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Cefaléias

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 17/01/2010

Comentários de assinantes: 4

QUADRO CLÍNICO

Caso 1

Mulher de 26 anos de idade procura ambulatório com história de cefaleia há 5 anos, na maioria das ocasiões unilateral com características latejantes, intensa, acompanhada de fotofobia, intolerância ao barulho e ocasionalmente náuseas e até vômitos. Refere que, antes da cefaleia, tem quadro de alterações visuais representadas por pontos brilhantes. Durante os episódios de dor, ela é obrigada a interromper as atividades e fica em um quarto escuro após tomar analgésicos contendo dipirona ou acetaminofeno, nem sempre com melhora. Associa o início da cefaleia com o período menstrual e, às vezes, com determinados tipos de alimentos, como chocolate.

 

Caso 2

Mulher de 43 anos de idade procura o ambulatório com queixa de cefaleia em pontada bilateral desde os 20 anos de idade. No começo, as dores eram esporádicas e melhoravam com aspirina. Há mais ou menos 2 anos, notou que as crises de dor estavam se tornando cada vez mais frequentes e há 1 ano tem dor de cabeça diariamente. Atualmente controla a dor com analgésicos comuns, usando vários comprimidos ao dia. A dor não impede as atividades habituais da paciente e não se exacerba com as atividades físicas. Em geral, não se acompanha de fotofobia, intolerância ao barulho, náuseas ou vômitos.

 

Caso 3

Mulher de 70 anos de idade procura o PS com queixa de cefaleia em região temporal direita há 2 semanas, em peso, sem fotofobia ou náuseas. A dor ocorre principalmente à noite. Usou paracetamol para aliviar a dor, apresentando melhora parcial. Refere também a sensação de parestesias na língua e na mandíbula, alem de dificuldade para pentear o cabelo quando está com dor. Há algumas horas, apresentou dificuldade para enxergar. Não se observaram alterações do exame físico geral e neurológico, com exceção de presença de nódulos avermelhados nas artérias temporais e diminuição da acuidade visual à direita.

 

Caso 4

Homem de 43 anos de idade, tabagista, há 1 semana apresenta 3 a 4 episódios diários de dor intensa retro-orbital acompanhada de obstrução nasal e lacrimejamento. Acorda à noite com a dor, com pouca melhora ao usar analgésicos, mesmo opioides; a dor melhora espontaneamente após 30 a 120 minutos.

 

COMENTÁRIOS

O termo cefaleia aplica-se a todo processo doloroso referido no segmento cefálico e que pode se originar tanto nas estruturas faciais quanto nas estruturas cranianas. A cefaleia representa um dos sintomas mais frequentemente referidos na prática clínica. Estima-se que 80% dos indivíduos de uma população apresentarão, pelo menos uma vez por ano, um episódio de cefaleia. A cefaleia é ainda uma das maiores causas de procura de atendimento medico, sendo que cerca de 70% dos pacientes preocupam-se mais em descartar um diagnóstico de maior gravidade do que em melhorar a dor.

As seguintes questões devem orientar o tratamento de uma pessoa com cefaleia:

 

       diagnóstico da cefaleia (verificar se é uma cefaleia primária ou secundária);

       solicitação ou não de exames complementares;

       tratamento das cefaleias secundárias;

       tratamento agudo das cefaleias primárias;

       esclarecer o paciente quanto à sua cefaleia;

       verificar se há necessidade de tratamento profilático e orientação adequada.

 

Uma cefaleia é chamada de primária quando não é causada por alterações estruturais do encéfalo ou do crânio. As cefaleias primárias compreendem cerca de 90% dos casos de cefaleia e são divididas em 4 grupos: enxaqueca, cefaleia tensional, cefaleia em salvas e outras cefaleias trigêmino-autonômicas e, por fim, outras cefaleias primárias. Já as secundárias, que são bem menos frequentes (cerca de 10% do total de cefaleias) são as mais preocupantes, pois podem ter causas graves.

A Sociedade Internacional de Cefaleia (SIC) estabeleceu critérios para o diagnóstico da enxaqueca e da cefaleia do tipo tensional, os quais são descritos a seguir.

 

Enxaqueca

A)  Pelo menos 5 crises preenchendo critérios B a D.

B)  Crise de cefaleia durando de 4 a 72 horas (não tratadas ou tratadas sem sucesso). Em crianças menores de 15 anos, as crises podem durar de 2 a 48 horas. Se o paciente dormir e acordar sem a crise, a duração da crise é considerada até a hora do despertar.

C)  A cefaleia tem, no mínimo, duas das seguintes características:

       localização unilateral;

       qualidade pulsátil;

       intensidade moderada ou forte (limitando ou impedindo atividades diárias);

       agravamento por atividade física.

 

D)  Durante a cefaleia, há, no mínimo, um dos seguintes sintomas:

       náuseas e/ou vômitos;

       fotofobia e fonofobia.

 

E)  Há, no mínimo, um dos seguintes:

       história e exames físico e neurológico não sugestivos de cefaleias secundárias;

       história e/ou exame físico e/ou neurológico sugestivos de tais distúrbios, mas que são afastados por investigação apropriada.

 

Tais distúrbios estão presentes, mas as crises de enxaqueca não ocorreram pela primeira vez em clara relação temporal com estes distúrbios.

Até 20% dos pacientes com enxaqueca podem ter pródromos com sintomas neurológicos transitórios, que podem durar de minutos a horas (enxaqueca com aura). Comumente, as auras envolvem sintomas visuais (arcos, escotomas cintilantes, perdas de campo visual). Mais raramente, paresias, alterações da fala, hipostesias.

A paciente do Caso 1 certamente se enquadra nos critérios diagnósticos descritos, assim podemos caracterizá-la como uma enxaqueca com aura, que são os sintomas neurológicos (usualmente visuais) que precedem a instalação da dor.

 

Cefaleia do Tipo Tensão Episódica

A)  Pelo menos 10 crises de cefaleia que preenchem os critérios B a D. O número de dias desta cefaleia é menor ou igual a 180/ano (menor que 15/mês).

B)  Cefaleia durando 30 minutos a 7 dias.

C)  Pelo menos duas das seguintes características da dor:

       qualidade de aperto/pressão (não pulsátil);

       intensidade leve a moderada (pode limitar, mas não impede atividades);

       localização bilateral;

       não é agravada por atividade física.

 

D)  Ambos dos seguintes:

       ausência de náusea ou vômitos (anorexia pode ocorrer);

       fotofobia e fonofobia estão ausentes, ou apenas um deles está presente.

 

E)  Pelo menos um dos seguintes:

       história e exames físico e neurológico não sugestivos de cefaleias secundárias;

       história e/ou exame físico e/ou neurológico sugestivos de tais distúrbios, mas que são afastados por investigação apropriada.

 

Tais distúrbios estão presentes, mas as crises de cefaleia tipo tensional não ocorreram pela primeira vez em clara relação temporal estes distúrbios.

A paciente do Caso 2 se enquadra na definição de uma cefaleia tensional.

 

Cefaleia em Salvas

São crises de dor intensa, unilateral, localização periorbitária ou temporal, com duração de 15 a 180 minutos. Atinge principalmente homens, geralmente dos 20 aos 50 anos de idade, frequentemente tabagistas; álcool pode ser desencadeante de crise. São critérios para seu diagnóstico:

 

A)  Pelo menos 5 crises preenchendo critérios B a D.

B)  Crises intensas de dor unilateral, orbitária, supraorbitária e/ou temporal, durando 15 a 180 minutos se não tratada.

C)  A cefaleia é associada com pelo menos um dos seguintes sinais:

       injeção conjuntival e/ou lacrimejamento ipsilateral;

       congestão nasal e/ou rinorreia ipsilateral;

       edema palpebral ipsilateral;

       sudorese da fronte e da face ipsilateral;

       miose e/ou ptose ipsilateral;

       sensação de inquietação ou agitação.

D)  A frequência das crises varia de 1 em dias alternados até 8 crises por dia.

E)  Não é atribuída a outro distúrbio:

       história e exames físico e neurológico não sugestivos de distúrbio secundário;

       história e/ou exame físico e/ou neurológico sugestivos de tais distúrbios, mas que são afastados por investigação apropriada.

 

Tais distúrbios estão presentes, mas as crises de cefaleia em salvas não ocorreram pela primeira vez em clara relação temporal com o distúrbio.

O paciente do Caso 4 certamente se encaixa na definição de cefaleia em salvas.

 

Arterite Temporal

A arterite temporal é uma causa secundária de cefaleia, de forma que sua discussão fica um pouco deslocada, considerando os outros quadros com cefaleias denominadas primárias. Ainda assim, é um diagnóstico diferencial de grande importância.

A arterite temporal faz parte do grupo das vasculites granulomatosas e afeta predominantemente os ramos extracranianos da artéria carótida. Ocorre quase exclusivamente em pacientes com mais de 50 anos de idade e tem predominância feminina.

Manifestações clínicas incluem cefaleia, claudicação de mandíbula e língua, sensibilidade no couro cabeludo, sintomas sistêmicos e febre. Envolvimento dos ramos principais da aorta pode causar claudicação de membros. Isquemia do nervo óptico está associada com arterite envolvendo os vasos da circulação ocular, podendo causar diplopia ou ptose com perda visual transitória ou permanente. No exame físico, os achados de nódulos à palpação, hipersensibilidade e/ou ausência de pulsação das artérias temporais e outros vasos envolvidos são característicos, embora infrequentes.

O VHS ou a PCR são elevados em mais de 85% dos casos. Um achado de infiltrado mononuclear pan-mural que pode formar granulomas na biópsia da artéria temporal confirma o diagnóstico. Os critérios diagnósticos para esta condição são mostrados na Tabela 1.

 

Tabela 1: Critérios diagnósticos da arterite temporal

Critério

Definição

Idade de instalação da doença > 50 anos

Desenvolvimento dos sintomas a partir dos 50 anos de idade

Nova cefaleia

Cefaleia recente ou um novo tipo de cefaleia

Anormalidade da artéria temporal

Sensibilidade dolorosa aumentada na artéria temporal à palpação ou diminuição de sua pulsação, não relacionada à arteriosclerose ou à lesão em artérias cervicais

Velocidade de hemossedimentação (VHS) aumentada

VHS > 50 na primeira hora pelo método de Westgren

Anormalidade arterial na biópsia

Biópsia arterial demonstrando vasculite, caracterizada pela predominância de infiltrado de células mononucleares ou formação granulomatosa, geralmente com células gigantes multinucleadas

 

 

A paciente do Caso 3 é provavelmente um quadro de arterite temporal.

 

INVESTIGAÇÃO DAS CEFALEIAS

De forma geral, pacientes com cefaleias recorrentes apresentando características de cefaleias primárias e que tenham exames clínico e neurológico normais não necessitam de investigação complementar. Exceção feita ao paciente com quadro com característica de cefaleia primária, mas refratária ao tratamento adequado, caracterizando mudança do padrão da dor. Também merecem atenção especial os pacientes com cefaleias primárias com características atípicas, tais como aura de enxaqueca prolongada (com mais de 1 hora de duração) e aura atípica (súbita, estritamente unilateral ou associada a déficits motores, alterações de linguagem ou da função de nervos cranianos). O exame mais indicado para investigação varia de acordo com a hipótese considerada. Assim, na suspeita de arterite de células gigantes, a velocidade de hemossedimentação (VHS) pode ser mais importante que a tomografia computadorizada do crânio (TC). Contudo, na maioria das vezes em que a investigação está indicada, é necessário realizar exame de imagem.

Frequentemente, é necessário o exame do líquido cefalorraquidiano (LCR), que deve ser realizado nas seguintes situações:

 

       cefaleia de início súbito com TC de crânio normal (a TC isoladamente não afasta hemorragia meníngea, que é o diagnóstico mais temido neste caso);

       cefaleia acompanhada de sinais de infecção;

       suspeita de sangramento ou de processo inflamatório;

       suspeita de hipertensão ou de hipotensão intracraniana (realizar manometria);

       cefaleia associada a déficits de função de nervos cranianos;

       cefaleia em pacientes com neoplasia ou HIV-positivos sem lesão intracraniana que contraindique a punção.

 

Está indicada investigação complementar nas seguintes situações:

 

1.   A primeira ou a pior cefaleia da vida do paciente ou cefaleia de início súbito.

2.   Cefaleias de início recente: a presença de cefaleia com início há menos de 1 ano, costuma estar associada ao achado de patologias intracranianas. Tumores intracranianos são diagnosticados em cerca de 20% dos pacientes e até 30% dos pacientes com cefaleia de início recente apresentam patologias secundárias.

3.   Cefaleia nova após os 50 anos de idade: a maior parte das cefaleias primárias se caracteriza por crises agudas recorrentes iniciadas na infância ou na adolescência. Com o avançar da idade, embora a incidência de novos casos de cefaleia caia, aumenta o risco relativo de que esta nova cefaleia seja secundária a uma doença intracraniana.

4.   Cefaleia associada a alterações do exame neurológico, rebaixamento do nível de consciência, rigidez de nuca ou febre.

5.   Cefaleia nova em paciente com história de neoplasia, infecção pelo HIV ou coagulopatia.

6.   Cefaleia pós-traumatismo de crânio.

7.   Cefaleias de esforço: embora cefaleia tensional e enxaqueca piorem com o esforço e existam até mesmo cefaleias benignas relacionadas ao esforço (como a cefaleia benigna da tosse e do orgasmo), a ocorrência de cefaleias desencadeadas por esforço está associada a um risco de 15% de achado de patologia secundária.

8.   Cefaleias progressivas ou refratárias ao tratamento.

 

TRATAMENTO DA CRISE AGUDA DE ENXAQUECA

A maioria dos pacientes com enxaqueca que procuram a unidade de emergência está numa crise refratária ou em estado de mal enxaquecoso. Na unidade de emergência, deve-se, de preferência, escolher drogas passíveis de administração parenteral, não só pela rapidez de ação, mas também pela presença frequente de vômitos e náuseas. Também pode haver necessidade de hospitalização para hidratação endovenosa se o paciente estiver muito prostrado, como costuma acontecer no estado de mal enxaquecoso. A seguir, estão relacionados os medicamentos mais comumente utilizados em nosso meio.

 

Antieméticos

O uso de antieméticos é de valor mesmo nas crises sem vômitos, pois melhora a gastroparesia que acompanha a enxaqueca, aumentando a absorção oral dos analgésicos. Podem ser utilizadas a metoclopramida 10 mg EV/IM ou a domperidona 10 mg IM/VO, com características descritas em outros textos.

 

Analgésicos Comuns

Neste caso, a preferência é pela dipirona 500 mg EV, pois muitos pacientes, ao chegarem ao PS, já fizeram uso domiciliar de analgésicos comuns por via oral, como o ácido acetilsalicílico, o paracetamol e a própria dipirona, inclusive em apresentações associadas a ergotamínicos, isometepteno e cafeína, populares em nosso meio.

 

Antiinflamatórios Não Hormonais (AINH)

A maioria dos AINH é efetiva na enxaqueca, pois reduz a inflamação neurogênica perivascular. Na Unidade de Emergência (UE), a preferência pela via parenteral favorece o uso do diclofenaco 75 mg IM, do cetoprofeno 100 mg IM e do piroxicam 40 mg IM. O tenoxicam tem a vantagem de permitir administração tanto EV como IM, na dose de 20 a 40 mg. As contraindicações dos AINH são bem conhecidas, como a úlcera péptica e a insuficiência renal.

 

Corticoides

A dexametasona na dose de 4 a 12 mg EV também é útil na crise aguda da enxaqueca e de uso quase obrigatório no estado de mal enxaquecoso e na cefaleia crônica diária, entretanto, não deve ser administrada isoladamente; em geral, é associada a um analgésico ou AINH e um antiemético ou neuroléptico.

 

Neurolépticos

São úteis em crises muito refratárias e no estado de mal enxaquecoso, particularmente quando há presença de vômitos intensos. Na literatura norte-americana, é muito preconizada a proclorperazina, mas no Brasil, a preferência é pela clorpromazina, que deve ser administrada em dose de 0,1 mg/kg em infusão venosa lenta, diluída em 250 a 500 mL de soro fisiológico. A tolerância costuma ser boa, devendo-se ter cuidado com os efeitos hipotensores e com a sedação. Outra opção que tem sido relatada é o uso do haloperidol em dose de 5 mg EV diluídos com soro fisiológico.

 

Opiáceos

Apesar dos analgésicos narcóticos oferecerem rápido alívio da dor na enxaqueca, seu uso para o tratamento das cefaleias primárias é sujeito a muitas críticas. Pacientes com enxaquecas intensas e frequentes são muito suscetíveis ao abuso de analgésicos e ergóticos, o que pode levar ao grave problema da cefaleia crônica diária, portanto, não nos parece conveniente “facilitar” este processo com a administração de opiáceos. Além disso, na fisiopatogenia das cefaleias primárias, provavelmente existe uma alteração da regulação do sistema supressor de dor e uma disfunção serotoninérgica central; os opiáceos podem acentuar essas alterações. Assim sendo, sua utilização na crise de enxaqueca deverá ser reservada para situações muito especiais, quando outras medidas tiverem falhado ou por intolerância ou contraindicação aos medicamentos citados. Na UE, pode-se utilizar a meperidina 100 mg IM ou EV diluída, o tramadol 50 a 100 mg EV ou IM ou VO, e o butorfanol 1 a 2 mg IM ou 10 mg em spray nasal. Além destes, existem outros opiáceos de uso oral em apresentações isoladas ou em associação com analgésicos comuns, como a codeína, o dextropropoxifeno, a hidrocodona e a oxicodona.

Em pacientes com crises incapacitantes ou mais de 4 a 6 crises por mês, está indicado o tratamento profilático, que pode ser feito com antidepressivos tricíclicos, betabloqueadores, bloqueadores dos canais de cálcio e anticonvulsivantes, como gabapentina e topiramato. Uma discussão aprofundada de profilaxia destas crises será realizada em outra ocasião.

 

SITUAÇÕES ESPECIAIS

Tratamento da Aura Enxaquecosa

A aura enxaquecosa clássica normalmente reverte de 5 a 60 minutos de seu início. Sintomas aurais que persistam além deste tempo são denominados de aura prolongada. Não existe consenso sobre o que deve ser feito nestes casos. É recomendável não utilizar drogas que tenham efeito vasoconstritor, como os ergotamínicos e os triptanos. Alguns autores preconizam o uso de verapamil 5 a 10 mg EV e da nifedipina, mas não existem estudos convincentes a respeito da eficácia destas drogas.

 

Tratamento do Infarto Enxaquecoso

A persistência de déficits neurológicos focais após uma crise de enxaqueca com aura deve ser sempre investigada com neuroimagem, visando à presença de um infarto enxaquecoso. Neste caso, a conduta terapêutica é idêntica à do acidente vascular cerebral isquêmico.

 

Tratamento da Cefaleia Tipo Tensão

Medidas gerais preventivas:

 

       correção de atitudes e posturas viciosas;

       correção de problemas dentários e dos seios da face;

       orientar o paciente a lidar com situações estressantes e conflitos em geral;

       uso de bolsa térmica (calor local);

       programa de relaxamento e exercícios físicos.

 

Tratamento Farmacológico

O tratamento farmacológico do episódio agudo pode incluir: analgésicos comuns (ácido acetilsalicílico 500 a 1.000 mg; acetaminofeno 500 a 750 mg; dipirona 500 a 750 mg), AINH e relaxantes musculares.

No tratamento da cefaleia do tipo tensão crônica, que ocorre na maior parte dos dias da semana, deve-se cuidar para que não ocorra abuso de analgésicos, além de se alertar o paciente quanto ao uso indevido de medicações próprias para enxaqueca, que contêm ergotamínicos ou isometepteno. De modo geral, o uso de opiáceos e barbitúricos deve ser evitado. As formas crônicas são geralmente muito resistentes às medidas terapêuticas. Os analgésicos comuns, além de atuar pouco, são excessivamente utilizados pelos pacientes. O uso de antidepressivos é a medida terapêutica profilática mais eficaz, e assim mesmo só beneficia cerca da metade dos pacientes. Como medicação profilática, pode ser usada a amitriptilina (50 a 100 mg/dia), porém todos os outros antidepressivos tricíclicos também podem ser eficazes, assim como os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS). Muitas vezes, há necessidade de auxílio psicológico ou psiquiátrico para esses pacientes. Métodos terapêuticos alternativos, como acupuntura ou biofeedback, podem auxiliar pequena parcela dos pacientes e, assim mesmo, por tempo limitado, porém é comum o retorno da cefaleia após a interrupção do tratamento.

 

Cefaleia em Salvas

Pela curta duração da crise dolorosa (15 a 180 minutos), não é frequente que os pacientes com cefaleia em salvas procurem a unidade de emergência; a maioria destes geralmente sofre de ataques mais longos que o usual. Os medicamentos usados na crise de cefaleia em salvas apresentam certas particularidades. Analgésicos comuns e opiáceos não funcionam e não devem ser prescritos. São relatados a seguir os métodos utilizados no tratamento abortivo da dor.

 

Tratamento da crise

1.   Medidas gerais: proibição de bebidas alcoólicas, pois o álcool é um fator desencadeador de crises para a grande maioria dos pacientes (71%).

2.   Oxigênio: a inalação de O2 constitui um método simples, inócuo e deve ser considerado sempre como a primeira opção na emergência. Utiliza-se um fluxo de 5 a 7 L/min, de preferência com máscara, e o efeito se deve à forte ação vasoconstritora do oxigênio puro. Os resultados obtidos são excelentes, sendo o tratamento efetivo em mais de 70 a 80% dos ataques. O oxigênio é superior aos ergóticos, além de não ter contraindicações e não induzir complicações. A inalação de O2 é facilitada se o paciente se senta com os cotovelos nos joelhos, mantendo a máscara na face, enquanto inclina a cabeça para frente, de forma que a secreção nasal não bloqueie a passagem do O2.

3.   Ergotamínicos: o tartarato de ergotamina 1 a 2 mg por via sublingual costuma aliviar a dor, embora tenha absorção inconstante. Também pode ser usada 1 ampola por via intramuscular, ou 4 nebulizações de um spray de di-hidroergotamina (DHE). Para alguns pacientes, as crises ocorrem sempre no mesmo horário e, nesses casos, podemos utilizar a ergotamina VO, 1 a 2 horas antes do horário previsto da dor. Quando os ataques ocorrem à noite, a medicação deve ser prescrita na dose de 2 mg ao deitar. O tartarato de ergotamina por via inalatória alivia a dor em 30 minutos em cerca de 71% dos pacientes. Como a crise é curta, prefere-se a DHE 0,5 a 1 mg por via EV, que mostra a mesma eficácia do oxigênio a 100%. Por via IM ou inalatória, a DHE é menos eficiente.

4.   Sumatriptano: como as crises são de curta duração, as formas para uso SC (6 a 12 mg) ou nasal (20 mg) são as que devem ser utilizadas. A resposta clínica tem início em 10 a 20 minutos após injeção SC ou inalação, e em 30 minutos depois do uso por via oral. A meia-vida é em torno de 2 horas. Tem alta eficiência com alívio da dor em 15 minutos em até 96% dos casos. É contraindicado o uso concomitante de sumatriptano e ergotamina. Após a utilização de sumatriptano, a ergotamina só pode ser administrada após intervalo mínimo de 4 horas; após a utilização inicial de ergotamina, o intervalo exigido para administração de sumatriptano é de, no mínimo, 24 horas. Em relação à utilidade dos triptanos no desenvolvimento mais recente na cefaleia em salvas, ainda não se tem uma experiência clínica suficiente. O fato de serem drogas de uso unicamente oral não lhes é favorável. Há relatos recentes demonstrando efetividade do zolmitriptano, com alívio da dor em 30 minutos. O rizatriptano também pode ser promissor, pois tem efeito mais rápido do que os outros triptanos utilizados por via oral.

5.   Lidocaína intranasal: existem relatos de que a instilação tópica intranasal de lidocaína a 4% pode ser efetiva na crise de cefaleia em salvas, mas outros trabalhos não confirmam tais dados. O efeito seria devido ao bloqueio anestésico do gânglio esfenopalatino, o que reduziria a realimentação aferente sobre o sistema trigêmino-vascular. A instilação é feita com 1 mL da solução na narina ipsilateral à dor, com o paciente em posição supina com a cabeça inclinada 30° para trás e girada para o lado da dor. O procedimento pode ser repetido mais uma vez após 15 minutos.

6.   Outros: alguns autores sugerem o uso de corticoides (dexametasona ou metilprednisolona) por via EV na crise aguda. Bloqueios do nervo grande occipital com lidocaína também podem abortar algumas crises. Existem trabalhos mostrando melhora da dor com a instilação intranasal de solução de capsaicina, mas são dados isolados.

 

Tratamento Profilático

O tratamento para interrupção do surto também é difícil. Podem ser utilizados derivados do ergot (especialmente a metisergida), corticoides, bloqueadores de canais de cálcio (verapamil), ácido valproico e topiramato. Estes medicamentos são eficazes nos primeiros surtos, porém, com o tempo, as crises ficam cada vez mais resistentes a todas as formas de tratamento. Nas chamadas formas crônicas (sem períodos de acalmia), preconiza-se o uso de carbonato de lítio com resultados satisfatórios, pelo menos nos primeiros meses de tratamento. Também podem ser úteis o ácido valproico, a mirtazapina e o topiramato.

 

Arterite Temporal

O tratamento é realizado com corticoides e, geralmente, é utilizada a prednisona em doses diárias iniciais de 1 mg/kg de peso, dose que, depois, é progressivamente reduzida até uma dose de manutenção de até 10 mg/dia. A melhora costuma ser dramática, com desaparecimento da dor nas primeiras 48 horas de tratamento. As medidas da VHS, juntamente com o quadro clínico, servem de controle para a redução da dose dos corticoides. Na maioria dos casos, a corticoterapia precoce previne comprometimento visual. Nos casos graves, já com perda da acuidade visual, podem ser tentados “pulsos” de corticoides (metilprednisolona por via EV, da dose de 1 g/dia, por 3 dias) ou mesmo “pulsos” de imunossupressores, como a ciclofosfamida (1 g/dia, por via EV, por 1 dia).

 

MEDICAÇÕES ESPECÍFICAS

Ergotamínicos

Apresentam efeito direto de vasoconstrição cerebral e efeito em receptores serotoninérgicos.

 

Indicações

Tratamento da enxaqueca; apesar da sua eficiência, seu uso indiscriminado tem sido criticado.

 

Posologia e Modo de Uso

Na UE, pode ser utilizado o tartarato de ergotamina 1 a 2 mg VR ou SL, e o mesilato de di-hidroergotamina em spray nasal (cada puff tem 0,5 mg). Não dispomos no Brasil da di-hidroergotamina injetável (DHE), muito preconizada na literatura norte-americana em aplicações de 0,5 a 1 mg EV, podendo ser repetida em 1 hora. Como o efeito nauseoso é intenso, sempre há necessidade da associação de um antiemético (metoclopramida ou proclorperazina) e, às vezes, dexametasona. A dose total de ergotamínicos não deve exceder 10 a 12 mg/semana, pelo risco de desenvolvimento de ergotismo.

 

Efeitos Adversos

Tonturas, sonolência e flushing são relatados com certa frequência. Pode causar cianose periférica, vasoespasmo coronariano e crises hipertensivas. Estão contraindicados em pacientes com doença vascular periférica, doença coronariana, insuficiência hepática ou renal, hipertensão arterial grave, gravidez, hipertireoidismo e porfiria.

 

Apresentações Comerciais

Dihydergot: embalagens com ampolas de 1 mL para uso como spray nasal.

Várias apresentações por via oral: Ormigrein (1 mg de ergotamina), Tonopan (0,5 mg de ergotamina), Cefaliv (1 mg de ergotamina), Cefalium (1 mg de ergotamina), Parcel (1 mg de ergotamina), todos em associações com outras medicações.

Enxak: comprimidos de 2 mg de ergotamina sem associações.

 

 Monitoração

Sem indicação específica de monitoração.

 

Classificação na Gestação

Classe X.

 

Interações Medicamentosas

Várias interações são descritas. Os antifúngicos e os macrolídios podem aumentar sua toxicidade e neuroléticos podem diminuir seus efeitos. Os betabloqueadores podem aumentar o efeito vasoconstritor.

 

Triptanos

Modo de Ação

Atuam como agonistas seletivos dos receptores serotoninérgicos 5-HT1B e 5-HT1D do sistema trigêmino-vascular. Os triptanos apresentam uma série de vantagens sobre os ergotamínicos, pois estes se ligam indiscriminadamente a todos subtipos de receptores serotoninérgicos, além de receptores dopaminérgicos, adrenérgicos e noradrenérgicos, o que favorece o aparecimento de efeitos adversos.

 

Indicações

Drogas para tratamento específico da enxaqueca.

 

Posologia e Modo de Uso

Apenas o sumatriptano pode ser usado por via parenteral, o que pode limitar o uso dos outros triptanos em pacientes com vômitos intensos.

A seguir, estão delineados os esquemas de tratamento, lembrando que os triptanos não devem ser administrados com ergotamínicos no mesmo dia, nunca devem ser usados concomitantemente com inibidores da MAO (pelo risco do desenvolvimento de síndrome serotoninérgica) e que a associação com AINH parece reduzir a recorrência da cefaleia:

 

       sumatriptano: 6 a 12 mg/dia SC ou 50 a 200 mg/dia VO ou spray nasal 20 a 40 mg/dia;

       zolmitiptano: 2,5 a 5 mg/dia VO;

       rizatriptano: 5 a 10 mg/dia VO (também tem apresentação waffer);

       naratriptano: 2,5 a 5 mg/dia VO;

       eletriptano (ainda não disponível no mercado): 40 a 80 mg/dia VO.

 

Efeitos Adversos

Os efeitos adversos dos triptanos são leves e transitórios, como vertigens, tonturas, sensação de calor e de fraqueza, náuseas, vômitos, dispneia e aperto no peito. As contraindicações principais são as doenças coronarianas, a insuficiência vascular periférica e a hipertensão arterial grave. O sumatriptano apresenta efeitos colaterais mais intensos; em algumas séries, até 40% dos pacientes relatam algum tipo de desconforto precordial.

 

Apresentações Comerciais

       Maxalt (rizatriptano): comprimidos de 5 e 10 mg.

       Naramig (naratriptano): comprimidos de 2,5 e 5 mg.

       Zomig (zolmitriptano): comprimidos de 2,5 mg.

       Imigran (sumatriptano) em seringas para uso EV com 6 mg de sumatriptano ou em comprimidos de 100 mg.

       Sumax (sumatriptano) em seringas para uso EV com 6 mg de sumatriptano ou em comprimidos de 100 mg.

 

Monitoração

Sem indicações específicas de monitoração.

 

Classificação na Gestação

Classe C.

 

Interações Medicamentosas

O uso junto com ergotamínicos aumenta efeito vasoconstritor.

 

Comentários

Por: Atendimento MedicinaNET em 10/02/2017 às 16:20:55

"Olá, Dr. Marcelo, O tempo de uso de O2 é até o alívio da cefaleia, usualmente isto ocorre em menos de 15 minutos. Um tempo razoável de uso é de 15 a 30 minutos, o uso pode ser feito mesmo com secreções nasais e estas não influenciam a resposta ao O2. Atenciosamente, os Editores."

Por: Marcelo Augusto Antonio em 09/02/2017 às 09:49:59

"Caro Rodrigo, parabéns pelo resumo. Não tenho costume de usar O2... Quanto tempo em média? Quantos litros/min se paciente com DPOC? Caso o paciente sem obstrução ou secreção nasais, precisaria assumir esta posição sugerida? Um abraço, Marcelo A Antonio"

Por: Pedro Henrique Favero Cetolin em 15/01/2016 às 16:21:42

"Ótimo!"

Por: Wanderlei Gonçalves em 13/04/2012 às 00:10:09

"Excelente artigo."

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