Autor:
Leonardo Vieira da Rosa
Médico Cardiologista pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Médico Assistente da Unidade de Terapia Intensiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Doutorando em Cardiologia do InCor-HC-FMUSP. Médico Cardiologista da Unidade Coronariana do Hospital Sírio Libanês.
Última revisão: 18/08/2011
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Estratégia de reperfusão e mortalidade em um ano nos pacientes com infarto agudo do miocárdio
Área de atuação: Medicina de urgência
Especialidade: Cardiologia, Emergência e Clínica Médica
A terapêutica trombolítica representou um avanço indiscutível no tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST). Os grandes ensaios clínicos randomizados publicados na década de 1980 (GISSI e ISIS-2)2,3 demonstraram, consistentemente, diminuição da mortalidade no infarto agudo, sendo esta diretamente proporcional ao tempo até o início da infusão do trombolítico. Nos últimos anos, surgiu um interessante debate sobre qual seria o melhor método de reperfusão naqueles pacientes com apresentação precoce (menos de duas horas). Dois ensaios clínicos (CAPTIM e WEST) compararam a fibrinólise pré-hospitalar com intervenção coronariana percutânea primária (PCI) com o objetivo de tentar responder a este questionamento.
O presente estudo foi uma análise conjunta (combinada) (vide Glossário) de dois ensaios clínicos (CAPTIM na França e WEST no Canadá) que objetivaram avaliar a relação entre as estratégias de reperfusão (fibrinólise vs. PCI), o início dos sintomas e a mortalidade em um ano. Os resultados de um total de 1.168 participantes – CAPTIM (n = 840, 1997-2000) e o WEST (n = 328, 2003-2005) – foram analisados conjuntamente.
A idade média foi de 58 anos, 81% eram homens e 41% tinham infarto do miocárdio de parede anterior (supradesnível de V1-V6); 640 pacientes foram randomizados para trombólise pré-hospitalar e 528 pacientes para PCI. Todos os participantes receberam terapia médica adjuvante. O atraso na apresentação (ou seja, início dos sintomas até a randomização) foi semelhante nos dois grupos (mediana 105 vs. 106 minutos, p= 0,712). A angioplastia de resgate após o trombolítico ocorreu em 26% e 27%, e angioplastia em 30 dias, em 70% e 71% no CAPTIM e WEST, respectivamente. A mortalidade em um ano não foi diferente entre os dois grupos (4,6% vs. 6,5%, p = 0,263), entretanto, quando a mortalidade em um ano foi examinada de acordo com o tempo do início dos sintomas até a randomização, a interação foi estatisticamente significativa (p = 0,043). Participantes randomizados em até duas horas do início dos sintomas apresentaram melhor sobrevida com a fibrinólise comparados com os que receberam PCI (2,8% vs. 6,9%, HR: 0,43 IC 95% 0,20 – 0,91; p = 0,021), enquanto acima de duas horas, não foi observada diferença (6,9% vs. 6%, p = 0,529, HR: 1,23, IC 95% 0,61 - 2,46).
As diretrizes clínicas contemporâneas de IAMCSST recomendam a PCI como a estratégia de reperfusão preferida, desde que seja realizada rapidamente (menos de 90 minutos) em um centro com expertise clínica, o que não é frequentemente factível, sobretudo em localidades fora dos grandes centros urbanos no Brasil. As mesmas diretrizes recomendam que se não houver possibilidade de realizar angioplastia primária em menos de 90 minutos após o primeiro contato médico, a fibrinólise deve ser indicada.
A conclusão do estudo é de que a reperfusão farmacológica precoce (trombólise com menos de duas horas) diminui a mortalidade tardia (> um ano) quando comparada à angioplastia primária. Devemos, porém, tecer alguns comentários:
1. O estudo WEST alocou os participantes em três grupos: alteplase, alteplase com angioplastia facilitada (vide Glossário) e angioplastia primária.
2. No CAPTIM, a alocação foi realizada em dois grupos: Alteplase vs. angioplastia primária.
3. Na análise final, os participantes que realizaram angioplastia facilitada do estudo WEST enviesaram essa análise combinada, já que no presente estudo só há dois grupos: trombolítico vs. angioplastia.
4. O tempo entre o início dos sintomas e a reperfusão foi +/- 130 minutos (grupo trombolítico) e +/- 190 minutos (grupo angioplastia primária). A demora na realização da angioplastia (longe dos padrões de indicação de tempo porta-balão) pode ter influenciado à análise.
De acordo com os autores, os resultados desta análise combinada não apenas reforçam a relação crítica entre o tempo do início dos sintomas ao tratamento de reperfusão e a mortalidade em um ano, como produz novas evidências a respeito do impacto desta relação sobre a eficácia relativa de duas estratégias de reperfusão muito utilizadas.
Podemos utilizar o resultado desse estudo na nossa prática médica? Sim, entretanto, é preciso lembrar que o estudo em questão apresenta limitações que podem, de algum modo, ter influenciado o resultado final. De qualquer forma, ao analisarmos o contexto brasileiro, um país com concentração de laboratórios de cateterismo nos grandes centros, a utilização rápida e precoce de fibrinolítico (em ambulâncias, postos de saúde e prontos-socorros periféricos) é uma estratégia factível e que deveria ser encorajada.
Análise combinada (pooled analysis)4: é uma análise estatística de estudos independentes, na qual se procura contrastar e combinar resultados, identificando padrões consistentes e fontes de discordância entre os achados.
Angioplastia facilitada: quando a angioplastia é realizada rotineiramente após administração de trombolítico e/ou inibidor de glicoproteína IIb/IIIa.
1. Westerhout CM, Bonnefoy E, Welsh RC, Steg PG, Boutitie F, Armstrong PW. The influence of
2. Effectiveness of intravenous thrombolytic treatment in acute myocardial infarction. Gruppo Italiano
3. Randomised
4. Higgins JPT, Green S (
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