

 

Quadro 3

 

Diagnóstico Diferencial de Vasculite de Hipersensibilidade

Outras vasculites

                    Púrpura de Henoch-Schönlein

                    Poliangeíte microscópica

                    Granulomatose eosinofílica com poliangeíte (síndrome de Churg-Strauss)

                    Granulomatose com poliangeíte (anteriormente, granulomatose de Wegener)

                    Crioglobulinemia mista

                    Poliarterite nodosa

Doenças autoimunes sistêmicas

 

                    LES (incluindo vasculite urticariforme)

                    Artrite reumatoide

Diversos

                    Edema hemorrágico agudo da infância

LES: lúpus eritematoso sistêmico.

 

Tratamento

 

As estratégias de tratamento para vasculite por hipersensibilidade são amplamente empíricas. O tipo, a intensidade e a duração da terapia são baseados no grau de gravidade da doença em casos individuais. Para pacientes nos quais um fator precipitante pode ser identificado, a remoção do agente agressor geralmente leva à resolução da vasculite dentro de dias a semanas.

Para casos refratários ou mais graves, agentes imunossupressores podem ser indicados, geralmente começando com uma dose moderada de glicocorticoides (por exemplo, prednisona, 20 a 40mg/dia). Quando um paciente não consegue tolerar uma redução glicocorticoide ao longo de semanas ou até vários meses, a adição de um agente imunossupressor pode ser necessária. A azatioprina (2mg/kg/dia) é usada mais comumente para esse fim.

As lesões similares a erupções medicamentosas são tratadas simplesmente com a elevação das pernas e com a administração de anti-histamínicos H1 e anti-inflamatórios em caso de dor ou edema. Para doença persistente que não leva a úlceras cutâneas ou gangrena, colchicina (0,6mg, 2 ou 3x/dia), hidroxicloroquina (200mg, 2x/dia) ou dapsona (100mg/dia) são opções.

Para casos refratários ou mais severos, podem ser utilizados imunossupressores como prednisona 20 a 40mg/dia com retirada progressiva da medicação em semanas a meses. Para pacientes intolerantes a glicocorticoides ou sem melhora com o uso deles, é indicada a azatioprina em dose de até 2mg/kg.

 

Complicações

 

A maioria dos casos com um fator precipitante claramente identificado é resolvida ao longo de 1 a 4 semanas, muitas vezes com alguma hiperpigmentação residual ou, no caso de lesões ulceradas, cicatrizes. Alguns pacientes, no entanto, apresentam doença recorrente que permanece confinada à pele e requer terapia prolongada.

 

Referências

 

1-Stone JH. Hipersensitivity vasculitis in Current Rheumatology 2016.

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