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Megacólon tóxico

Omegacólon tóxico (MT) é a dilatação colônica total ou segmentar sem obstruçãoassociada. Trata-se de uma doença rara e potencialmente fatal que ocorre principalmentecomo complicação da retocolite ulcerativa (RCUI) e da doença de Crohn, mastambém que também é descrita em colites infecciosas, sendo comumente associadaao Clostridium difficile. Causas menos comuns de MT incluem coliteisquêmica, volvo, diverticulite e obstrução intestinal por câncer.

Aincidência geral de MT é desconhecida. Em pacientes com RCUI, a incidência deMT varia de 1 a 5%, com incidência maior em pacientes internados, quando variade 5 a 17%. Ela pode ocorrer, ainda, em 1 a 3% dos pacientes internados porcolite pelo C. difficile, acometendo principalmente pacientes com colitegrave. Qualquer condição inflamatória do cólon pode levar a dilatação do cólone MT. Isso ocorre mais comumente com doenças inflamatórias intestinais (DIIs) ecolites infecciosas, como por C. difficile, Salmonella, Shigella, Campylobacter,Yersinia, Escherichia coli 0157, e na colite isquêmica.

As causasmenos frequentes de MT incluem infecção parasitária por Entamoeba histolyticae Cryptosporidium, colite por citomegalovírus em pacientes com HIV ou aids,colite pseudomembranosa secundária à terapia com metotrexato e sarcoma deKaposi. Fatores de risco para sua ocorrência incluem hipocalemia, hipomagnesemia,neoplasias malignas, descontinuação de medicações para tratamento de DII, usode enemas de bário e drogas que diminuem a motilidade colônica, incluindo opioidese antidiarreicos, como a loperamida.

 

Fisiopatologia

 

Apatogênese do MT não é totalmente compreendida, e vários mecanismos possíveis têmsido descritos. Em pacientes com DII, acredita-se que a inflamação da mucosa leveà liberação de mediadores inflamatórios e toxinas bacterianas, aumentando asquantidades de sintase de óxido nítrico induzível na camada muscular própria, oque resulta em aumento do óxido nítrico, que, por sua, vez inibe o tônus ??da musculaturalisa intestinal, causando paralisia e dilatação da parede do cólon. Extensãotransmural da resposta inflamatória além da mucosa na camada de músculo lisocom substituição por tecido de granulação é característica do MT. Além disso, noMT, a camada muscular é invadida por neutrófilos, que produzem mais óxido nítrico,citocinas, enzimas proteolíticas e leucotrieno. Esses fatores inflamatóriosdanificam ainda mais a camada muscular, levando a translocação bacteriana ebacteremia. A resposta inflamatória sistêmica, juntamente com a bacteremia,leva a toxicidade sistêmica, com taquicardia, hipotensão, febre, estado mentalalterado, hipersensibilidade e distensão abdominal com ou sem peritonite.

 

Diagnóstico e Manifestações Clínicas

 

Odiagnóstico de MT depende de achados clínicos e radiológicos. Devem-se obter históriacompleta e um exame físico, incluindo história de diagnóstico de DII, extensãodo envolvimento do cólon e terapia prévia, hospitalizações recentes, antibióticosutilizados e outros medicamentos, incluindo corticosteroides ou agentesantimotilidade ou quimioterápicos. A maioria dos pacientes apresenta sinais esintomas de colite, como diarreia (frequentemente com sangue), febre, calafriose cólicas abdominais, cerca de uma semana antes do aparecimento do MT. Noinício do quadro, sinais constitucionais, como febre, taquicardia ou hipotensão,podem ocorrer. Estado mental alterado, distensão e hipersensibilidadeabdominal, obstipação e diminuição de ruídos intestinais também ocorrem.Achados comuns nesses pacientes incluem hipoalbuminemia, hipocalemia e aumentode provas inflamatórias. A presença de peritonite é altamente suspeita deperfuração intestinal. Diminuição do nível de consciência, analgésicos ou altasdoses de corticosteroides podem mascarar a dor abdominal e outros sinais ousintomas do MT.

 

Umdiagnóstico clínico de MT é realizado quando o paciente apresenta dilataçãocolônica (> 6 cm) e pelo menos três dos critérios clínicos a seguir:

- temperatura> 38,5°C;

-frequência cardíaca > 120 batimentos/min;

-leucocitose > 10.500 céls./mm3;

 - anemia.

 

Além dessesachados, os pacientes precisam apresentar pelo menos um dos seguintes sinais:

-desidratação;

-alteração do estado mental;

-distúrbios hidreletrolíticos;

-hipotensão.

 

As radiografiasabdominais simples são úteis no diagnóstico e ajudam a monitorar a progressão doMT. Achados radiológicos incluem a dilatação do cólon transverso ou direito> 6, podendo chegar até 15 cm. O cólon descendente, o cólon sigmoide e oreto raramente aparecem distendidos. Níveis hidroaéreos podem ser encontrados.O espessamento da parede do cólon são frequentes, por causa da ausência dopadrão de haustrações normal do cólon. Projeções pseudopolipoides cheias de arpodem ser vistas no lúmen do cólon e indicam ulcerações da mucosa. Radiografiasrepetidas são indicadas para quaisquer alterações do estado clínico. Embora alargura absoluta do cólon na radiografia ajude no diagnóstico de MT, o quadroclínico geral do paciente é mais importante.

Em pacientescom doença obstrutiva do cólon, não há ar no cólon abaixo do ponto deobstrução. Uma investigação mais aprofundada com enema de bário ou colonoscopiapode ser necessária para caracterizar a localização e o tipo de obstrução.

Aultrassonografia e a tomografia computadorizada (TC) podem ser usadas paraconfirmar o diagnóstico e identificar a causa subjacente da colite. Os sinaistípicos de colite grave incluem espessamento da parede do cólon, alterações dashaustrações colônicas, múltiplos níveis hidroaéreos no cólon e sinal do cordão,que são áreas de estenose ou estreitamento do intestino com formação depseudodivertículos.

A TCtambém pode determinar a extensão e a gravidade da doença, incluindo complicaçõescomo perfuração do cólon e comprometimento vascular.

Os estudoslaboratoriais podem mostrar anormalidades inespecíficas que revelam a extensãoda toxicidade sistêmica no MT. Leucocitose com desvio à esquerda é comumenteencontrada, particularmente em pacientes com diarreia pelo C. difficile,quando pode ocorrer leucocitose > 30.000 céls./mm3. Pacientesimunocomprometidos podem apresentar neutropenia. Anemia pode ocorrer devido àperda de sangue oculto. Anormalidades eletrolíticas são comuns, com alcalosemetabólica ocorrendo em virtude de depleção de volume, hipocalemia ehipoalbuminemia (< 3 g/dL), todos achados indicativos de prognóstico ruim. Apresença de acidose metabólica sugere colite isquêmica. Elevações em provasinflamatórias, como VHS e proteína C reativa, são comuns. As amostras de fezesdevem ser enviadas para cultura e pesquisa de toxinas para C. difficile.O real-time PCR é o padrão ouro para detectar toxina para C.difficile, sendo altamente sensível, e pode identificar portadoresincidentais do C. difficile, mas não faz a distinção entre colonização einfecção clínica. Os imunoensaios enzimáticos para C. difficile com glutamatodesidrogenase são testes de triagem rápida para infecção, mas não conseguemdistinguir entre as cepas toxigênicas e não toxigênicas, e um exame positivodeve ser confirmado por um RT-PCR. Ensaios imunoenzimáticos para toxinas A e Bde C. difficile podem ter resultados em poucas horas, mas apresentam baixasensibilidade. Como a bacteremia ocorre em 25% dos pacientes com MT,hemoculturas também devem ser obtidas.

Embora a colonoscopiapossa ser valiosa para determinar a causa do diagnóstico, é altamente arriscadae pode perfurar o cólon. A retossigmoidoscopia flexível sem preparaçãointestinal é considerada mais segura e pode ser usada para diferenciar entredoenças inflamatórias ou infecciosas e localizar a doença no reto ou no cólon sigmoide.Recomenda-se apenas avançar o endoscópio para obter a insuflação para evitar aperfuração

ou piorado íleo. A colonoscopia nunca deve ser usada, exceto em pacientes nãocirúrgicos que requerem descompressão endoscópica.

Adescompressão colonoscópica é um procedimento tecnicamente difícil e contraindicadoa pacientes com perfuração colônica ou peritonite. Um

tubo dedescompressão deve ser colocado no momento da colonoscopia para

reduzir anecessidade de colonoscopia repetida no futuro.

         O Quadro 1 apresenta as etiologias domegacólon tóxico.

 

Tabela 1:Etiologias do megacólon tóxico

 

Inflamatórias

? Doença de Crohn

? Retocolite ulcerativa

Infecciosas

? Clostridium difficile

? Salmonella, Shigella, Yersinia, Campylobacter

? Cryptosporidium

? Entamoeba

? Citomegalovírus

Colite isquêmica

Neoplasias malignas

Sarcoma de Kaposi

Medicações

? Descontinuação de corticosteroides

? Opioides

? Anticolinérgicos

? Quimioterápicos

Outras causas

? Hipocalemia, hipomagnesemia

? Enema de bário

? Colonoscopia

 

Tratamento

 

Otratamento é de suporte, com exames laboratoriais e de imagem repetidos a cada12 a 24 horas, e os pacientes devem ficar inicialmente em jejum. Monitoramentodo estado hemodinâmico é importante. A reposição volêmica deve ser agressiva,usando cristaloides, como solução salina isotônica, exceto se choque com hipoalbuminemiagrave estiver presente, o que requer a administração de coloides. Além disso, deve-serepor eletrólitos para evitar a hipocalemia.

Empacientes com RCUI grave, o número e a consistência das evacuações são indicadorescríticos da gravidade da exacerbação. A redução no número de evacuações, o quepoderia indicar melhora do quadro, muitas vezes significa deterioração doestado do paciente, com dilatação posterior do cólon e do íleo. Por sua vez, adiminuição da diarreia pode indicar resposta positiva à terapia. Os pacientescom RCUI grave devem usar hidrocortisona em dose inicial de 100 mg endovenosa (EV)a cada 6 ou 8 horas ou metilprednisolona em dose equivalente, e em caso deausência de resposta deve ser considerado o uso de infliximab ou ciclosporina.Doses mais altas de corticosteroides ou extensão da terapia não têm impacto nosdesfechos. Sulfassalazina ou 5-aminossalicilato não desempenham nenhum papel notratamento do MT causado pela doença inflamatória intestinal, assim como aazatioprina e a 6-mercaptopurina, devido ao seu início de ação lento.

A cirurgiaé indicada a pacientes que não apresentam melhora nas primeiras 48 a 72 horasapós o desenvolvimento do MT. Os pacientes devem receber suplementação adequadacom fluidos intravenosos (IV). O repouso intestinal é iniciado com o pacientenão recebendo nada por via oral, e uma sonda nasogástrica ou uma sonda enteral éusada para descompressão intestinal. Embora não existam evidências de que adescompressão altere os desfechos, ela pode facilitar a cirurgia, se necessária.O uso de opioides, antidiarreicos e agentes anticolinérgicos deve serdescontinuado. A nutrição parenteral total é controversa e não mostrou benefíciona prevenção de cirurgia ou redução do tempo de internação. O uso de antibióticosé recomendado. Além disso, a bacteremia pode estar presente mesmo na ausênciade perfuração e tem alta mortalidade.

Devido aorisco de perfuração do cólon, recomenda-se iniciar antibióticos no MT mesmo semevidência de etiologia infecciosa. A terapia médica para o MT relacionado àcolite não relacionada à DII é direcionada especificamente para o processo dadoença. Em particular, a colite pseudomembranosa deve ser tratadaagressivamente com a retirada do agente causador, e deve-se iniciar metronidazoloral ou IV ou vancomicina oral. A cirurgia não deve ser adiada se os parâmetrosclínicos continuarem a piorar.

Aintervenção cirúrgica pode ser necessária em até 80% dos pacientes com colitepelo C. difficile. As indicações para cirurgia incluem perfuração, dilataçãoprogressiva do cólon, falta de melhora clínica nas primeiras 48 a 72 horas esangramento descontrolado. O momento da cirurgia em pacientes com MT permanececontroverso. As indicações absolutas para cirurgia incluem perfuração, sangramentoretal incontrolável e deterioração clínica com progressiva dilatação para pacientesselecionados com risco de perfuração iatrogênica por causa de mucosa friável ecólon edematoso durante colectomia.

 

Bibliografia

 

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