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Tratamento da Apendicite Aguda Não Complicada

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 30/11/2021

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Caso

 

Um rapaz de 27anos de idade, previamente hígido, dá entrada no pronto-socorro com história dedor abdominal há dois dias que começou na região umbilical e migrou para o quadranteinferior direito do abdome. Os sinais vitais estão normais, exceto por temperaturaaxilar de 37,8°C e presença de dor grau 7 em uma escala de 1 a 10, com 10representando a pior dor possível. Ao exame físico, há dor à palpação noquadrante inferior direito do abdome, com sinal de descompressão positivo,sugerindo peritonite. Você solicita um hemograma, que mostra leucócitos de 12.500.Você também pede uma tomografia computadorizada (TC), dada a alta probabilidadeclínica de apendicite. A TC contrastada mostra apêndice dilatado e inflamadosem apendicólito, abscesso, perfuração ou tumor.

 

Discussão

 

Vamosdiscutir qual seria a condução adequada do caso. Antes de tudo, devemos lembrarque, em uma óptica de envolvimento do paciente, este deve ser informado sobreas vantagens e as desvantagens tanto da estratégia conservadora (foco desta discussão)quanto da estratégia cirúrgica para tomada de decisão.

Primeiramente,devemos lembrar que a apendicite aguda é a doença mais frequente quandodiscutimos cirurgias de urgência do trato digestivo. A maior incidência é entrepessoas de 10 a 19 anos de idade, e o risco ao longo da vida é de 7 a 8%. Aapendicite não tratada, quando associada à ruptura, pode causar abscesso,peritonite, sepse e morte. A apendicite não complicada (ou seja, apendicitelocalizada), que tradicionalmente tem sido tratada com apendicectomia, éresponsável por aproximadamente 80% dos casos. Nas últimas três décadas, váriosensaios clínicos sobre tratamento não cirúrgico em pacientes com apendiciteaguda não complicada foram conduzidos, e o uso de antibióticos como primeiraestratégia passou a ser reconhecido como uma opção segura.

O tratamentonão cirúrgico inclui analgesia e antibióticos por 7 a 10 dias. Esse tratamentoconservador está associado a menor tempo de incapacidade do que com arealização de apendicectomia, não requer hospitalização e não está associado arisco aumentado de ruptura. Ao longo de cinco anos, aproximadamente 30 a 40%dos pacientes que foram tratados com antibióticos serão submetidos àapendicectomia, e pacientes com apendicólito que recebem tratamento conservadortêm maior probabilidade do que aqueles sem apendicólito de serem submetidos àapendicectomia.

Já sobre otratamento mais tradicional, a cirurgia, a apendicectomia é uma cirurgia derisco relativamente baixo. A taxa de letalidade em 30 dias associada àapendicectomia entre pacientes com apendicite não complicada é deaproximadamente 0,5 por 1.000; entre os idosos, a taxa de letalidade é cerca deduas vezes maior do que entre os adolescentes. Atualmente, a maioria dascirurgias é realizada por laparoscopia, uma abordagem que está associada amenos infecções da ferida e recuperação mais rápida do que a apendicectomiaaberta, mas pode ser mais cara. Devemos lembrar que se trata de procedimentoque requer anestesia geral e hospitalização, embora a cirurgia ambulatorialseja possível. Pacientes com ruptura e grande abscesso ou flegmão (apendicitecomplicada) geralmente são tratados com antibióticos e, se possível, passam pordrenagem percutânea para evitar operações mais extensas que envolvam o íleoe/ou o cólon.

Os pacientesmais adequados para se indicar o tratamento conservador apenas com antibióticossão aqueles com diagnóstico clínico de apendicite localizada sem achados deexame de peritonite difusa ou evidência de imagem de grande abscesso, flegmão,perfuração ou tumor. Os pacientes também devem estar hemodinamicamenteestáveis, sem evidências de sepse ou choque séptico. Em geral, não sãoelegíveis gestantes, pacientes imunocomprometidos ou aqueles com história dedoença inflamatória intestinal. Pacientes com apendicólito identificado porimagem (que está presente em aproximadamente 25% dos pacientes e está associadoà ruptura do apêndice) apresentam risco aumentado de complicações. Esses casosmerecem uma discussão melhor sobre qual linha de tratamento seguir. Um ponto ase observar é que a resposta aos antibióticos pode ser retardada em pacientescom 45 anos de idade ou mais e naqueles que têm apendicólito, líquidoextraluminal ou ar, febre ou marcadores inflamatórios elevados e naqueles queapresentam sintomas por mais de 48 horas, todos os quais associados a abscessoapendicular, ou seja, são casos que muitas vezes merecem revisão de exame deimagem e tomada de conduta cirúrgica. Um resumo das recomendações de sociedadesmédicas é apresentado na Tabela 1.

 

Tabela1 ? Diretrizes dassociedades profissionais sobre o tratamento da apendicite aguda não complicada

 

Guideline de sociedade

Recomendação

American Association for the Surgery of Trauma 2018

·                    A cirurgia ou uma abordagem não operatória é razoável.

National Institute for Health and Care Excellence 2019

·                    Por enquanto, o tratamento cirúrgico é o padrão aceito, mas o tratamento médico, incluindo antibióticos, pode ser uma alternativa. Há número crescente de evidências em apoio ao tratamento não operatório.

World Society of Emergency Surgery 2020

·                    Evidências de alta qualidade apoiam o tratamento não operatório com antibióticos. Essa alternativa segura à cirurgia deve ser discutida em pacientes selecionados sem apendicólito.

American College of Surgeons 2020

·                    Evidências de alta qualidade indicam que a maioria dos pacientes pode ser tratada com antibióticos em vez de apendicectomia. No entanto, os pacientes com apendicólito tratados com antibióticos apresentam risco maior de complicações do que aqueles sem apendicólito.

 

 

Bibliografia


1.            Talan DA,Saltzman DJ, DeUgarte DA, Moran GJ. Methods of conservative antibiotic treatmentof acute uncomplicated appendicitis: a systematic review. J Trauma Acute CareSurg 2019;86:722-736.

2.            The CODA Collaborative. A randomized trialcomparing antibiotics and appendectomy for appendicitis. N Engl J Med2020;383:1907-1919.

3.            Talan DA, Di Saverio S. Treatment of AcuteUncomplicated Appendicitis. N Engl J Med 2021; 385:1116-1123.

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