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Discussão sobre Segurança do Paciente no currículo das faculdades de medicina

Última revisão: 03/05/2010

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Discussão sobre Segurança do Paciente no currículo das faculdades de medicina

 

© 2010 New York Times – Link para o artigo

 

Link para os cursos online gratuitos citados na reportagem - Institute of Healthcare Improvement

 

Daniel Blumenthal e Ishani Ganguli – Tradução Lucas Santos Zambon

 

Estudantes do quarto ano da Faculdade de Medicina de Harvard

 

Dois verões atrás, quando éramos entusiasmados estudantes de medicina do terceiro ano, corríamos para clínicas e salas de cirurgia, ansiosos para finalmente aplicar nosso conhecimento teórico na prática diária com os pacientes. Para nossos olhos pouco treinados, o sistema no qual deveríamos empregar esse conhecimento era muitas vezes confuso, com seus rituais pouco familiares de notas rabiscadas e rondas matinais.

 

E era ainda mais confuso quando as coisas não iam de acordo com o planejado: se um paciente piorasse inesperadamente, a causa era natural ou erro médico? Desde a publicação do conhecido relatório do  Institute of Medicine, em 1999 (“Errar é Humano”), estimando que erros na assistência matam cerca de 98 mil pessoas todos os anos, o tema se tornou parte de um debate nacional. Mais recentemente, um estudo publicado no The New England Journal of Medicine e um livro, "The Checklist Manifesto", do Dr. Atul Gawande (Professor em Harvard), atestam a eficácia de checklists para cirurgias e a importância de incentivar todos os membros da equipe cirúrgica a se pronunciar sobre potenciais fontes de erro.

 

No entanto, até agora a conversa tem sido lenta em chegar até as faculdades de medicina. Uma pesquisa de 2008 realizada pelo Liaison Committee on Medical Education, que credencia faculdades de medicina americanas, relatou que dois terços dessas faculdades mencionaram segurança do paciente num curso exigido, com média de duas sessões sobre o tema. Entretanto, outra pesquisa, com 391 estudantes de medicina, realizada pela organização sem fins lucrativos Institute for Healthcare Improvement, descobriu que quatro em cada cinco estudantes achavam que sua exposição ao tema da Segurança do Paciente e Melhoria da Qualidade tinha sido regular, no melhor dos casos. E o Dr. David Davis, diretor sênior de Educação Continuada da Associação das Faculdades de Medicina Americanas, disse que ainda havia "algum debate" sobre como e quando ensinar sobre esse tema.

 

Por que as faculdades de medicina não agiram mais rapidamente? Primeiramente, a educação médica tem um amplo material para ser coberto. O Dr. Donald M. Berwick, presidente do Institute for Healthcare Improvement, afirmou que a idéia de que as faculdades "deveriam desistir do ciclo Krebs ou do transporte da membrana" - conceitos básicos de bioquímica - para focar na segurança do paciente era difícil de ser assimilada. Além disso, os médicos tendem a dar muito mais valor a suas próprias habilidades clínicas do que a comunicação e verificação com seus pares. Embora "a medicina tradicionalmente tenha valorizado a excelência em medicar ou operar bem", disse Berwick, a maioria dos erros provavelmente "reside nas interações e delegação de tarefas" de um médico para outro.

 

Em 2003, reitores de dez faculdades de medicina, incluindo Dartmouth, a Universidade de Minnesota e a Universidade de Illinois, formaram um grupo de colaboração para fomentar a comunicação entre as disciplinas. Cada faculdade faz experimentos com estratégias de ensino e depois divide os resultados com o grupo. Em Dartmouth, por exemplo, estudantes participam de sessões de relatos de experiências com equipes de profissionais médicos treinados para atuar em Equipes de Resposta Rápida. Cursos em outras faculdades convidaram pais de crianças lesionadas ou mortas como resultado de erros para conversar com os alunos sobre suas experiências, trazendo o lado humano do problema. Num novo curso de três semanas sobre segurança do paciente, estudantes do quarto ano da Universidade da Pensilvânia passam um tempo na Wharton School, da mesma universidade. Entre outras coisas, eles aprendem como o modelo de confiabilidade do produto da Toyota pode ser aplicado a assistência medica. "A última parte é a análise econômica", disse o Dr.Richard Shannon, diretor do departamento de medicina do sistema de saúde da Universidade. "O que isso significa? Quanto custam, em dólares, as infecções hospitalares?" Em sessões como essa os alunos podem aprender como erros médicos são definidos e como distinguir um erro médico de um resultado negativo, afirmou a Dra.Melissa A. Fischer, professora assistente de medicina da Faculdade de Medicina da Universidade de Massachusetts. Como ela mesma enfatiza aos alunos, "coisas ruins podem acontecer até mesmo quando se faz tudo certo".

 

 Pelo fato de que a mudança no currículo tem sido lenta a nível nacional, organizações como o Institute for Healthcare Improvement estão adotando outra abordagem: chegando até os alunos dispostos a lidar com essas questões. A nova Escola Aberta para Profissionais de Saúde do instituto é um centro de cursos online gratuitos, estudos de caso e fóruns de discussão sobre erros e outros temas relacionados à melhoria da qualidade. A escola foi aberta em outubro de 2008 e já registrou mais de 20 mil alunos, com mais de 173 escolas e hospitais em 41 estados e 24 países, segundo o diretor Jill Duncan. O desafio é traduzir a discussão aberta entre estudantes de medicina, enfermagem e farmácia em fóruns online em discussões no ambiente físico hospitalar e, por sua vez, em mudanças no dia a dia da qualidade da assistência médica.

 

Estudos sugeriram uma comunicação insatisfatória em casos de erros médicos - especialmente entre médicos de diferentes posições - e demonstraram o papel da comunicação aberta para melhorar o resultado de pacientes. Como observadores da dinâmica entre especialidades nos hospitais, os estudantes de medicina estão numa posição excelente para realizar mudanças, simplesmente ao se pronunciarem.No entanto, especialistas em segurança do paciente questionam se médicos, particularmente aqueles em campos hierarquizados como na cirurgia, estão realmente preparados para ouvir - especialmente, segundo Berwick, ouvir da boca dos estudantes de medicina, que correm o risco de serem rotulados como "problemáticos" ou "ingênuos". Esses fatores sugerem uma necessidade crescente de mudança de mentalidade, que dissolva a confidencialidade envolvendo erros médicos e permita que quem está em formação e médicos veteranos conversem abertamente sobre seus erros e os dos colegas. A segurança psicológica desse cenário livre de culpas pode ser realmente escassa em instituições de muito poder. Uma pesquisa com estudantes do terceiro ano revelou que a maioria de nós já testemunhou erros cometidos por superiores ou colegas, ou já cometemos erros nós mesmos - e demonstramos nossa ignorância sobre o que fazer.

 

Os limitados trabalhos em classe de Harvard sobre o tema não são, de maneira alguma, algo único nas faculdades de medicina. Porém, como viemos a concluir, a doutrina de evitar erros médicos deve ser aprendida e fiscalizada em tempo real. Então, nos corredores do hospital fizemos nosso melhor para desenvolver bons hábitos: verificar novamente planilhas de medicamentos para garantir que um paciente esteja recebendo os tratamentos solicitados, ou percorrer o caminho da sala de plantão para a estação de enfermagem às 4h da manha para confirmar que o paciente estava mesmo agendado para o exame de tomografia computadorizada de manhã cedinho.

 

Foi necessário um pouco de humildade para perguntar o que pareciam ser as perguntas óbvias, e confiança para abordar médicos veteranos com nossa própria pesquisa na literatura sobre a melhor forma de gerenciar a hipertensão incontrolável de um paciente. A esperança é que, ao refletirmos sobre esses assuntos, e ao entendermos as vantagens e desvantagens das práticas atuais, possamos nos tornar médicos melhores.

 

"Qual o objetivo da faculdade de medicina? E qual e o produto que temos em mente? E quem deve responder isso?", perguntou o Dr. Lucian Leape, pesquisador de segurança do paciente da Faculdade de Saúde Publica de Harvard. "Quando vou ao médico, devo ir a uma pessoa que eu sei que é competente, que eu sei que posso confiar e que colocará meu interesse em primeiro lugar. Dois desses três aspectos não têm nada a ver com ciência".

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