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Comparação de Doses de Aspirina e Clopidogrel em Síndromes Coronarianas Agudas

Autor:

Antonio Paulo Nassar Junior

Especialista em Terapia Intensiva pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Médico Intensivista do Hospital São Camilo. Médico Pesquisador do HC-FMUSP.

Última revisão: 17/02/2011

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Fator de Impacto da Revista (N Engl J Med 2009): 47,05

 

Contexto Clínico

Aspirina e clopidogrel são recomendados no tratamento das síndromes coronarianas agudas. No entanto, as doses a serem usadas são controversas. Alguns estudos sugerem que doses maiores de clopidogrel permitem uma inibição da agregação plaquetária mais rápida e eficaz. Em relação à aspirina, pequenas doses são suficientes para a sua ação, mas as recomendações das diretrizes variam e seus benefícios clínicos não são bem estabelecidos. Portanto, o risco-benefício quanto às doses dos dois antiagregantes ainda não está definido.

Assim, os autores deste estudo propuseram-se a comparar uma dose maior de ataque e manutenção que a usual de clopidogrel e duas dosagens de aspirina, em formato 2x2. Foram incluídos pacientes com mais de 18 anos, com infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento de ST ou com uma síndrome coronariana aguda sem supradesnivelamento de ST. Alterações eletrocárdiográficas ou elevação dos marcadores de necrose miocárdica eram necessários para a inclusão. Além disso, era necessário que os pacientes fossem submetidos a uma estratégia invasiva, com o planejamento de realizar-se uma antgioplastia em menos de 72 horas da randomização. Foram excluídos pacientes com risco aumentado de sangramento e alergia conhecida ao clopidogrel ou à aspirina.

 

O Estudo

Os pacientes foram randomizados para uma dose dobrada de clopidogrel no primeiro dia (600 mg), seguida de 150 mg nos dias 2 a 7 ou para a dose convencional de ataque (300 mg), seguidos de 75 mg diários. Os dois grupos receberam 75 mg diários dos dias 8 a 30. Os pacientes que, após o cateterismo, tivessem indicação cirúrgica tinham o clopidogrel suspenso. Em relação à aspirina, todos receberam uma dose de ataque (= 300 mg) no dia 1 e, depois, foram randomizados para uma dose de 75 a 100mg diários dos dias 2 a 30 ou para uma dose maior de 300 a 325 mg nos dias 2 a 30.

O principal desfecho analisado foi o tempo até a ocorrência de morte por causa cardiovascular, infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral em 30 dias. Os desfechos secundários foram mortalidade cardiovascular, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, isquemia recorrente ou morte por qualquer causa. Trombose de stent foi um desfecho analisado em pacientes submetidos à angioplastia. O principal desfecho de segurança foi sangramento importante (transfusão de 2 ou mais concentrados de hemácias, relacionado à revascularização miocárdica, grave, com queda de hemoglobina = 5 g/dl, intracraniano sintomático ou fatal).

 

Resultados

Foram incluídos 25.086 pacientes, com média de 61 anos de idade e 27% do sexo feminino. A mediana de tempo da randomização até o cateterismo foi de 0,5h no grupo com IAM com supra e de 3,4 horas no grupo de síndrome coronariana sem supra. A médiana da duração do uso do clopidogrel foi de 1 dia naqueles com indicação cirúrgica e de 7 dias naqueles sem lesões críticas ou não candidatos à revascularização.

Na comparação entre as doses de clopidogrel, o desfecho primário ocorreu em 4,2% daqueles que receberam dose dobrada e em 4,4% dos que receberam a dose convencional (HR 0,94; IC 95% 0,83-1,06; p=0,30). Não houve diferença quanto aos desfechos secundários. No entanto, houve um aumento de sangramento no grupo de dose dobrada (2,5 vs. 2,0%; IC 95% 1,05-1,46; p=0,01), secundariamente a uma maior necessidade de transfusão (2,2 vs. 1,7%; p=0,01). Não houve diferença quanto ao sangramento intraoperatório ou intracraniano. Os sangramentos pequenos também foram mais comuns no grupo que recebeu dose dobrada de clopidogrel (5,1 vs. 4,3%; HR 1,18; IC 95% 1,05-1,33; p=0,01).

Na comparação entre as doses de aspirina, não houve diferenças quanto ao desfecho primário (4,2% no grupo dose alta e 4,4% no grupo dose baixa; HR 0,97; IC 95% 0,86-1,09; p=0,61) e aos desfechos secundários. Não houve diferença quanto a sangramentos importantes (2,3 vs. 2,3%; HR 0,99; IC 95% 0,84-1,17; p=0,90), mas houve um aumento discreto de sangramentos menores no grupo que recebeu dose alta (5,0 vs. 4,4%; HR 1,13; IC 95% 1,00-1,27; p=0,04).

Na análise de subgrupos, foi observada uma redução do desfecho primário nos pacientes com dose sobrada de clopidogrel que foram submetidos à angioplastia (3,9 vs. 4,5%; HR 0,85; p=0,04). Além disso, nestes pacientes, houve uma redução da trombose de stent (1,6 vs. 2,3%; HR 0,68; IC 95% 0,55-0,85; p<0,001).

 

Aplicações para a Prática Clínica

Este estudo traz importantes contribuições ao tratamento dos pacientes com síndrome coronariana aguda. Seus resultados mostram que doses maiores que as convencionalmente recomendadas de aspirina e clopidogrel não se mostraram mais eficazes na redução do desfecho combinado. Houve um aumento pequeno de sangramento no grupo que usou dose dobrada de clopidogrel (NNH=200). No entanto, alguns pontos merecem ser comentados para reflexão. Primeiro, houve uma redução do desfecho primário nos pacientes que receberam a dose dobrada de clopidogrel e foram submetidos à angioplastia (NNT=167). Obviamente, foi um achado de subgrupo e precisa de confirmação em estudos clínicos. Porém, fica a dúvida: como identificar esse paciente quando ele chega ao PS com síndrome coronariana aguda? Obviamente, nos pacientes com IAM com supra (embora não 100%), mas e nos que não tem supra? Mais ainda, qual a importância clínica desse resultado com um NNT tão alto para um desfecho combinado? Outro ponto a se discutir foi a redução da trombose de stent, já sugerida em outros estudos, mas cuja repercussão clínica não ficou clara neste estudo. Além disso, em relação à aspirina, será que o uso de uma dose de ataque de 300 mg (maior do que a recomendada na diretriz brasileira – 200 mg2 –, por exemplo) pode ter tido alguma repercussão uma vez que a antiagregação dura por 7 dias? Merecem ainda ser considerados a escolha da estratificação invasiva e sua utilização extremamente precoce dos centros (mediana de 3,4 horas em síndromes coronarianas agudas sem supra ST e de 0,5h em IAM com supra ST), ambas situações longe da realidade da maioria dos hospitais brasileiros.

De qualquer modo, este estudo vem a somar-se com outros sobre insuficiência coronariana aguda que randomizam uma quantidade enorme de pacientes e mostram ou uma diferença pequena de resultados, muitas vezes sem repercussões clínicas, ou não as mostram. Será que ainda são necessários tantos estudos para definir se uma dose se aspirina de 200 mg tem uma redução do risco absoluto de um desfecho combinado de 0,5% em relação a uma dose de 100 mg? Por ora, parece prudente seguir as recomendações vigentes (aspirina 100 mg por dia e clopidogrel 300 mg, seguidos de 75 mg diários).

 

Referências

1.   The CURRENT–OASIS 7 Investigators. Dose comparisons of clopidogrel and aspirin in acute coronary syndromes. N Engl J Med 2010; 363:930-942.

2.   IV Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento do Infarto Agudo do Miocárdio com Supradesnível do Segmento ST. Disponível em: http://publicacoes.cardiol.br/consenso/2009/diretriz_iam_9306supl2.pdf.

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