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Cólica Nefrética

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 05/09/2014

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        Cálculos urinários são cada vez mais prevalentes, com um risco de desenvolver doença sintomática durante a vida de 12% em homens e 6% em mulheres, com uma taxa de recorrência de cerca de 50%. A idade em que usualmente ocorre um primeiro episódio de cólica nefrética é a partir dos 20 anos de idade com pico de incidência por volta de 40-60 anos, com uma incidência de três casos a cada 1000 pessoas ao ano.

A cólica nefrética é mais frequente em homens com 1,7 casos para cada caso em mulher, mas  estatísticas recentes mostram que esta relação está diminuindo. A incidência é maior em climas mais quentes e durante os meses do verão.

 

Fisiopatologia

        Os cálculos urinários são formados pela agregação de cristais com uma proteína não-cristalina. Estes cristais se agregam para formar um cálculo, sendo que quando  atingem um determinado, estes cálculos podem migrar pelo ureter causando dor e cólica durante o trajeto.

        Oitenta por cento dos cálculos contêm cálcio, a maioria geralmente sob a forma de oxalato de cálcio (60%). O fosfato de cálcio, por sua vez é responsável por cerca de 20% dos cálculos urinários. Cálculos de ácido úrico correspondem a cerca de 7% dos cálculos e outros 7% são secundários a quadro infeccioso e formados por fosfato de magnésio amoniano.

 

Fatores de risco

        A obesidade é um fator de risco independente para desenvolvimento de cálculos renais, história familiar aumenta em pelo menos duas vezes o risco de desenvolvimento de cálculos renais.

        Fatores dietéticos e desidratação são fatores importantes também para o desenvolvimento de cálculos renais sintomáticos. Alterações anatômicas do trato urinário como o rim em ferradura implica em risco aumentado de calculose renal. Outros distúrbios médicos como hiperparatiroidismo primário, acidose tubular renal, doenças reumáticas entre outras implicam em maior risco para formação  de cálculos.  Sabe-se que pacientes hipertensos e que ingerem pouco liquido têm risco aumentado de desenvolver cólica nefrética.

        Em pacientes que desenvolvem um quadro de cólica renal há risco de 30-40% de desenvolver um novo quadro de cólica nefrética em cinco anos após o primeiro episódio.

 

Apresentação clínica

        A cólica nefrética ocorre devido à obstrução do ureter, pelo cálculo, portanto o termo cólica ureteral seria um termo mais adequado. A dor é causada pelo espasmo do ureter, ocorre ainda obstrução e distensão do ureter e cápsula renal. Outra causa comum de dor similar da mesma etiologia é a obstrução por coágulos sanguíneos.

        A apresentação clínica é na forma de uma dor aguda, em cólica localizada em região lombar abaixo da décima segunda costela, com irradiação para virilha ou gônadas genitais. Náuseas e vômitos são ocorrência comum associada nestes pacientes. Os episódios de dor são intensos, mas apresentam períodos de acalmia em que o paciente pode encontrar-se completamente sem dor.

        Sintomas de peritonismo são ausentes, quando o cálculo se aproxima da junção ureterovesical o paciente pode apresentar disúria e urgência urinária mimetizando cistite bacteriana.

        Ao exame físico o paciente apresenta-se ansioso, com dificuldade em achar posição confortável, pode ainda ocorrer hipersensibilidade a percussão lombar ou sinal de Giordano positivo. Hematúria macroscópica ou microscópica ocorre em 90% dos casos, assim a ausência de hematúria não exclui o diagnóstico de cólica nefrética. Em homens é interessante avaliar testículos, pois patologias escrotais podem cursar com dor abdominal e mimetizar cólica nefrética.

 

Diagnóstico

        O exame ideal para conformação diagnóstica é a tomografia computadorizada (TC) helicoidal sem contraste, com sensibilidade de 96% comparado a 87% da urografia excretora, com especificidade  de aproximadamente  100%. O exame apresenta ainda valor preditivo positivo de 100% e valor preditivo negativo de 91%.

        Quando o diagnóstico de cálculo é obtido pela TC é recomendada a realização de radiografia simples de abdome, pois o cálculo é radiopaco em 75 a 90% dos casos.

        A ultrassonografia é um exame de alta especificidade acima de 90%, mas com sensibilidade bem inferior a da tomografia, que pode ser utilizada na ausência desta, podendo observar dilatação ureteral e pielocalicial, que pode assim identificar os pacientes com indicação de intervenção urgente. A urografia excretora, embora útil, foi substituída pela TC como exame de escolha e a ressonância Magnética é raramente necessária nestes pacientes, exceto na circunstância da avaliação de gestantes com contraindicação à TC.

        Os exames de imagem têm importância ainda em revelar local da obstrução urinária ou local do cálculo. Anatomicamente, as três partes mais estreitas do ureter são na junção pieloureteral, região medial do ureter quando este cruza os vasos ilíacos, sendo o local mais comum de apresentação à junção vesico-ureteral responsável por mais de 60% dos cálculos ureterais.

        A realização de exame de urina 1 em todos os pacientes é recomendada por alguns autores, mas não sem controvérsia. A presença de bactérias, leucocitúria e nitritos sugerem infecção associada e, neste caso, a realização de urocultura também é indicada.

        Outros exames a serem considerados incluem  pacientes com suspeita de infecção. A  realização de hemograma completo e a função renal devem ser solicitadas em todos pacientes em risco de disfunção renal aguda ou com indicação de internação.

        Em pacientes com eliminação espontânea do cálculo renal, análise bioquímica pode ser benéfica, pois identifica a sua composição  e indica possíveis intervenções a serem realizadas, tratando-se do melhor exame para definir a etiologia da litíase urinária, mas uma discussão maior sobre a etiologia e intervenções nas diferentes etiologias dos cálculos urinários foge aos propósitos desta revisão.

 

Manejo

       Em pacientes com obstrução urinária total ou infectada, piora da função renal tem necessidade de intervenção precoce para desobstrução, neste caso nefrostomia pode ser necessária. Infecção associada é suspeita quando o paciente apresenta febre, leucocitúria significativa e leucocitose. O patógeno mais comum é a Escherichia coli e a cobertura apropriada deve ser realizada com quinolonas ou cefalosporinas de terceira geração. Cálculos infecciosos de estruvita tendem a obstruir o sistema urinário e é improvável que passem pelo ureter e podem necessitar de intervenção.

        O manejo da dor era realizado tradicionalmente com opioides, mas os anti-inflamatórios não-esteroidais e inibidores da cicloxigenase-2 (COX-2) são capazes de realizar analgesia por bloquear a vasodilatação arteriolar aferente e reduzindo a diurese, edema e estimulação ureteral, além de causar menos náuseas e vômitos que os opioides. As doses típicas de cetorolaco ou diclofenaco para alívio da dor em cólica nefrética representam risco baixo de disfunção renal. Os opioides são hoje uma segunda linha terapêutica para oferecer a estes pacientes a melhor analgesia inicial, com opiáceos como um tratamento de segunda linha. Muitas vezes, os pacientes são aconselhados a aumentar a ingestão oral de fluidos para acelerar a passagem do cálculo, ou é realizada hidratação parenteral para este fim, mas não existe evidência de literatura que dê suporte a esta conduta. O uso de cobertores elétricos ou acupuntura foi estudado para este propósito nestes pacientes, mas a evidência de benefício é limitada.

        Apesar do uso indiscriminado em nossos serviços de emergência, o uso de drogas antiespasmódicas, como a hioscina tem benefício limitado nestas circunstâncias.

        Uma alternativa para manejo da cólica renal é o uso da desmopressina, relatado em algumas séries, mas a evidência para esta abordagem é limitada para recomendações.

        Quando intervenções de urgência são desnecessárias, deve-se avaliar a probabilidade da eliminação espontânea do cálculo, usualmente a maioria dos cálculos tem menos de 5 mm e podem sair espontaneamente, cálculos com mais de 6 mm tem grande possibilidade da necessidade de intervenção.

        Em pacientes cujos sintomas foram agudamente controlados, e que mantêm quadro doloroso em controle apropriado ambulatória e com cálculos menores que 10 mm podem ser observados periodicamente, segundo as diretrizes americanas, como tratamento inicial, a ausência de eliminação em quatro semanas usualmente é indicação de intervenção cirúrgica.

        Opções para casos em que sejam necessárias a intervenção para retirada de cálculo incluem ureteroscopia e litotripsia extracorpórea por ondas de choque. Estudos comparativos sugerem que os resultados superiores são obtidos com a ureteroscopia.

        O uso de terapia medicamentosa para facilitar a saída dos cálculos urinários tem sido mais discutida, sua base principal é o relaxamento do músculo liso seja por bloqueio do receptor a1 ou bloqueadores de canais de cálcio. O uso destes medicamentos aumenta em até 65% a probabilidade de eliminação espontânea do cálculo, uma meta-análise estimou a necessidade de tratar quatro pacientes para aumentar um caso de eliminação espontânea do cálculo. A tansolusina (0,4 mg uma vez ao dia) é a medicação mais utilizada para este propósito e apresenta benefício maior para cálculos entre 5 e 10 mm de diâmetro.

        Após controle da dor no serviço de emergência, os pacientes costumam ser liberados para casa para realizar tratamento ambulatorial, neste caso os pacientes devem ser orientados quanto à possibilidade de retorno da dor e prescrição de analgesia usualmente com anti-inflamatórios não esteroidais, ainda assim é rara reinternação destes pacientes.

 

Indicações de internação

        A incapacidade de controlar a dor é uma indicação formal de internação hospitalar, pacientes com febre associada e sinais de sepse urinária também têm indicação de internação hospitalar. Em pacientes com infecção e obstrução associada devem ser considerados como emergência e tem indicação de intervenção imediata.

        Pacientes com cálculos acima de 6 mm mesmo com controle adequado da dor, têm usualmente indicação de intervenção para retirada de cálculo, assim ao dar altas para estes pacientes é necessário garantir o encaminhamento precoce para o urologista.

 

 

Diagnóstico diferencial

        Outras causas de dor lombar devem ser consideradas, em particular aneurisma de aorta abdominal deve ser considerado em pacientes com mais de 60 anos de idade principalmente se apresentam vasculopatia associada. Pielonefrite pode causar quadro doloroso semelhante usualmente associado com quadro febril associado e é um diagnóstico diferencial e complicação possível de litíase ureteral. Outros diagnósticos a serem considerados em mulheres é a torção de cisto ovariano e dismenorreia.

 

 

Referências

1-Bultitude M, Rees J. Management of renal colic. BMJ 2012; 345:e5499.

2-Teichman JMH. Acute renal colic from ureteral calculus. NEJM 2004; 350: 684-693.

3-Curhan G ET AL. Diagnosis and acute management of suspected nephrolithiasis in adults. Disponível em WWW.uptodate.com acessado e 29 de junho de 2014.

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