A agitação psicomotora é caracterizada por um estado de excitação mental e atividade motora aumentadas. Consiste na emergência mais comum em psiquiatria, presente em uma ampla faixa de transtornos mentais. Os episódios de agitação são freqüentemente erráticos e, muitas vezes, precedem um comportamento violento. Por esta razão, a segurança de todos os presentes deve ser considerada uma prioridade. Ao contrário do que se imagina, o comportamento violento geralmente é previsível, pois alguns sinais geralmente precedem sua ocorrência (Tabela 1).
Tabela 1: Sinais sugestivos de heteroagressividade
Punhos e dentes cerrados |
Movimentação excessiva |
Agressividade verbal |
Inclinação em direção ao entrevistador |
Tendência à aproximação excessiva |
Volume de voz elevado |
Perplexidade* |
Persecutoriedade* |
* Não isoladamente.
A avaliação do paciente agitado inclui anamnese com o paciente (quando possível), história com familiares ou conhecidos, exame físico, exame psíquico e exames subsidiários.
É importante verificar rapidamente se há uma emergência clínica e se o paciente está ameaçando a própria segurança ou a segurança da equipe. Portanto, a história clínica deve ser realizada juntamente com o exame físico e psíquico, bem como com algum tipo de intervenção física ou medicamentosa, se imperativa.
O médico deve caracterizar da forma mais completa possível o comportamento de agitação, obtendo as seguintes informações:
quando teve início o quadro de agitação, se é o primeiro episódio;
características da agitação (ansiedade, inquietação física, agitação verbal, estado confusional);
doenças e tratamentos clínicos;
doenças e tratamentos psiquiátricos;
uso de substâncias psicoativas (álcool, drogas, medicamentos - vide Tabela 2);
história de traumatismo cranioencefálico (TCE);
presença de febre;
eventos estressores recentes (perda de entes queridos, cirurgias, doenças).
Tabela 2: Drogas que podem causar agitação
Alucinógenos: cannabis, ácido lisérgico, mescalina, psiloscibina |
Anticonvulsivantes: barbitúricos, carbamazepina, valproato, fenitoína |
Antidepressivos |
Anti-histaminérgicos |
Sedativos: benzodiazepínicos, álcool | |
Estimulantes: cocaína, anfetaminas, cafeína, efedrina, metilfenidato, pseudoefedrina, teofilina |
Hormônios: andrógenos, estrógenos, progesterona, hormônios tireoidianos, corticóides |
Bloqueadores betaadrenérgicos: propranolol, atenolol |
Anticolinérgicos |
Agentes quimioterápicos: cisplatina, vincristina |
Antiarrítmicos: digitálicos, lidocaína, procainamida |
Outros: bromocriptina, carbidopa, levodopa, dissulfiram, alfametildopa, metilsergida, metoclopramida |
Antiinfecciosos: amantadina, tiabendazol, isoniazida, cloroquina, dapsona, penicilina, anfotericina B, metronidazol |
Devido à urgência do quadro clínico e às dificuldades na obtenção de informações, os exames físico e psíquico devem ser realizados paralelamente, para facilitar o estabelecimento dos fatores etiológicos relacionados ao quadro.
Deve-se verificar os sinais vitais do paciente e realizar o exame físico, descartando a possibilidade de a agitação ser devida à hipóxia ou por dor intensa, que devem ser tratadas prontamente.
Se a agitação ocorre por fatores de natureza orgânica, geralmente manifesta-se com início de forma súbita, alterações repentinas do estado de humor (irritabilidade, agressividade), confusão mental com rebaixamento do nível de consciência, desorientação têmporo-espacial e distúrbio de memória.
A Tabela 3 apresenta, resumidamente, achados físicos do quadro de agitação psicomotora e as possíveis correlações clínicas e diagnósticas.
Tabela 3: Exame físico do paciente agitado
Parâmetro |
Achado |
Implicação clínica provável |
Pulso |
Taquicardia |
Hipertireoidismo Infecção Insuficiência cardíaca |
Temperatura |
Febre |
Sepse Tempestade tireoidiana Vasculite Meningite/meningoencefalite |
Pressão sanguínea |
Hipertensão |
Encefalopatia hipertensiva Massa intracraniana |
Respiração |
Taquipnéia |
Diabete descompensado Pneumonia Insuficiência cardíaca Intoxicação por álcool/drogas Ansiedade |
Couro cabeludo e face |
Evidências de trauma |
TCE |
Pescoço |
Rigidez de nuca |
Meningite Hemorragia subaracnóidea |
Olhos |
Papiledema |
Tumor Encefalopatia hipertensiva |
Dilatação pupilar |
Ansiedade Delirium tremens | |
Boca |
Laceração em língua |
Epilepsia |
Tireóide |
Aumentada |
Hipertireoidismo |
Coração |
Arritmia |
Débito cardíaco inadequado |
Cardiomegalia |
Insuficiência cardíaca Doença hipertensiva | |
Pulmão |
Crepitações, cianose |
Edema pulmonar Pneumonia Tromboembolismo pulmonar |
Fígado |
Aumentado/sinais de insuficiência hepática (ascite, spiders, flaping) |
Cirrose Insuficiência hepática |
Sistema nervoso |
Assimetria de reflexos e força/Babinski |
Lesão de massa AVC |
Os exames físico e psíquico devem ser realizados paralelamente, para facilitar o estabelecimento dos fatores etiológicos relacionados ao quadro.
É necessário sempre considerar que a agitação pode ter origem em uma doença orgânica. Geralmente, nestes casos, a agitação se inicia de forma súbita, com alterações repentinas do estado de humor (irritabilidade, agressividade), confusão mental com rebaixamento do nível de consciência, desorientação têmporo-espacial e distúrbio de memória.
Três grupos principais de transtornos determinantes do quadro de agitação psicomotora devem ser pesquisados, conforme segue.
1. Trauma craniencefálico.
2. Agitação no paciente epiléptico.
3. Intoxicações (solventes, inseticidas, medicamentos).
4. Distúrbios metabólicos (hipoglicemia, hiperglicemia, hipertireoidismo, uremia, insuficiência hepática).
5. Abstinência e intoxicação por substâncias psicoativas (álcool, cocaína, heroína, fenciclidina (PCP)).
6. Delirium, demência.
1. Transtorno afetivo bipolar.
2. Esquizofrenia.
3. Outros transtornos psicóticos.
1. Transtornos dissociativos.
2. Síndromes fóbico-ansiosas.
3. Oligofrenia.
4. Transtornos da personalidade (Borderline, anti-social).
5. Reação aguda a estresse.
Exames complementares devem ser utilizados na hipótese de diagnósticos de etiologia orgânica.
Hemograma completo com diferencial de leucócitos;
eletrólitos, índices renais e hepáticos, glicemia;
testes de função da tireóide;
testes sorológicos para sífilis;
teste sorológico para HIV;
análise de urina;
eletrocardiograma;
eletroencefalograma;
radiografia torácica;
triagem para drogas no sangue e na urina.
Cultura de sangue urina e líquido cefalorraquidiano (LCR);
concentração de ácido fólico, vitamina B12;
tomografia computadorizada ou ressonância magnética do cérebro;
análise de LCR.
Exames complementares devem ser realizados sempre que se considerar a agitação decorrente de uma doença orgânica.
A tentativa de dialogar com o paciente antes de qualquer intervenção medicamentosa ou contenção mecânica deve ser seriamente considerada. Dentre os cuidados no manejo verbal de pacientes agitados, encontram-se os seguintes:
preocupe-se com a segurança de todos: atenção para sinais de heteroagressividade iminente (Tabela 1);
mantenha-se calmo e no controle da situação;
fale suavemente, de modo a não provocar e não julgar;
se possível, o paciente e o clínico devem ficar sentados;
quando o paciente começar a falar, escute;
caso haja suspeita de heteroagressividade iminente, os cuidados devem ser redobrados, com garantia de acesso à saída para o examinador, e o acionamento de outros membros da equipe para a eventual necessidade de restrição física.
A contenção física é um procedimento que deve ser determinado como medida protetora do paciente e de outras pessoas, devendo ser aplicada somente no contexto do tratamento. Sua aplicação deve ocorrer apenas quando estritamente necessário.
Diretrizes para a imobilização:
1. De preferência, 5 pessoas devem ser requisitadas para conter o paciente. Uma delas deve coordenar o procedimento e se comunicar com o paciente.
2. Contenções de couro são o tipo de restrição mais seguro e resistente.
3. Durante todo o procedimento, o paciente deve ser esclarecido sobre o que está sendo feito, o motivo e o caráter não-punitivo da conduta.
4. Os pacientes devem ser contidos com as pernas abertas e um braço preso de um lado e o outro preso sobre a cabeça.
5. A cabeça do paciente deve ser levantada ligeiramente para reduzir a possibilidade de aspiração.
6. Observar para que os membros não fiquem torcidos de forma a causar tração de nervo ou alguma lesão por compressão.
7. A medicação a ser administrada deve estar pronta e ser realizada logo que possível, caso o paciente continue agitado após a contenção.
8. O paciente deve ser mantido sob observação constante, para monitoração de sua segurança e conforto. Sinais vitais devem ser controlados a cada 30 a 60 minutos.
9. Após o efeito da contenção química, remover as contenções de um membro de cada vez.
Advertência: em caso de suspeita de intoxicação por fenciclidina (PCP), evitar contenções, se possível; em vez disso, isole o paciente em um ambiente desprovido de estímulos. Se as contenções forem absolutamente necessárias, não use contenções nos membros, já que a PCP tem efeito anestésico. Os pacientes podem sofrer lesões ao lutarem contra as contenções enquanto não sentem dor.
Para a agitação severa, a tranqüilização pode ser necessária. Geralmente, são usados sedativo-hipnóticos (benzodiazepínicos) e Antipsicóticos. Se o paciente está tomando uma droga específica ou tem história de resposta a determinado medicamento, use esta droga novamente.
A escolha da droga é baseada nas vias disponíveis de administração, metabolismo, tempo de início de ação e meia-vida de eliminação. O lorazepam
Indicações para o uso de benzodiazepínicos:
em caso de suspeita de abstinência de álcool, já que os Antipsicóticos podem precipitar convulsões;
em caso de suspeita de intoxicação com estimulantes;
se o paciente não está psicótico, para evitar o risco de efeitos colaterais dos Antipsicóticos.
Indicados principalmente para agitação psicótica. A escolha da droga é baseada nas vias disponíveis de administração, potência e perfil de efeitos colaterais. Os Antipsicóticos de alta potência são as drogas habituais de escolha, embora freqüentemente causem efeitos extrapiramidais (distonia aguda, parkinsonismo, acatisia); esses efeitos são, em geral, facilmente tratados com drogas anticolinérgicas, benzodiazepínicos ou betabloqueadores. Os Antipsicóticos de baixa potência, embora mais sedativos, podem causar problemas maiores, como efeitos colaterais anticolinérgicos e hipotensão. A escolha habitual é o haloperidol 5 mg VO ou IM, podendo-se repetir a dose, se necessário, em 30 minutos, com a possibilidade de dose máxima entre 45 e 100 mg em 24 horas. Para manutenção, utiliza-se cerca de metade da dose inicialmente eficaz, IM ou VO, com redução progressiva à medida que os sintomas vão remitindo.
A acatisia (inquietação) é um efeito colateral comum de Antipsicóticos de alta potência e pode ser indiferenciável de uma piora da agitação.
A combinação de midazolam 15 mg e haloperidol 5 mg, aplicados juntos por via intramuscular, pode ser usada em casos graves, com a monitoração dos níveis de pressão e função respiratória. Deve-se lembrar que benzodiazepínicos administrados por via intramuscular podem ter absorção errática. Os benzodiazepínicos podem reduzir o risco de acatisia.
Pacientes agitados podem necessitar de internação involuntária, seja para sua própria proteção, seja para a proteção da família e da sociedade. Caso a decisão do médico e da família seja pela não-hospitalização, os familiares devem ser orientados quanto aos riscos que o paciente pode oferecer.
Diversos quadros psiquiátricos podem cursar com agitação e comportamento violento na criança. Os principais são:
transtornos invasivos do desenvolvimento;
transtorno de conduta;
oligofrenia;
transtorno afetivo bipolar;
esquizofrenia;
comportamento suicida;
encefalites (meningites, meningoencefalites);
intoxicações;
traumatismo craniencefálico;
ambiente familiar desestruturado e violento.
A equipe deve, em primeiro lugar, garantir a proteção da criança e do grupo de profissionais, de preferência com uma abordagem não ameaçadora, sem utilização de contenção ou medicamentos.
A entrevista com familiares e a avaliação clínica devem ajudar o médico a identificar os fatores etiológicos relacionados ao quadro.
Crianças sem doença psiquiátrica grave, por serem pequenas, podem ser contidas sem o uso de medicação.
A escolha do medicamento deve basear-se no quadro psiquiátrico de base e no quadro clínico atual.
A criança apresenta maior capacidade de metabolização hepática, maior filtragem glomerular e menor quantidade de tecido adiposo. Portanto, as drogas são eliminadas mais rapidamente, de forma que elas possam necessitar ou tolerar dosagens maiores que adultos em termos de miligramas por peso.
De modo geral, os Antipsicóticos são os psicofármacos mais utilizados em quadros de agitação na infância. O haloperidol pode ser administrado na dosagem de
Muitas famílias são resistentes em procurar ajuda psiquiátrica para uma criança com problemas. O serviço de emergência acaba sendo o único modo de engajamento em um serviço de psiquiatria para muitas crianças com graves problemas psíquicos. Muitas vezes, a agitação da criança é resultado de um ambiente familiar muito adverso, de forma que a família também deve ser encaminhada para tratamento.
A agitação psicomotora consiste na emergência mais comum em psiquiatria, presente em uma ampla faixa de transtornos mentais.
Verificar rapidamente se há uma emergência clínica e se o paciente está ameaçando a própria segurança ou a segurança da equipe.
Inúmeras drogas podem causar agitação psicomotora, e este diagnóstico diferencial deve sempre ser considerado.
A tentativa de dialogar com o paciente antes de qualquer intervenção medicamentosa ou contenção mecânica deve ser considerada.
A contenção física é um procedimento que deve ser determinado como medida protetora do paciente e de outras pessoas, devendo ser aplicada somente no contexto do tratamento.
Quando a tranquilização é necessária, geralmente são usados sedativo-hipnóticos (benzodiazepínicos) e Antipsicóticos.
Algoritmo 1: Avaliação e tratamento da agitação psicomotora
1. Schweickert W, Hall JB. Agitation in the critically ill pacient: a marker of health or a plea for treatment? Crit Care Med 2005; 33(1):263-5.
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5. Citrome L. New treatments for agitation. Psychiatr Q 2004; 75(3):197-213.
6. Botega NJ. Prática psiquiátrica no hospital geral: interconsulta e emergência. Porto Alegre: Artmed, 2006.
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8. Kaplan HI, Sadock BJ. Medicina psiquiátrica de emergência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
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