Autor:
Lucas Santos Zambon
Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.
Última revisão: 09/09/2022
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A infecçãopelo vírus zika (ZIKV) é transmitida por mosquitos Aedes aegypti. Durantea gravidez, a infecção pode ser transmitida através da placenta para o feto emdesenvolvimento, com potenciais efeitos teratogênicos, incluindo anomaliasgraves do sistema nervoso central. A maioria dos fetos com exposição pré-natalao ZIKV não apresenta anomalias clínicas detectáveis. Entretanto, alguns fetos infectadoscongenitamente podem ter resultados adversos leves, moderados ou graves, queclinicamente podem ser reconhecidos como a síndrome congênita do zika. Essa síndromepode levar a diversas manifestações, como atrofia cortical com microcefalia,disfagia e epilepsia, todas podendo se manifestar ao nascimento ou no início davida.
Um ponto dedestaque é que a gravidade da síndrome parece associada à exposição ao ZIKV noprimeiro trimestre, e um importante fator prognóstico é a gravidade damicrocefalia. Evidências preliminares indicam que crianças afetadas podem tertaxa de letalidade de 10% nos primeiros anos de vida. No entanto, o riscorelativo de morte entre crianças nascidas vivas com síndrome congênita do zika,em comparação com aquelas sem a síndrome, e o papel de importantes preditoresde mortalidade infantil, como idade gestacional ao nascer e peso ao nascer,permanecem obscuros.
Apresentamosum estudo de coorte retrospectivo de base populacional que incluiu dados detodos os nascidos vivos únicos no Brasil de 1º de janeiro de 2015 a 31 dedezembro de 2018. Esses nascidos vivos foram acompanhados desde o nascimentoaté a idade de 36 meses (3 anos), falecimento ou 31 de dezembro de 2018, o queocorresse primeiro.
Neste estudode coorte de base populacional, foram usados dados coletados rotineiramente noBrasil, de janeiro de 2015 a dezembro de 2018, para estimar a mortalidade entrenascidos vivos com síndrome congênita do zika em comparação com aqueles sem asíndrome. As curvas de Kaplan-Meier e os modelos de sobrevida foram avaliadoscom ajuste para confundimento e com estratificação de acordo com idadegestacional, peso ao nascer e status de pequeno para idade gestacional.
Um total de11.481.215 crianças nascidas vivas foram acompanhadas até os 36 meses de idade.A taxa de mortalidade foi de 52,6 óbitos (IC 95%, 47,6 a 58,0) por 1.000pessoas-ano entre os nascidos vivos com síndrome congênita do zika, emcomparação com 5,6 óbitos (IC 95%, 5,6 a 5,7) por 1.000 pessoas-ano entreaqueles sem a síndrome. A taxa de mortalidade entre os nascidos vivos comsíndrome congênita do zika, em comparação com aqueles sem a síndrome, foi de11,3 (IC 95%, 10,2 a 12,4). Entre os bebês nascidos antes de 32 semanas degestação ou com peso ao nascer inferior a 1.500 g, os riscos de morte foramsemelhantes, independentemente do status da síndrome congênita do zika.Entre os bebês nascidos a termo, aqueles com síndrome congênita do zika tiveram14,3 vezes (IC 95%, 12,4 a 16,4) mais chances de morrer do que aqueles sem asíndrome (taxa de mortalidade, 38,4 vs. 2,7 mortes por 1.000 pessoas-ano).Entre os bebês com peso ao nascer de 2.500 g ou mais, aqueles com síndromecongênita do zika foram 12,9 vezes (IC 95%, 10,9 a 15,3) mais propensos amorrer do que aqueles sem a síndrome (taxa de mortalidade, 32,6 vs. 2,5 mortespor 1.000 pessoas-ano). A carga de anomalias congênitas, doenças do sistemanervoso e doenças infecciosas como causas registradas de mortes foi maior entreos nascidos vivos com síndrome congênita do zika do que entre aqueles sem asíndrome.
Neste estudo conduzido em nosso país,fica claro o maior risco de morte entreos nascidos vivos com síndrome congênita do zika do que entre aqueles sem asíndrome, e o risco persistiu ao longo dos primeiros 3 anos de vida. Essesachados chamam a atenção para a importância da prevenção primária da infecção emmulheres em idade fértil contra picadas de Aedes aegypti. Interessantenotar que o risco de morte entre os bebês menores foi semelhante,independentemente do status da síndrome congênita do zika. No entanto,as crianças com síndrome congênita do zika que nasceram a termo ou que tiverampeso normal ao nascer tinham mais de 12 vezes mais chances de morrer do quesuas contrapartes sem a síndrome. Além disso, ficou constatado que condiçõesclassificadas como malformações congênitas, doenças do sistema nervoso e certasdoenças infecciosas foram causas de morte mais comuns entre crianças comsíndrome congênita do zika do que entre aquelas sem a síndrome.
A força desteestudo está na robustez dos dados, ainda que pese o caráter observacional e retrospectivodo estudo. Sem dúvida, ele apoia qualquer política de saúde voltada ao controleda transmissão da doença, principalmente em gestantes.
1. Paixão ES, et al. Mortality from CongenitalZika Syndrome ? Nationwide Cohort Study in Brazil. N Engl J Med 2022;386:757-767
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