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Fístula Broncopleurais

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 12/05/2021

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A fístula broncopleural (FBP) é definida como uma conexão entre acavidade pleural e o brônquio com vazamento de ar persistente. Essa conexãopode ser entre o brônquio principal, segmentar ou os brônquios lobares.Tecnicamente, a fístula alveolar pleural refere-se ao vazamento de arproveniente do parênquima pulmonar, mas também é comumente referida como FBP. Aduração do vazamento de ar persistente que define os intervalos de FBP de 1 a 5dias, embora mais de 24 horas, é geralmente aceita.

 

Etiologias e Fatores De Risco

 

A ressecção pulmonar é a principal causa de uma verdadeira FBP, comprevalência variando de 4,5 a 20% após pneumectomia e de 0,5 a 1% apóslobectomia. São fatores de risco para ocorrência de FBP:

-Cirurgia em hemitórax direito

- Pneumectomia

-Quimioterapia e radioterapia

-Diabetes melito

-Tabagismo significativo e DPOC

-Deficiência nutricional ou dificuldade em cicatrização de feridas

-Toracotomia ipsilateral anterior

-Tumor residual na margem brônquica

-Coto brônquico de grande diâmetro (> 25 mm)

-Dissecção extensa de linfonodos

-Idade > 60 anos

-Ventilação mecânica pós-cirurgia prolongada

 

Etiologias adicionais, geralmente de natureza alveolar-pleural, incluem ventilaçãomecânica, trauma pulmonar, pneumotórax espontâneo, síndrome do desconfortorespiratório agudo (SDRA), lesões iatrogênicas, radiação, ablação porradiofrequência e etiologias infecciosas ou inflamatórias. Em pacientes emventilação mecânica, a FBP comumente é o resultado de pneumotórax. Isso ocorrediretamente por perturbação das vias aéreas ou da pleura visceral ou porruptura alveolar espontânea. Uma vez que o pneumotórax se desenvolve em umpaciente em ventilação mecânica, o espaço pleural deve ser drenado paraprevenir pneumotórax hipertensivo. Vazamento de ar persistindo além de 24 horasconfirma o diagnóstico de FBP.

A FBP no paciente em ventilação mecânica está associada a alta morbidadee mortalidade. Um estudo mostrou que, de 1.700 pacientes em ventilaçãoinvasiva, 2% dos casos apresentavam FBP secundária a barotrauma ou lesão pulmonar,com mortalidade geral de 67%. Outras séries relataram mortalidade entre 27,2 e 50%.Início tardio de FBP (> 24 horas de ventilação mecânica) e vazamento de armaior que 500 mL por respiração estão associados a aumento da mortalidade.

 

Achados Clínicos

 

Manifestações clínicas da FBP na mecânica do paciente ventilado podemincluir perda de pressão expiratória final positiva (PEEP), resultando emhipoxemia, perda de volume corrente efetivo, piora de incompatibilidadeventilação-perfusão, enfisema subcutâneo, pneumomediastino ou pneumopericárdio.Em outros pacientes, os sintomas podem ser muito variáveis, com pacientesapresentando pneumotórax e outros com evolução para empiema, mas os achados sãorelativamente inespecíficos. Evolução com empiema ocorre principalmente eminfecções e doenças malignas; nesse caso, os pacientes podem apresentar febre,mal-estar, perda de peso e tosse com expectoração purulenta, e no local da FBPpode haver percussão submaciça. Em pacientes com FBP e empiema que não fordrenado adequadamente pode ocorrer erosão pela parede cutânea com saída desecreção purulenta pela pele.

Pode-se verificar o dreno pleural em selo d?água borbulhando, uma vezque um dreno pleural é colocado, sendo visto por mais de 24 horas. A sucção dotubo torácico pode aumentar o fluxo através da fístula, levando a uma trocagasosa deficiente e resolvendo a FBP. Nos modos de ventilação com ciclagem devolume, o vazamento de ar pode ser medido diretamente como uma diferença entreos volumes inspiratórios e expiratórios. Há pouco consenso na definição degrandes vazamentos de ar comparados a pequenos vazamentos. Sistemas declassificação qualitativa baseados no momento do vazamento durante o ciclorespiratório em comparação com a quantificação com sistemas de drenagemtorácica digital ou medidores de vazamento de ar podem ser usados, mas têmpequena implicação prática.

 

Diagnóstico

 

O diagnóstico é realizado pela combinação de achados clínicos,radiológicos e broncoscópicos, e não existem exames laboratoriais que podemajudar nessa determinação.

A presença de borbulhamento no sistema de drenagem leva à necessidade decorrigir a posição pleural do dreno torácico, verificar se as conexões estãoseguras e se o tubo endotraqueal se encontra inflado para diferenciar vazamentoda FBP do vazamento do circuito do ventilador. Evidências de vazamento de artambém podem ser observadas no ventilador com curvas em formas de onda. O volumetotal, representado pela área sob a curva de fluxo, é maior na inspiração doque na expiração, indicando perda de volume entre a inspiração e ciclosexpiratórios. O volume também não retorna à linha de base, indicando perda devolume.

As imagens pulmonares podem mostrar achados que incluem pneumotórax,pneumomediastino, falha no espaço da pneumectomia por ser preenchido porlíquido (em geral ocorre de 1 a 4 meses após pneumectomia), bolhas de ar naárvore brônquica e eventualmente visualização da fístula. Em pacientes comoutras etiologias além de pneumectomia, pode haver achados sugestivos daetiologia da FBP.

A broncoscopia é fundamental para o diagnóstico e a localização da FBP epermite a avaliação adequada do sítio cirúrgico e do tamanho da fístula e a exclusãode outras etiologias. A broncoscopia pode mostrar defeito na mucosa, bolhas nolocal cirúrgico quando a solução salina é instilada, ou a localização do FBP éverificada por instilação de azul de metileno no espaço pleural através dodreno torácico, com visualização broncoscópica do corante na árvoretraqueobrônquica. No entanto, um defeito pode ser difícil de avaliar se houveredema significativo do tecido. Embora uma FBP seja mais provável de ser vista nabroncoscopia, a oclusão sequencial por balão dos brônquios é algumas vezesusada, particularmente em relação à localização de uma FBP menor ou segmentar.

 

Manejo do Vazamento de Ar Quando em Ventilação Mecânica

 

O fluxo laminar através de uma FBP depende da interação do tamanho dodefeito pleural visceral, da complacência pulmonar local, da pressão das viasaéreas, da resistência das vias aéreas e da pressão transpulmonar. O fluxovolumétrico de vazamento de ar pela FBP é proporcional à pressão média das viasaéreas (PAW). Quando a PAW se eleva, temos aumento do fluxo de ar e daresistência da FBP, indicando que o aumento da pressão de condução entre asvias aéreas pulmonares e pleura resulta em maior vazamento de ar, apesar damaior resistência. Um relato de caso demonstrou que a perda de volume através deuma FBP aumentou de 15 para 54% com a adição de 15 cm H2O de PEEP, mostrando acontribuição significativa de PEEP para PAW.

A fisiologia da FBP permite a manipulação de variáveis ??com oventilador para ajudar a minimizar e/ou resolver a FBP, bem como manejar asnecessidades dos pacientes no ventilador. Alterações nas variáveis quedeterminam a PAW podem melhorar o vazamento de ar da FBP e melhorar osdesfechos. Isso inclui diminuir a pressão intrapleural (PIP) usando volumescorrentes mais baixos (geralmente 4-6 ou 3-4 mL/kg), diminuir a PEEP, diminuiro tempo inspiratório e diminuir a frequência respiratória. A hipercapniapermissiva deve ser considerada em pacientes com alta necessidade de ventilaçãopor minuto. Há poucas evidências que demonstram a superioridade de um modo ventilatórioem relação a outro. Ventilação intermitente e pressão de suporte apresentam umavantagem teórica na redução das pressões médias de vias aéreas, apoiando o usode ventilação espontânea, embora faltem dados comparativos.

O isolamento pulmonar anatomicamente separa os pulmões esquerdo edireito para melhorar a ventilação pulmonar. Na FBP, isolar o pulmãocontralateral pode interromper o vazamento de ar e promover a cicatrização deferidas do local da fístula. Em pacientes com grandes fístulas proximais, umgrande vazamento de ar pode afetar a capacidade de oxigenação e ventilação adequadapara ventilar o parênquima pulmonar contralateral. Nesse caso, o isolamento dopulmão contralateral pode melhorar a troca gasosa, eliminando o vazamento dear. Existem inúmeras técnicas para o isolamento do pulmão, incluindobloqueadores endobrônquicos, tubo endotraqueal de duplo lúmen (DLT) e tubos de lúmenúnico modificado (ILT). Essa abordagem depende da tolerabilidade de ventilação,da lateralidade da fístula, da anatomia e da ventilação. Os DLTs têm a vantagemde fácil conversão em ILT se necessário.

A sedação e o bloqueio neuromuscular são frequentemente necessários paramanter a posição correta para DLTs. Embora não constitua isolamento de pulmão,também pode haver benefício no posicionamento do paciente em decúbito lateralcom o lado da FBP para baixo. Em um relato de caso, isso demonstrou diminuir ovazamento da FBP, reduzindo o fluxo de ar no pulmão afetado em decorrência das diferençasregionais no gradiente pressórico intra-abdominal ou intratorácico A pressãopositiva preferencialmente desloca o diafragma em zonas pulmonares nãodependentes.

Os modos ventilatórios de alta frequência foram avaliados para otratamento de pacientes com vazamento de ar refratário. Volumes correntes de 2a 5 mL/kg são entregues em 100 a 200 respirações/min. A evidência sobre aventilação de alta frequência em pacientes com FBP é controversa. Relatos decaso demonstraram melhora na troca gasosa e no vazamento da FBP com ventilaçãoa jato de alta frequência e ventilação oscilatória de alta frequência (VOAF).No entanto, uma série de casos de pacientes com doenças respiratórias agudas comVOAF relatou que seis de sete pacientes pioraram com a VOAF.

Apesar dos estudos prospectivos limitados, evidências sugerem que existeum papel para manipular a pressão intrapleural para reduzir ou eliminarvazamento de ar persistente. A pressão negativa intrapleural excessiva deve serevitada. Em pacientes com FBP e insuficiência ventilatória refratária, a oxigenaçãopor membrana venovenosa extracorpórea (VV-ECMO) promove a troca gasosa,permitindo ventilação protetora. A ECMO pode permitir a resolução da FBP e o fechamentode fístula ou pode fornecer uma ponte para intervenção definitiva. Em uma sériede cinco pacientes com grandes vazamentos de ar (> 5 mL/kg), a ECMO venoarterial(VA-ECMO) levou ao fechamento da FBP em três dos cinco pacientes.

 

Manejo da Fístula Broncopleural

 

Os pacientes com suspeita de FBP devem realizar drenagem de ar ou fluidodo espaço pleural com toracostomia tubular, se esta já não estiver colocada.Pode-se colocar uma sucção com baixa pressão com 5 a 10 cm H2O no selo d?água,e o líquido pleural deve ser enviado para análise. Pacientes com loculaçõespodem se beneficiar do uso de antifibrinolítico. Um dreno pigtail pleural 14,com aplicação de ?20 cm H2O de sucção, pode evacuar aproximadamente 12,8 ± 0,3L/min. A incapacidade de alcançar a expansão pulmonar adequada é indicativa deavaliar a localização correta e a patência do tubo, a possibilidade de pulmãonão expansível ou a presença de grandes vazamentos de ar (> 16 L/min) e,portanto, neste último cenário, a necessidade de um dreno torácico maior.

A transição do dreno torácico de sucção para vedação de água resolvevazamento de ar persistente em 60% dos pacientes pós-operatórios. Ensaios randomizadosmostraram que, em pacientes submetidos a ressecção pulmonar, um período maiscurto de sucção do dreno torácico seguido de vedação com selo d?água podereduzir o vazamento de ar e a duração da permanência do tubo torácico empacientes sem pneumotórax significativo. Existem algumas evidências para apoiaro uso da pressão com cateteres intrapleurais. Embora uma série de casos tenhaobtido sucesso na configuração intrapleural igual a PEEP, outros estudosmostraram aumento de pneumotórax nesses pacientes.

         Omanejo endobrônquico com materiais oclusivos ou válvulas endobrônquicas podeser considerado para reduzir o vazamento de ar. Nos casos de FBPs pequenas(< 5 mm), em que o defeito é observado por broncoscopia, materiais oclusivospodem selar mecanicamente o vazamento. Substâncias oclusivas incluem chumbo glutaraldeídoesterilizado, espuma de gel e tetraciclina, cola de fibrina, mistura de gelatina-resorcinol,celulose, albumina-glutaraldeído, fibrina crioprecipitada e tampão de sangueautólogo. Em defeitos traqueais ou brônquicos proximais, os stents das viasaéreas podem ser usados, principalmente em fístulas > 8mm.

Os dispositivos Amplatzer foram criados para corrigir a comunicaçãointra-atrial e forame oval patente, e a eficácia nas FBP é relatada como de96%. Existe risco de deslocamento para o espaço da região pleural ou para as viasaéreas mais proximais, mas esta é uma complicação relativamente rara.

Nos casos em que o defeito está localizado na pleural visceral e fora doalcance do broncoscópio, o selamento endobrônquico seletivo pode ser alcançadocom válvulas endobrônquicas unilaterais. As válvulas projetadas para reduçãoendoscópica do volume pulmonar permitem o fluxo de ar para fora dos segmentosbrônquicos/subsegmentos. Em uma série de casos de candidatos não cirúrgicos comSDRA e vazamento de ar persistente, a colocação da válvula endobrônquicaresolveu o vazamento de ar e diminuiu dias na ventilação mecânica.

Métodos para localizar a região do vazamento de ar pela broncoscopia incluemo método de oclusão por balão e o sistema Chartis. O método de oclusão porbalão mais comumente usado emprega um cateter balão Fogarty, que é infladosequencialmente nos brônquios lobares.

 

Bibliografia

 

1-Grotberg JC et al. Critical Care Medicine 2020 online first

2- Okuda M, Go T, Yokomise H. Risk factor of bronchopleural fistula aftergeneral thoracic surgery: review article. Gen Thorac Cardiovasc Surg 2017;65:679.

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