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Caso Clínico – Infiltrado pulmonar e síndrome consumptiva

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 26/11/2014

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Especialidades: Pneumologia/Infectologia/Medicina de Emergência

 

Quadro Clínico

        Paciente do sexo masculino, 49 anos, sem relato de antecedentes clínicos, é trazido por familiares ao pronto-socorro por quadro de tosse e dispneia intensa, que se iniciaram há três semanas e vieram em piora. Relatam ter passado em outro local de atendimento há dez dias tendo sido orientados a dar amoxicilina ao paciente, porém não houve qualquer melhora do quadro. Como plano de fundo, relatam uma perda ponderal de 25kg no último ano, sem outras queixas.

        Ao exame físico na chegada estava em Glasgow 15, FC 118bpm, PA 100x68mmHg, FR 20cpm, SatO2 91% em ar ambiente, febril com temperatura de 38oC, acianótico, enchimento capilar normal, ausculta cardíaca sem alterações, ausculta pulmonar apresentando roncos e estertores difusamente no hemitórax esquerdo, exame abdominal sem alterações e membros inferiores sem achados.

 

Exames coletados na chegada:

-Ureia: 90mg/dL; Cr: 1,32mg/dL;

-Na: 125mEq/L; K: 4,0 mEq/L; Mg: 2,0mg/dL; Cálcio iônico: 4,18mg/dL

-Glicose: 109mg/dL

-Albumina: 2,2g/dL;

-Hemoglobina: 8,9 g/dL; Ht: 27,7%; VCM: 79,5; HCM: 26,5

-Leucócitos: 3.480 (3150 neutrófilos, 220 linfócitos);

-Plaquetas: 281 mil.

 

Foi realizada radiografia de tórax, mostrada a seguir:

 

Imagem 1. Radiografia de Tórax PA

 

 

Diagnóstico e Discussão

        Devido ao fato de terem evidenciado um infiltrado bilateral mais intenso à esquerda, haver uma síndrome consumptiva e um quadro clínico subagudo em termos de evolução, foram levantadas as hipóteses de tuberculose, pneumocistose e pneumonia de comunidade de forma superajuntada. Foi prontamente iniciado esquema para pneumonia adquirida em comunidade com ceftriaxone e claritromicina, iniciado também sulfametoxazol/trimetoprim, este pensando na cobertura de pneumocistose. Foram acrescentados então alguns exames para avaliação, incluindo PBARR, sorologia para HIV, lavado broncoalveolar e uma tomografia de tórax. Os resultados foram os seguintes, descritos abaixo, e na Imagem 2.

 

-Pesquisa de Bacilo Álcool-Ácido Resistente no escarro: ++++ (fortemente positivo)

-Pesquisa de anticorpo contra HIV: reagente.

-Lavado broncoalveolar: apenas PBAAR +, demais pesquisas (para pneumocistose, fungos e bactérias, todas negativas).

 

Imagem 2. Tomografia de tórax

 

 

Achados da Tomografia:

-Múltiplas opacidades em vidro fosco associada a áreas de consolidação, bronquiectasias e cavitações, mais evidentes no lobo superior e segmento superior do lobo inferior esquerdo. Opacidades centrolobulares com aspecto de "árvore em brotamento" no lobo médio direito. O conjunto dos achados admite como principal hipótese a de infecção de origem microbacteriana com achados sequelares e em atividade.

-Restante do parênquima pulmonar com atenuação habitual.

-Traqueia e brônquios principais patentes, de calibres normais, com secreção em seu interior.

-Estruturas vasculares mediastinais com calibre externo conservado.

-Não se observam linfonodomegalias mediastinais.

 

        Foi então fechada hipótese diagnóstica de tuberculose pulmonar disseminada em paciente HIV positivo, sendo iniciado esquema RIPE prontamente.

 

Quando estamos tratando uma tuberculose em paciente HIV+, temos de levar em conta algumas coisas:

-A seleção de regimes antituberculose (TB) de tratamento em adultos infectados pelo HIV seguem a mesma abordagem geral como para adultos sem infecção pelo HIV.

-A rifampicina tem interações medicamentosas clinicamente significativas com a maioria dos medicamentos da terapia antirretroviral (TARV). Para os pacientes infectados pelo HIV que estão recebendo um regime antituberculose que inclui rifampicina, sugerimos um regime de TARV consistindo de efavirenz mais dois análogos de nucleosídeos, em vez de nevirapina mais dois análogos de nucleosídeos (Grau 2B). Em locais onde o efavirenz não é disponível ou em uma situação onde o seu custo é proibitivo, a nevirapina é uma alternativa aceitável.

-Pacientes infectados pelo HIV com tuberculose estão em risco para a “Síndrome Inflamatória da Reconstituição Imunológica" (SIRI) depois de iniciar a terapia antiretroviral. Esta síndrome descreve um agravamento paradoxal de um processo infeccioso pré-existente após a recuperação imune associada à TARV. A SIRI é geralmente autolimitada, embora possa ocorrer morbidade e mortalidade significativas. O risco de SIRI é maior em contagens de CD4 mais baixas e com início precoce da TARV, mas esse risco é compensado por melhores resultados gerais. O momento ótimo para integrar as duas terapias depende do nível de imunossupressão, como medido por contagem de células CD4. Entre os pacientes com <50 células/mm3, a introdução de TARV “precoce” (ou seja, depois de duas semanas após a terapia anti-TB) está associada a uma diminuição do risco de doença ou morte relacionada com a SIDA comparado com introdução de TARV “tardia” (ou seja, depois de 8 a 12 semanas de terapia anti-TB).

-Recomendamos que todos os pacientes infectados pelo HIV com diagnóstico de TB ativa sejam tratados com TARV (Grau 1A). No doente infectado pelo VIH com uma contagem de células CD4 <50 células/mm3, recomendamos que a TARV seja iniciada dentro de duas semanas após o início da terapia anti-TB ao invés de introdução tardia (por exemplo, de 8 a 12 semanas) (Grau 1A). No doente infectado pelo HIV com uma contagem de células CD4 = 50 células/mm3 e doença clínica grave, sugerimos o início da TARV dentro de duas a quatro semanas (Grau 2A). No doente infectado pelo HIV com uma contagem de células CD4 = 50 células/mm3 na ausência de doença clínica grave, sugerimos o início da TARV dentro de 8 a 12 semanas (Grau 2A).

-A terapia para TB deve ser iniciada o mais cedo possível no paciente que já está tomando TARV.

 

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